O secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal diz que “o setor agrícola era tido como um velho com uma enxada na mão e com o arado e hoje não é nada disso”
No dia 26 vai comemorar-se o Dia da Produção Nacional. O que se pode esperar deste dia?
É necessário chamar a atenção dos consumidores portugueses para a produção nacional e para o facto de ser importante consumir português, não só por razões económicas, mas também por razões sociais e ecológicas. Ao consumirmos produtos portugueses não estamos a consumir produtos do outro lado do mundo que, muitas vezes, têm uma pegada de carbono muito grande. As pessoas, de uma forma geral, perderam a noção do ciclo natural das culturas, principalmente no caso das frutas. Quando se consome cereja no Natal ou melão em fevereiro, esses produtos não podem vir de uma produção portuguesa. Nas grandes superfícies há atualmente todas as frutas durante todo o ano e como têm a indicação do país, as pessoas sabem muito bem o que estão a comprar.
O preço também pesa na decisão…
Sem dúvida, mas muitas vezes, as frutas que vêm da outra parte do mundo são muito mais caras e não é o preço que as impede de tomarem essa decisão. Vou-lhe dar um exemplo. Qual é a fruta que há em quase todos os restaurantes em Portugal, desde o mais caro ao mais modesto? Manga e abacaxi. Se pedir uma maçã ou uma pera, a maioria não tem. Quanto muito têm pera com vinho tinto. E porque é que isso acontece? Porque os consumidores querem. Caso contrário, os restaurantes não tinham manga na lista e não é barata. Tudo isto está relacionado com a perceção dos consumidores e aí temos um longo caminho para evoluir. Basta ir aos nossos vizinhos espanhóis, para eles tudo o que é espanhol é bom, não interessam os outros.
As grandes superfícies não influenciam nessa decisão?
Isso é uma questão de circuito comercial, se os consumidores deixarem de comprar fruta espanhola nos hipermercados, deixam de a ter lá.
Nota que os consumidores estão mais sensíveis para esta questão?
Acho que estão mais sensíveis. Até as novas gerações estão mais sensíveis, nem que seja por razões ecológicas ou de saúde, ou por outra razão qualquer. Mas a questão da educação também influencia muito. Por exemplo, se for à faixa dos 50 anos, a maioria tem whisky em casa, mas não tem vinho do Porto, que é uma bebida nacional, idolatrada pelos estrangeiros e que nós nem valorizamos. Ou seja, temos uma coisa que é nossa e preferimos o que é dos outros, quando os outros preferem o que é nosso. Não faz sentido, isso é uma questão cultural, principalmente quando há poucos anos foi considerado o melhor vinho do mundo, não podemos alegar que é falta de qualidade. Mas tenho uma explicação: antes do 25 de abril só havia aguardente, vinho do Porto e bagaço, só as pessoas que tinham possibilidade de ir ao estrangeiro é que compravam whisky. Quando se deu o 25 de abril, abriu-se esse mercado e, como é natural e normal, as pessoas passaram a querer ter o que não tinham. E se perguntar a essas pessoas de 50 anos porque é que bebem whisky e não bebem vinho do Porto nem sabem responder. Isso está muito relacionado com as raízes das pessoas, com a própria postura que o português tem face àquilo que é produzido cá. Basta pensar que tínhamos a maior onda do mundo e quem a descobriu foi um americano, enquanto os surfistas portugueses iam para o Havai.
Portugal é agora um destino da moda. Os produtores portugueses não poderão beneficiar dessa notoriedade?
Acho que podemos beneficiar um pouco, mas como disse é uma moda, não é eterna e rapidamente muda. É bom aproveitarmos enquanto estamos na moda porque há de chegar uma altura em que esta passa para outro. Claro que para já é benéfico por causa dos produtos que exportamos, como a fruta, o vinho, o azeite. Os turistas gostam de Portugal, os portugueses são simpáticos, o clima é bom, a comida é fantástica, os vinhos são baratos. Lisboa é bonita, o Porto também e o próprio país apesar de ser pequeno tem a vantagem de ser diverso. O pior que pode haver para um turista é fazer mil quilómetros e estar sempre tudo igual. Em Portugal isso não acontece, em quase cada 50 quilómetros a paisagem muda.
E as empresas do setor não podiam aproveitar mais?
Acho que estão a aproveitar. As exportações do setor agroalimentar estão a crescer mais do que o crescimento da economia. Neste primeiro trimestre cresceu 6 ou 7% e tem vindo a aumentar nos últimos anos.
