O que aprendemos com as cores que enchem os copos
Temos sido apanhados, de surpresa ou não, pelo perfil dos vinhos que nos chegam à mesa. Na palavra perfil cabe quase tudo, como os aromas, a cor, o teor alcoólico, a estrutura e a acidez. A forma como estes elementos se combinam dá um pouco a ideia do estilo dos vinhos que hoje têm mais aceitação. É sempre conveniente ter noção que, quando se fala em novas tendências, em mudanças de paradigma e em modas, estamos sempre a referirmo-nos às preferências de um grupo ultraminoritário, gente que se assume como geeks e que não compra vinho nas grandes superfícies. Este pessoal, se tomasse atenção ao que se realmente se vende, ia perceber que a maioria esmagadora dos consumidores abastece-se no supermercado, compra vinho em bag-in-box ou, no máximo e já entrando em vinhos para comemorações, vinho até €4. Estes são os consumidores para quem um Papa Figos ou um Duas Quintas são um produto de luxo, são estes consumidores que fazem da Cooperativa de Pegões ou da de Monção tremendos casos de sucesso. Esta é a realidade. Também é verdade que muitos são vinhos/bebida, bons parceiros da mesa mas dos quais nos esquecemos no dia seguinte. Há assim um fosso enorme entre a realidade e uma visão idílica do mundo do vinho em que todos estaríamos disponíveis para pagar fortunas porque os produtores ‘acham’ que o seu vinho vale 100 ou vale 200. A conversa é mais ou menos interminável porque entre os novos consumidores também existem os que acham que os vinhos com defeito é que são the real thing e que os vinhos bem feitos, limpos e duráveis, são subprodutos da indústria química. Vamos em frente e peguemos no tema das cores. Hoje fazem-se vinhos tintos com muito menos cor por comparação com o que se fazia há duas décadas. Então, o que aconteceu? Podem ser várias as razões, como o uso de castas com pouca cor; o teor de cor varia muito de casta para casta, e enquanto algumas têm muita (Alicante Bouschet, Sousão, Touriga Francesa), outras são pobres em cor (Bastardo, Mourisco, Malvasia Preta, Tinta Francisca ou Pinot Noir). Assim sendo, se fizermos um vinho com uma variedade pouco corante é certo que vamos ter um tinto aberto de cor. Depois, a forma como o vinho foi feito vai condicionar muito a cor: se foi muito macerado, se o contacto das películas com o mosto foi muito prolongado ou se a prensagem foi muito forte, tudo isso vai gerar vinhos com mais cor. Estamos de novo a falar no perfil. A cor, só por si, não é um fator indicativo de qualidade. Não é bom por ter muita cor nem fraco por ter pouca. Se quisermos respeitar a uva (algo que todo o produtor diz que faz ou procura fazer…), então de uma casta pouco tintureira faremos um vinho aberto e de uma muito carregada faremos um tinto carregado, ou mesmo, opaco. É verdade que os tintos escuros já recolheram mais aplausos porque se atribuía à cor um valor extra que ela não tem. A passagem na barrica nova também ajudava a fixar a cor e, assim, os tintos apresentavam-se cheios de cor e de aromas de madeira. A conjugação de menos intensidade corante com menos madeira gera os vinhos que chamamos glu-glu: salivantes, gastronómicos e muito conviviais. As modas também têm coisas boas. […]