A lei contra a desflorestação da União Europeia é “um passo fundamental”, considerou à Lusa o gerente de projetos de agricultura sustentável da Earthworm Foundation Brasil, país que alberga dos maiores biomas do mundo e um dos principais exportadores agropecuários.
“A lei do desmatamento é um passo fundamental principalmente na rastreabilidade de todos os operadores”, frisou João Carlos Barbosa da Silva, que falou à Lusa à margem da Chocolat Amazónia e Flor Pará, evento que aconteceu entre 26 e 29 de setembro, em Belém, estado do Pará, num evento que acolheu centenas de pequenos produtores de cacau da região, que procuram o balanço entre a sustentabilidade da maior floresta tropical do mundo e o cultivo desta espécie originária do Brasil e da Amazónia.
O Brasil tem sido um dos principais atores contra esta lei, cuja entrada em vigor foi estabelecida para dezembro deste ano, embora a Comissão Europeia tenha admitido esta semana o seu adiamento por um ano, depois do ministro da Agricultura do Brasil, Carlos Fávaro, ter entregado uma carta ao comissário europeu para a Agricultura e Desenvolvimento Rural, Januz Wojciechowski, a pedir a suspensão do diploma e “uma revisão da abordagem punitiva aos produtores”.
Lula da Silva, Presidente do Brasil, país que é um dos principais exportadores agropecuários mundiais, frisou que um dos grandes objetivos do seu Governo é o de garantir o desmatamento ilegal zero até 2030, e, no seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas, em finais de setembro, criticou o “negacionismo climático”.
No entanto, dentro de portas, tem defendido a hipótese de exploração de petróleo perto do rio Amazonas e, externamente, tem feito pressão sobre a União Europeia (UE) para adiar a entrada em vigor da lei sobre produtos e desflorestação, que deve afetar as exportações do agronegócio brasileiro para o continente europeu.
Acresce que o número de focos de incêndios no Brasil já ultrapassou o total de 2023, segundo dados oficiais divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (IMPE), com o Governo brasileiro a denunciar que um grande número pode ter mão criminosa de produtores agrícolas que procuram queimar a terra para posteriormente a utilizarem para pastagem.
Estes são os maiores incêndios registados no país desde 2010, particularmente na Amazónia, o bioma mais afetado com mais de 100.543 focos de incêndio, até agora, em 2024.
João Carlos Barbosa, que falou sobre o “Desafio da rastreabilidade na cadeia do cacau na transamazónica frente às novas regras da União Europeia para produtores livres de desmatamento”, durante o Chocolat Amazónia e Flor Pará, defendeu a importância desta lei, porque traz “clareza” principalmente para os consumidores, que ficam a saber onde foi produzido o produto que consomem “e quais são os riscos que estão relacionados”.
O especialista explicou que a aversão do Governo brasileiro a esta lei prende-se com o facto de as autoridades do Brasil a considerarem “discriminatória do ponto de vista comercial”, mais precisamente do ponto de vista do ‘Benchmarking’, processo de análise, entre empresas do mesmo setor, dos seus produtos, processos e serviços, em relação aos concorrentes.
Segundo o gerente de projetos de agricultura sustentável da Earthworm Foundation Brasil, tem de haver uma “mudança de perceção dos operadores indiretos, que, de uma forma ou de outra, mascaram os riscos relacionados ao desmatamento”, sendo necessário que as empresas conversem entre si para “buscar sistemas de rastreabilidade”.
Outra das principais questões prende-se com a falta de documentação disponível para os pequenos e médios produtores, que, não praticando desflorestação, não conseguem os documentos necessários para o poderem comprovar e assim exportar os seus produtos.
O responsável brasileiro recordou que, durante a 27.ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP 27), realizada de 06 a 18 de novembro de 2022, em Sharm El Sheikh, no Egito, vários gigantes do agronegócio mundial, incluindo as brasileiras JBS e Marfrig (proteína animal) e Amaggi (soja), assinaram um documento intitulado “Roteiro do setor agrícola para 1,5ºC – Reduzindo emissões para mudanças no uso da terra”, no qual “comprometeram-se a não mais adquirir produtos de origem desmatada a partir do ano que vem”.
“Eles entendem que a sustentabilidade dos seus negócios depende destas regiões serem produtivas”, disse, afirmando que perdas de safra correspondem a milhares de milhões de perdas.