Uma das novidades do setor diz respeito ao recurso da tecnologia. O que mudou?
Estamos a assistir a uma verdadeira revolução. O setor agrícola era tido como um velho com uma enxada na mão e com o arado e hoje não é nada disso. Claro que nos pequenos produtores que só produzem para eles não houve espaço para aderirem a grande tecnologia, mas nas empresas utiliza-se a tecnologia do mais sofisticado que existe. Recorrem a drones, a sensores de rega, a regras de precisão, a tablets para controlar a humidade do solo, tudo o que é de mais sofisticado. Vi no outro dia um esmagador de uva que separava os bagos da uva pelo peso e pela cor, ou seja, tinha uma cromatografia e pelo peso de bago separava todos aqueles que tivessem o mesmo grau de maturação. Vai resultar num vinho que nunca foi feito no mundo, era impossível alguém escolher bago a bago e, pelo peso e pela cor, conseguir fazer um lote perfeito. Isso só é possível através do recurso à informática e à tecnologia. Também as técnicas de extração das azeitonas e as técnicas de produção do vinho são agora muito diferentes. Há pessoas, mais uma vez com 50 e tal anos, que ainda hoje dizem que não bebem vinho branco porque faz dores de cabeça, mas isso acontecia há 30 ou 40 anos atrás, porque recorria-se a produtos químicos. Não havia tecnologia para fazer um vinho branco sem que oxidasse e, por isso, recorria-se a determinados produtos. Alguns exageravam no uso desses produtos e era isso que fazia as tais dores de cabeça. Hoje isso não existe, os vinhos são feitos com sumo de uva pasteurizada, em baixas temperaturas, num ambiente totalmente diferente. O mesmo acontece com o leite que sai da teta da vaca e entra no refrigerador em vácuo sem tocar numa partícula de ar. E também na parte da produção temos técnica e tecnologia que nos permite usar muito menos água na rega e sermos verdadeiramente cirúrgicos, usar muito menos adubo, muito menos pesticida ou só usar quando é verdadeiramente necessário porque existem meios de diagnóstico e meios de conhecimento que não existiam há 30 anos. Havia uns desenhos animados, a família Prudêncio, que apareciam na televisão, onde se dizia ao agricultor que as embalagens de pesticidas não podiam ser deitadas para o rio, tinham de ser queimadas e enterradas, que hoje é um crime ambiental. Isso demonstra bem a evolução que todo este setor teve.
Mas a tecnologia foi entrando a pouco e pouco…
As tecnologias vieram também no setor agrícola permitir um conjunto de inovações brutais. Hoje já há tratores que já são guiados sem condutor e são guiados por um tablet. A agricultura caracteriza-se por uma atividade física forte, com mãos na terra, mas atualmente isso não existe. As atividades são feitas por um trator com cabine, com ar condicionado, com computador ao lado e quem é hoje empresário tem de utilizar alta tecnologia. Passámos da enxada para o engenheiro químico que utiliza todas as ferramentas que tem ao seu dispor: internet, câmaras de vídeo, sensores, gestão de base de dados.
Passámos de um trabalho de mão suja para bata branca?
Exatamente. Hoje entra num lagar e encontra pessoas de bata branca. É por isso que é possível ter um azeite com um aroma e sabor que nunca teve na vida porque é usada uma determinada técnica para extrair as azeitonas. O mesmo acontece com o vinho. Alguma vez se pasteurizou o vinho? Nunca e agora é para não se adicionar qualquer produto químico. O vinho evoluiu tanto que tem o melhor do vinho novo e o melhor do vinho velho e é possível fazer as duas coisas. Antigamente tinha-se de guardar os vinhos para serem velhos, do ponto de vista do negócio isso não era bom porque os produtores tinham de esperar cinco, seis ou sete anos e os consumidores também não têm condições para estarem a guardar vinho debaixo da cama. As casas são pequenas e não apresentam condições de temperatura e de humidade.
Mas isso implica perda de postos de trabalho?
A mão-de-obra na agricultura tem vindo a diminuir, mas ganhou trabalhadores mais especializados e com maior formação. Por exemplo, para apanhar azeitona era necessário um rancho de mulheres com varas na mão e outras para apanhar do chão, agora não é preciso ninguém. É tudo feito com uma máquina que trabalha dia e noite. E mesmo que fosse feito da forma antiga não havia gente suficiente para o olival que existe no Alentejo.
