Encontram-se presentemente em discussão pública algumas propostas apresentadas pela Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA), nomeadamente sobre a fileira do frango de carne, incluindo as galinhas reprodutoras (cujos ovos férteis após incubação dão origem ao pinto do dia, futuro frango de carne), bem como a criação de frangos.
As aludidas propostas centram-se no bem-estar das aves, mas no meu modesto entendimento nem todas se apoiam numa base científica sólida e revelam mesmo que talvez os seus autores não tenham uma longa experiência profissional no setor avícola. Acresce que não têm em consideração as implicações que tais propostas têm no que concerne à sustentabilidade ambiental, económica e social, bem como as implicações na saúde animal, conforme comentaremos sumariamente em seguida.
Uma das recomendações com maior impacto económico consiste em baixar a densidade de alojamento dos frangos de 33 para 11kg/m2, na suposição que deste modo as aves beneficiariam de melhores condições, quando se sabe que o que mais importa para o bem-estar das aves é manter as camas secas para assim evitar as dermatites plantares e também proporcionar um ambiente confortável em termos de temperatura, humidade, amoníaco e dióxido de carbono. Ainda neste âmbito é proposta a instalação de varandas, o que vai dificultar o condicionamento ambiental, tanto no inverno como no verão, para além de tornar mais fácil a entrada de agentes patogénicos por via aerógene, como recentemente se verificou em Portugal com a gripe aviária em aviários com janelas dotadas de redes. Obviamente que a proposta em apreço implica que a área dos aviários sofra uma expansão enorme, o que tem reflexos muito negativos em termos de sustentabilidade económica.
A alimentação excessiva das aves reprodutoras, conforme proposta da EFSA, conduz a pesos vivos muito elevados para aves alojadas durante 60 semanas, de que resultam problemas metabólicos, mortes súbitas, dificuldades locomotoras que afetam a fertilidade, prolapsos e picassismo – tudo contribuindo para contrariar os objetivos de bem-estar visados pela EFSA. Também a administração de água ad libitum conduz à produção de fezes excessivamente húmidas, responsáveis pelo encharcamento das camas, cujos inconvenientes para o bem-estar das aves apontámos anteriormente.
Uma outra proposta da EFSA vai no sentido de limitar o crescimento diário máximo a 50g/dia, sem que se conheça a fundamentação científica deste limite, sendo certo que as empresas de seleção têm atuado de forma holística conciliando a velocidade de crescimento e o desenvolvimento do peito (parte preferida pela generalidade dos consumidores) com a resistência às doenças e à melhoria da estrutura óssea. Acresce que a criação de frangos de crescimento lento está associada a elevados índices de conversão alimentar (kg de alimento consumido pela ave por kg de aumento de peso vivo), o que é muito penalizador em termos de sustentabilidade ambiental e social, pois exige o cultivo de maiores áreas dedicadas à cultura dos cereais e das oleaginosas componentes da dieta consumida pelas aves, e, por consequência, provoca uma elevação do custo de produção, que obviamente será pago pelo consumidor.
Do que precede, parece-me lícito concluirmos que as propostas da EFSA ora em apreciação não têm um fundamento científico sólido que sustente um maior bem-estar das aves. Mas, ao invés, poderão mesmo afetar negativamente o seu bem-estar, para além de prejudicar a sustentabilidade económica, social e ambiental, colocando o setor avícola europeu sem condições de competitividade. Esta situação vai agravar a dependência externa da UE face aos alimentos, para além do declínio que já se vem verificando noutras áreas como a defesa militar, a indústria, a economia digital e, particularmente grave no momento, a energia.
Engenheiro Agrónomo, Ph. D.
Do Prado ao Prato na perspetiva de um fruticultor português – Manuel Chaveiro Soares