O PCP requereu hoje a audição do ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, sobre a revitalização do parque natural da Serra da Estrela, considerando que está “ao abandono” quase um ano após o incêndio que deflagrou na região.
Este anúncio foi feito pela líder parlamentar do PCP, Paula Santos, em declarações aos jornalistas no Vale do Beijames, em pleno parque natural da Serra da Estrela, no âmbito das jornadas parlamentares do partido, e pouco depois de ter falado com o presidente da associação de Amigos da Serra da Estrela, José Maria Saraiva.
Rodeada por vários troncos de árvores queimados, vestígios do incêndio que deflagrou na região em agosto de 2022, Paula Santos salientou que há “anúncios e promessas” que foram feitos pelo Governo após os fogos, mas, no terreno, identifica-se que “não há o investimento que seria necessário” para proceder à recuperação do parque.
“É um parque que, na prática, está ao abandono e não há esse acompanhamento por parte do Governo e daqueles que são os organismos que intervêm nesta área. Isto resulta de uma opção política, que não investe em termos de meios, de capacidade e de uma estrutura orgânica”, criticou.
Paula Santos destacou em particular o facto de ser necessário maior investimento e reforço dos meios do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), lamentando que o parque não tenha uma “direção própria”.
Vladimiro Vale, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP, indicou que, atualmente, o parque natural da Serra da Estrela “não tem uma equipa diretiva de gestão do parque”, estando toda a gestão dos parques naturais da região centro “concentrada num serviço que funciona na Mata do Choupal, em Coimbra”.
“Isso afastou as direções dos parques naturais do terreno. Uma coisa é uma direção de um parque estar inserida no meio: ouvir, ver, passar no terreno, outra coisa é estar em Coimbra, com falta de meios, com o desinvestimento que houve”, lamentou.
Neste contexto, Paula Santos anunciou que o partido vai requerer a audição, na comissão parlamentar de Ambiente e Energia, do ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, para se discutir “a revitalização e a recuperação do parque natural da Serra da Estrela”.
“São necessárias respostas para que haja esta recuperação e para que não seja uma oportunidade perdida”, defendeu.
O presidente da associação de Amigos da Serra da Estrela criticou a “falta de planeamento” que houve desde que o incêndio deflagrou em agosto de 2022, fazendo um balanço “muito negativo” do último ano, e lamentando que os contratos-programa de 8,9 milhões de euros para mitigar os danos ainda não tenham sido revelados.
“Nada se alterou. Isto ficou pior: quando se dizia que isto ia ficar melhor – nós já sabíamos que não ia ficar, porque realmente a dimensão é brutal, é dantesca -, mas vai demorar anos, mas anos com cabeça. Porque se não houver cabeça, isto vai ficar pior, e aqui não houve cabeça”, disse José Maria Saraiva, mostrando uma estrada recém-construída, cortada a meio por pedregulhos decorrentes de uma uma enxurrada.
Pouco depois, uma delegação composta por Paula Santos e o deputado Duarte Alves deslocou-se até a uma povoação perto da aldeia de Gonçalo, no concelho de Manteigas, afetada pelo incêndio de agosto.
Em contactos com alguns habitantes, os deputados comunistas ouviram várias queixas, em particular de Fernando Nelas, artesão local conhecido como “Vergas” por produzir cestos de vime, e que criticou os apoios que o Governo pretende dar para responder aos prejuízos provocados pelo incêndio, que ainda não chegaram aos habitantes.
“É uma vergonha aquilo que está a acontecer: já teria morrido à fome se realmente precisasse de ajuda. (…) Há 10 meses que houve o fogo. Demos o NIB para receber 1201 euros no máximo: quem ardeu máquinas, tratores e outros bens, vão receber o mesmo que eu vou receber, 1201 euros. É uma vergonha”, disse.
No geral, a queixa da população é unânime: os 1201 euros são insuficientes. Silvino Santos diz que, no incêndio de agosto, perdeu galinhas, paletes, plástico, alumínio, tendo sido feito um levantamento de prejuízos na ordem dos três mil euros, o que já considerava insuficiente.
“Quando fomos à junta de freguesia, esse montante veio para menos de metade. Essa metade, até hoje: [recebemos] zero. Vamos aguardar a ver se vem alguma coisa ou não. Agora, continuo a repetir uma coisa: se me dessem os três mil euros, não pagava o prejuízo que eu tive”, frisou.
Já Maria Alice, que regressou ao seu “pequeno paraíso” de Gonçalo há cerca de 20 anos, lamentou que não haja qualquer caminho de alcatrão para chegar à sua casa, o que impede qualquer saída em caso de incêndio.
“Se vem um fogo, nós ficamos lá todos outra vez, se não nos vão lá buscar. Foi assim que aconteceu há um ano: não tínhamos saída, não há saída… Podiam pôr-nos uma borradela de alcatrão até pelo menos à nossa porta”, pediu.