As oliveiras são agora mais pequenas…
Adaptou-se para que tudo seja feito de forma a que as máquinas possam apanhar.
E as outras?
Continuam a exigir um custo brutal. Um quilo de azeite apanhado de forma artesanal custa cinco ou seis vezes mais do que se fosse apanhado pela máquina. E o azeite que é apanhado desta forma mais moderna não é pior. Só se apanha de forma tradicional se for para conservas porque as azeitonas não podem ser tocadas por aquela máquina. É o que acontece com as vinhas do Douro, as uvas continuam a ser apanhadas à mão, mas depois isso tem uma implicação no preço, tornando o vinho muito mais caro.
Mas há quem critique os olivais estarem quase todos nas mãos de espanhóis…
E quantos bancos portugueses estão na mão dos espanhóis? E os bons jogadores portugueses jogam aonde? Os olivais não são todos dos espanhóis. Eles começaram a investir, trouxeram a tecnologia, mas a grande maioria já vendeu. Mas as empresas até podem ser espanholas, mas o azeite é português e é em Portugal que criam os postos de trabalho. A agricultura não é um estado à parte dos outros setores. Se na banca, se nas construtoras, nos seguros, os espanhóis têm comprado muitos dos ativos portugueses então na agricultura não? E percentualmente até considero que é muito inferior àquilo que se verifica nos outros setores.
O INE diz que o setor perdeu mais de 100 mil mulheres desde a entrada da troika…
Isso deve-se ao facto de o setor se ter vindo a transformar. Antigamente não havia máquinas para apanhar uvas, hoje há, antigamente não havia máquinas para apanhar azeitona, hoje há. Ninguém aposta num olival sem ser desses, caso contrário, onde é que arranjava pessoas para apanhar a azeitona? Tudo isto leva a que a necessidade de mão-de-obra seja cada vez menor.
E quando havia essa necessidade também era mais difícil contratar pessoas…
Além do interior do país estar desertificado, muitas das atividades agrícolas são sazonais e não permitem contratar uma pessoa permanentemente. Antigamente havia mão-de-obra para tudo porque as condições de vida eram muito más e as pessoas também ganhavam muito mal, o que permitia ter sempre muita mão-de-obra. Mas quando as pessoas exigem outro nível de vida, isso já não é possível. Se há uns anos uma empresa podia ter três ou quatro trabalhadores a tempo inteiro, hoje se tiver é um e, por norma, é o próprio dono. Os agricultores tiveram de mecanizar porque não tinha rendimentos para pagar salários a três ou quatro trabalhadores. Há 30 anos isso era possível porque os salários eram baixíssimos.
Mas nos últimos anos apareceu uma geração mais nova de agricultores…
O setor à medida que é mais rentável e menos físico tem outra atratividade, outro sex appeal.
Passámos por um período de seca. Estas últimas semanas de chuva vêm ajudar a produção?
Passámos por um período de seca muito severa nos últimos três anos. Ainda não se foi embora, mas já deu para recuperar as reservas de água, as barragens e as florestas. Só uma pequena parte do país é que consegue ter regadio, a outra não. As alterações climáticas começam a fazer sentir o seu efeito. No mês de março choveu imenso, com temperaturas abaixo da média, se calhar daqui a 15 dias vem o calor e passamos de uma situação extrema para outra.
Ainda assim há culturas que são beneficiadas pela seca, como a amêndoa…
Todas são afetadas. As culturas que não são de regadio tiveram uma grande quebra, as que são de regadio se agora não tivesse chovido não era possível fazer nada. Alguns agricultores nem sequer cultivaram porque só começou a chover em março e já tinham tomado outra decisão porque não podiam estar à espera desta situação anormal. Muitas pessoas já não acreditavam que viesse a chover, nem era expetável que isso acontecesse. Tem de chover na altura normal, se chover em junho destrói as vinhas, os cereais, as cerejas.
Os agricultores não deveriam adaptar-se a esta mudança?
O setor já está a adaptar-se, a fazer mitigações desta situação e a ter um tipo de gestão que preveja com mais frequência a ocorrência destes fenómenos. Só há duas soluções: ou muda a altura ou muda de cultura. Estas variações sempre existiram, demoravam era uma geração ou duas a consolidarem-se. Se calhar daqui a 20 anos algumas das castas de uvas que existem no Alentejo têm de ser mudadas por outras com mais resistência. Se calhar daqui a 40 anos a pera rocha no Oeste não pode ser produzida porque não tem temperaturas baixas e é necessário ir mais para norte. Essas consequências já são visíveis com a produção da castanha ao registar uma quebra de produção na ordem dos 60% devido à falta de chuva. Mas mesmo com a falta de chuva há sempre uma solução que é regar, com falta de frio é que não há solução, pois não posso pôr um frigorífico ao lado de cada planta.
