Perante os desenvolvimentos da regulamentação ESG[1] (Ambiental, Social e Governação) na União Europeia (UE), importa entender como se aplica às PME.
A que empresas se aplica o reporte ESG e a partir de quando?
A Diretiva de Divulgação de Sustentabilidade das Empresas[2] (CSRD), adotada pela UE em 2022 e em vigor desde janeiro deste ano, reforçou os requisitos de reporte das empresas em matéria de sustentabilidade e riscos associados a que estão expostas. A sua aplicação é faseada consoante o tipo de empresa.
As grandes empresas, especialmente as cotadas em bolsa, devem reportar a partir de 2025, caso estejam abrangidas pela anterior Diretiva de Informação Não Financeira, ou 2026, com referência a 2024 e 2025, respetivamente.
As PME cotadas em bolsa, exceto microempresas, têm obrigatoriedade de reporte a partir de 2027 (referente a 2026), podendo adiar por 2 anos, desde que fundamentado.
O reporte ESG é feito de acordo com que normas?
As empresas abrangidas pela Diretiva CSRD reportam de acordo com as Normas Europeias de Relato de Sustentabilidade[3] (ESRS) desenvolvidas pelo EFRAG[4]. Estas normas garantem uniformidade e comparabilidade nos processos de avaliação de financiadores, investidores e outras partes interessadas.
Inicialmente, foram adotadas 12 normas: 2 transversais, abordando requisitos e divulgações gerais, e 10 temáticas, cobrindo temas ambientais (como alterações climáticas, poluição, biodiversidade e economia circular), sociais (como condições de trabalho – entidade e cadeia de valor- e impacto na comunidade) e de governação e conduta empresarial.
O reporte ESG é obrigatório para as PME? Em que condições?
A Diretiva CSRD apenas obriga as PME cotadas a divulgar informação sobre as suas políticas de sustentabilidade. O reporte será menos exigente do que o aplicável às grandes empresas e há mais prazo para adaptação. Importa realçar que as PME cotadas são residuais na UE e inexistem em Portugal.
As PME representam 99% das empresas da UE e constituem o cerne da economia europeia. Considerando que a maioria são PME não cotadas e que muitas delas integram os ecossistemas de negócio de grandes empresas, poderão estas PME ficar de fora do reporte ESG? A resposta é não. Mais tarde ou mais cedo, terão de prestar informação, pois as grandes empresas têm de reportar os riscos em matéria de sustentabilidade ao longo de toda a cadeia de valor.
Acresce que as PME que não reportem o desempenho ESG aos seus financiadores e investidores, enfrentarão dificuldades no acesso ao capital.
Neste contexto de pressão, muitas PME começam a ser confrontadas com pedidos de informação de sustentabilidade por parte dos seus parceiros comerciais e instituições financeiras, que precisam de cumprir com as suas próprias obrigações de reporte. A diversidade e complexidade desses questionários é um constrangimento real. Para facilitar, o EFRAG desenvolveu uma norma voluntária de reporte simplificado, que passou por um amplo processo de consulta e será aprovada em breve. O objetivo é simplificar os relatórios de sustentabilidade e habilitar as micro, pequenas e médias empresas a responder de forma proporcional, eficiente e normalizada aos pedidos de informação.
Como se devem preparar as PME do setor agrícola em Portugal?
99,57% das 40.840 empresas do setor agrícola em Portugal são PME[5]. Muitas delas integram a cadeia de valor de grandes empresas, nacionais e internacionais, de transformação e distribuição agroalimentar, que terão obrigações de reporte abrangendo toda a cadeia de valor. Portanto, é aconselhável que as PME do setor agrícola integrem fatores ESG nas suas estratégias de negócio e comecem progressivamente a reportar o seu desempenho de sustentabilidade e os riscos relacionados com o clima e com o capital natural, dado o seu elevado grau de exposição.
Estrategicamente, devem preparar-se para adotar a norma de relato de sustentabilidade voluntária para PME não cotadas e reportar a partir de 2027. Caso contrário, expõem-se a riscos de negócio decorrentes de dificuldades em participar em cadeias de abastecimento e acesso a financiamento.
Um aspeto fundamental é a capacitação das empresas, sendo crucial o papel das organizações profissionais e interprofissionais do setor agroalimentar. Para as PME exportadoras, o AICEP[6] promove a capacitação em temas ESG, visando reforçar a competitividade destas empresas nos mercados internacionais.
Em resumo, a integração progressiva de práticas ESG e o respetivo reporte, pela generalidade das PME, não são uma opção. Trata-se de uma obrigação que não decorre da regulamentação, mas sim de uma estratégia de negócios inteligente para criar valor económico sustentável no presente e no futuro.
[1] Para enquadramento geral do tema, sugere-se a leitura do artigo prévio “Setor Agrícola e ESG: desafios e oportunidades” (https://www.agroportal.pt/setor-agricola-e-esg-desafios-e-oportunidades/)
[2] CSRD (Corporate Sustainability Reporting Directive) – Diretiva (UE) 2022/2464 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de dezembro de 2022.
[3] ESRS (European Sustainability Reporting Standards). A Comissão Europeia adotou, pelo Regulamento Delegado (EU) 2023/2772, um primeiro conjunto de 12 normas aplicáveis a partir de 1 de janeiro de 2024.
[4] O EFRAG (European Financial Reporting Advisory Group) presta aconselhamento técnico à Comissão Europeia sob a forma de projetos de Normas Europeias de Relato de Sustentabilidade (ESRS), elaborados no âmbito de um processo rigoroso e de consulta muito alargada, apoiando a sua aplicação efetiva. A sua missão consiste em servir o interesse público europeu em matéria de informação financeira e de sustentabilidade, desenvolvendo e promovendo pontos de vista europeus no domínio da informação empresarial (https://www.efrag.org/About/Facts).
[5] Dados referentes a 2022. Fonte: INE (https://bpstat.bportugal.pt/conteudos/publicacoes/1294)
[6] https://www.portugalglobal.pt/pt/internacionalizacao/sustentabilidade/
Doutoranda em Ciências da Sustentabilidade, Técnica Superior do INIAV/Polo de Inovação de Dois Portos (investigação na área de sustentabilidade na cadeia de valor de viticultura e enologia), Consultora e Formadora