A Engenharia Zootécnica encontra-se integrada no Colégio de Engenharia Agronómica da Ordem dos Engenheiros (OE), cuja regulamentação de atos se encontra estabelecida em diploma próprio (Regulamento 420/2015, publicado em Diário da República de 20/07/2015 páginas 19434 – 19436), e apenas pode ser exercida por profissionais inscritos nesta Associação Profissional.
Porquanto reputamos da maior relevância as questões deontológicas associadas ao exercício de uma profissão de confiança pública – a Engenharia -, a admissão na Ordem dos Engenheiros obriga à frequência de um curso de ética e deontologia profissional, sendo que o Estatuto da OE, que assume a força de lei, também lhes consagra um capítulo.
Assim, o exercício da Engenharia implica que a aplicação das competências científicas e técnicas seja acompanhada pelo compromisso individual com princípios éticos e deveres deontológicos inerentes à profissão.
Valorizar a produção animal e a qualidade alimentar vai atualmente muito além dos cuidados de âmbito produtivo e sanitário, incluindo necessariamente uma componente ética importante, sendo que são várias as formações académicas em Portugal que têm competências para atuar e avaliar as condições de bem-estar em animais.
As Engenharias Zootécnica e Agronómica estão numa posição de destaque nesta matéria, pois cabe a estes Engenheiros não só zelar pelos animais que têm a seu cargo, mas também aplicar a sua formação altamente especializada às condições de produtividade e rentabilidade.
Assim, quando perante práticas lesivas para o bem-estar animal, os Engenheiros têm o dever ético de não as praticar e de as denunciar às entidades competentes.
Saliente-se que o não cumprimento deste dever ético torna os profissionais cúmplices de práticas ilícitas, o que implica, entre outras consequências legais, a abertura de processo disciplinar e, sempre que necessária, a aplicação de sanções pelos competentes órgãos disciplinares.
A produção animal é uma atividade essencial à Humanidade, sendo que em Portugal está presente em todo o território, garantindo a produção de alimentos de elevada qualidade em sistemas de produção, com excelentes padrões de bem-estar animal e sustentabilidade.
Os profissionais do setor têm um papel preponderante e ativo na preservação do mundo rural, garantindo o bem-estar animal nos sistemas de produção e disponibilizando alimentos de elevada qualidade aos cidadãos.
O bem-estar animal constitui hoje uma preocupação mundial e está, e bem, na ordem do dia, sendo os consumidores parte integrante do processo.
No entanto, a desinformação do público em relação a temas da agricultura animal e o invariável mediatismo das más práticas são o entrave principal para o desenvolvimento de discussões sérias e produtivas, num mundo em que a maior parte da população não tem acesso a alimentos, o que constitui um dos ODS das Nações Unidas.
Os meios de comunicação social têm, assim, o dever de contribuir para a informação da sociedade e para uma discussão esclarecida sobre temas complexos e fraturantes, mas essenciais.
Numa sociedade constituída por uma população maioritariamente urbana que está cada vez mais afastada da realidade rural e agrícola, a disponibilização de informação correta, isenta e pedagógica revela-se essencial.
Foi neste ponto que a reportagem apresentada pelo programa Linha da Frente, da RTP, no passado dia 25 de fevereiro, intitulada “E se nós falássemos…”, acabou por falhar.
Num tema que é controverso e que facilmente origina reações extremadas e conflitos éticos internos e pessoais, a exibição e foco numa visão distorcida, desenquadrada e afastada da realidade não pode ser a melhor forma de abordar este assunto.
A Ordem dos Engenheiros considera que este é um tema importante, mas que merece uma discussão pública imparcial e não tendenciosa, que inclua os técnicos com competências na área, produtores e outros profissionais, que certamente não irão omitir a identidade e exigir a distorção da sua face.
Qualquer abordagem pouco séria, parcial e enviesada sobre a atividade de um setor que emprega muitos Engenheiros e que, apesar dos sucessivos confinamentos, sempre continuou a trabalhar diariamente para colocar ao dispor dos portugueses alimentos de elevada qualidade, não pode, pois, ser bem acolhida.
Sobretudo, quando é realizada sem a verificação da informação veiculada pelos intervenientes no referido programa, um dos quais é alegadamente referido como Engenheira Zootécnica, que ao omitir a identidade e o rosto demonstra uma postura ética e deontologicamente reprováveis, para além das declarações proferidas denotarem falta de conhecimentos técnicos básicos e de ter assumido publicamente a prática e a conivência com atuações ilícitas.
Ao invés deste arrependimento tardio, na nossa perspetiva, a postura correta deveria ter passado pela denúncia, em devido tempo, às autoridades competentes.