O setor também foi bastante penalizado pelos incêndios do ano passado…
O governo auxiliou alguns agricultores, outros não conseguiu. Esteve cá uma pessoa que perdeu tudo o que tinha e recebeu cinco mil euros, não compensa o que perdeu. Está patente junto de todos os portugueses que houve uma enorme falha da Proteção Civil que deu origem a mortes de muitas pessoas. O fogo faz parte do clima mediterrânico, vai haver sempre fogos, o que não se pode é repetir o número de mortes de pessoas, nem as situações que assistimos. Mas quando se repetirem situações de alta temperatura, de baixa humidade e de ventos fortes, o país vai sempre arder.
Tem o levantamento de quantos agricultores foram afetados?
O Ministério da Agricultura tem esses dados. O incêndio de junho afetou poucos agricultores porque era uma zona muito florestal, no de outubro houve mais.
Como está o ponto de situação dos pagamentos das indemnizações dos agricultores afetados?
Essas indemnizações começaram a ser pagas pelo mecanismo do Ministério da Agricultura e algumas foram provenientes do Orçamento do Estado.
O ministro da Agricultura já veio admitir que o governo está disponível para apreciar novas candidaturas a apoios para agricultores afetados pelos incêndios se demonstrarem que não concorreram por motivos de “força maior”…
Quanto mais pessoas forem ajudadas melhor. Mas não nos iludamos, não vão ser todos ajudados. A ajuda foi importante, mas podia ter sido sempre mais. Muitos dos agricultores que foram afetados não têm neste momento nada, porque ardeu tudo, incluindo máquinas. E estamos a falar de muitas pessoas com 60 anos ou mais e, por isso, não é fácil começar do zero, nem sequer têm motivação.
O governo deveria dar mais benefícios ao setor?
O dinheiro é sempre pouco para a dimensão da catástrofe e para os prejuízos que provocaram. Quinhentos mil hectares ardidos é muito, acrescido dos prejuízos que houve com fábricas e casas ardidas. Portugal não é um país rico. Podemos dizer que era possível dar mais, mas temos de ter em consideração aquilo que são as disponibilidades que o governo tem e que o país tem. O que não é aceitável foi o que aconteceu, a segurança dos cidadãos que é uma das funções de um Estado de direito não foi minimamente conseguida. E depois dizer que o problema deveu-se à falta de limpeza é igualmente grave. A limpeza de uma floresta é uma utopia de um urbano. O governo, como não sabe o que está a fazer, mandou limpar terrenos até dia 15 de março. As pessoas que limparam quando chegarem a junho já vão ter outra vez a erva grande. E os técnicos dizem que as distâncias que foram colocadas estão erradas, pois consideram que, quanto mais juntas as árvores estiverem, menos cresce erva em baixo.
E o pânico que se gerou levou alguns proprietários a abaterem árvores de fruto e de jardim…
Assistimos a muitos disparates porque a forma como as pessoas foram contactadas também foi um disparate. As pessoas deram os seus dados para serem contactados pelas finanças, não deram os seus dados para serem intimidados e ameaçados com multas se não cortassem as árvores. Conclusão, muitas pessoas não compreenderam bem a lei ou não leram aquilo com atenção ou não se aperceberam que isso só se aplicava às áreas florestais e não às áreas agrícolas e, como tal, cortaram tudo à volta das suas casas. O governo devia ser responsável por essas coisas e como não há oposição essas coisas passam e não acontece nada. Foi tudo uma estupidez e depois viu-se o primeiro-ministro e os outros elementos do governo a fazer uma limpeza em quatro sítios e acha-se que a limpeza já está feita. As florestas não são nenhuma cozinha. O que é limpar? Aquilo não está sujo. E daqui a dois ou três anos está tudo igual. Tudo isso tem um custo e a floresta não dá rendimento para suportar esse custo.
