A procura de soluções socioecónomica e ambientalmente viáveis para o bagaço de azeitona fez nascer o projeto Bis+Olive, liderado pela Bísaro- Salsicharia Tradicional, uma das empresas mais importantes do setor cárneo da região, em copromoção com o Instituto Politécnico de Bragança (IPB), a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e o Laboratório Colaborativo Montanhas de Investigação-Associação (MORE CoLAB).
O projeto tem como objetivo avaliar o efeito do bagaço de azeitona na dieta do porco bísaro, uma raça de suínos autóctone, no crescimento do animal e na qualidade da carne.
O setor olivícola tem uma grande representatividade na região Norte de Portugal, sendo que nela se encontram cerca de 22% da superfície de olival a nível nacional. Por ano, são produzidas na região Norte de Portugal cerca de 100 000 toneladas de bagaço de azeitona.
Um problema ambiental e económico
Este subproduto, fitotóxico e com elevado potencial de contaminação de água e solo, é maioritariamente aproveitado para extração de óleo de bagaço de azeitona, em fábricas extratoras. Em campanhas de elevada produção de azeitona, existe um problema de escoamento do bagaço gerado que causa constrangimentos aos lagares e os obriga a parar de funcionar várias vezes por campanha. Nalgumas campanhas, dependendo dos preços de mercado do azeite e do óleo de bagaço de azeitona, o bagaço pode não só não ser pago aos lagares, como representar uma fonte de despesa, tendo estes que assegurar o seu transporte para fora das instalações. Este cenário representa uma fragilidade do setor, fruto da falta de diversificação do aproveitamento do subproduto que aumenta a dependência do mesmo quanto a fatores externos.
Assim, é de extrema importância encontrar soluções socioecónomica e ambientalmente viáveis para o bagaço, sendo neste contexto que surgiu a ideia para o projeto Bis+Olive.
As soluções do Bis+Olive
A avaliação do crescimento e digestibilidade dos animais, realizada sob a coordenação do professor Divanildo Outeiro (UTAD), e os ensaios em exploração, realizados na Quinta do Bísaro (Castro Vicente), apontam para a ausência de efeitos da incorporação de até 10% de bagaço de azeitona na alimentação do porco bísaro em fase de acabamento. Quanto à qualidade físico-química e sensorial da carcaça, carne fresca, enchidos e fumeiro, os ensaios sob a coordenação do professor Alfredo Teixeira e da professora Sandra Rodrigues (IPB) sugerem uma tendência semelhante.
As soluções apresentadas pelo projeto têm um grande potencial a nível ambiental na cadeia de produção de carne de porco bísaro. Na cadeia produção de porco, é o cultivo das matérias-primas para a ração que é o responsável pela maior fatia de libertação de Gases com Efeito de Estufa (GEEs), sendo, portanto, o ponto com maior impacto em termos de aquecimento global e a etapa em que podemos ter maior impacto caso introduzamos alterações. Uma ração com composição de 10% de bagaço pode traduzir-se, assim, numa redução de até 10% das emissões de carbono de produção. Além disso, a etapa de produção no qual existe libertação de maior quantidade de GEEs é a fase de acabamento, fase em que foi testada a ração. Em termos ambientais, um outro fator importante é o transporte das matérias-primas e da ração, sendo que o impacto no aquecimento global é diretamente proporcional à quantidade de quilómetros percorridos. A utilização de um subproduto local é também, portanto, um fator positivo para o impacto ambiental da produção.
Três cenários
Quanto à implementação da ideia, foram considerados três cenários.
O primeiro baseia-se no uso de bagaço fresco com transporte de proximidade entre lagares e suiniculturas. Embora promovesse a chamada produção km0, esta possibilidade teria provavelmente problemas relacionados com a rancificação do subproduto e acarretaria o esforço da mistura do bagaço com a ração nas suiniculturas.
O segundo cenário baseia-se no uso de bagaço extratado, o subproduto final após extração de óleo de bagaço de azeitona, como matéria-prima para rações nas fábricas de alimentos compostos. Embora esta solução fosse fácil para produtores e tivesse claras vantagens ambientais graças à diminuição da utilização de matérias-primas importadas, a viabilidade económica para as empresas de rações é agora posta em causa pela crise energética que aumentou em quase 100% o preço deste material, dado o seu potencial calorífico.
O terceiro cenário, uma variante do segundo, tem também como participante fundamental as empresas de rações, mas contaria com os lagares como fornecedores do bagaço. Este teria de ser seco nas suas instalações e vendido depois para ração. No entanto, dada a ausência de secadores em lagares da região, a viabilidade económica desta ideia não pode ainda ser defendida.
O projeto Bis+Olive termina no fim de mês de junho e apesar das dificuldades que a implementação desta ideia a larga escala representa, estas podem não ser definitivas. No atual contexto de alterações climáticas, em que a União Europeia se comprometeu a reduzir em pelo menos 55% os níveis de GEEs até 2030 em relação aos níveis de 1990 e a atingir a neutralidade carbónica até 2050, a necessidade poderá ser a força motriz de que precisa esta solução.
Por: Sara Rodrigues, MORE CoLAB
Este artigo foi desenvolvido no âmbito da sessão de esclarecimentos do Projeto Rural ON – Agricultura Conectada, promovido pela Associação dos Produtores em Protecção Integrada de Trás-os-Montes e Alto Douro (APPITAD) em parceria com o laboratório colaborativo MORE CoLAB, que decorreu em Macedo de Cavaleiros, a 21 de maio de 2023.
Fonte: Rural On