Mas há a questão de terrenos abandonados…
Isso também é uma utopia muito grande. Na realidade os terrenos abandonados andam à volta dos 100 mil hectares. Se tem um pequeno terreno que não é possível rentabilizar o que é que faz? Se tivesse numa situação dessas e me fossem multar por falta de limpeza oferecia o terreno. É como quem não percebe do assunto e passa por um terreno e acha que é tudo muito bom para se fazer qualquer coisa. Aliás Salazar fez essa asneira, impôs a cultura do trigo no Alentejo, fizeram-se verdadeiras barbaridades porque cortaram-se sobreiros e azinheiras para produzir trigo e, o que se está a ver agora é que o concelho de Beja, que era o grande celeiro de Portugal, está todo transformado num olival. Temos um clima mediterrânico, o trigo não é uma cultura propícia ao nosso clima. Temos um clima mediterrânico que é bom para as culturas mediterrânicas. É claro que Portugal é capaz de produzir trigo, mas sempre com baixa produtividade.
Que balanço faz do ministro Capoulas Santos?
É um ministro que conheço bem há muitos anos. É uma pessoa conhecedora do setor, mas tem as limitações impostas por um acordo que foi feito pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista. Isso limita a atuação do ministro, como também limita todos os outros, assim como o do próprio primeiro-ministro. Mas nas questões europeias é conhecedor da matéria e na negociação da próxima PAC acho que vamos ter condições para conseguir um resultado final que espero que venha a ser positivo para o país.
Acordo com a esquerda limita em quê?
Há algumas matérias que faziam parte do acordo, nomeadamente a questão da plantação dos eucaliptos que é um assunto que está mal contado. É um mito que o eucalipto estraga o terreno, é um mito que o eucalipto beba muita água ou que seca tudo o que está à volta. Se se puser o mesmo número de árvores, e em vez de eucaliptos optar por macieiras, pereiras ou oliveiras, vai ver que bebem a mesma água. E se puser nogueiras bebem ainda mais. O eucalipto tornou-se uma questão ideológica. A esquerda não gosta de tudo o que significa ganhar dinheiro e é óbvio que os eucaliptos estão ligados à indústria papeleira, apesar de esta indústria exportar muito eucalipto de outros países. E também não é verdade que o eucalipto arde mais do que os outros. As pessoas que têm lareira, a lenha que põem lá são de eucalipto? Não, todas as pessoas usam lenha de pinheiro, azinho ou sobreiro porque têm muito maior capacidade calórica. Então o pinhal de Leiria não ardeu todo? O concelho de Mação não era o que estava mais protegido dos fogos e não ardeu? Com aquelas condições de temperatura, de ventos e humidade daqui a 10 anos o que devia estar a crescer outra vez volta a arder. Repitam-se aquelas condições e vai voltar a arder. Arder vai arder sempre, não podem é morrer pessoas nem arder 500 mil hectares.
Mas a limitação da plantação de eucaliptos é para se manter…
Uma das condições impostas é não se poder aumentar a área. Um partido quando estabelece acordos com a esquerda e com a extrema-esquerda fica limitado na sua capacidade de fazer política e de agir. O ministro Capoulas Santos conhece bem o setor e tem bom senso nas decisões que toma, mas quando há assuntos que fazem parte do acordo e quando as decisões já estão tomadas não há muito a fazer. Mas a verdade é que a agricultura para este governo e, isso não tem nada a ver com o ministro Capoulas Santos, está relacionado com as diretrizes políticas do executivo, não tem a relevância e a importância que teve em outros governos.
Nomeadamente pelo governo anterior?
Sim, a agricultura tinha o peso do vice-primeiro-ministro. Paulo Portas sempre apoiou publicamente a lavoura. E não é só dizer. Na altura, em que existiam dificuldades financeiras profundíssimas no país, o Proder, ou seja, o plano que apoia o investimento no setor e, que agora está a dar frutos, tinha dotações de 150 milhões de euros e agora não tem. Foi também a altura em que os pagamentos aos agricultores foram feitos mais atempadamente.
Quanto é agora a dotação?
São 90 milhões de euros. E pergunte aos agricultores como estão os pagamentos, os próprios agricultores não se aperceberam da relevância que teve isso. Estou na CAP há 28 anos e nunca assisti ao posicionamento da agricultura ao nível do vice-primeiro-ministro. Há opções políticas de apoio ao setor e elas foram mais notórias no governo anterior. Os bons resultados de agora são reflexo do investimento que foi feito há quatro anos e o que se está a passar agora vai ser repercutido daqui a uns 4 anos e é natural que venha a estagnar porque não há grande investimento.
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O artigo foi publicado originalmente em Jornal i.