Antes de desenvolver a opinião que me fez aceitar redigir este artigo gostava de fazer dois pontos prévios:
Em primeiro lugar, sou um jovem agricultor de 26 anos, estabelecido há cerca de dois, e, por isso, com uma experiência muito reduzida. Possivelmente, personalidades do sector poderão discordar ou explicar as razões para a ocorrência das situações que me deixaram “inquieto”.
Em segundo lugar, sou um jovem apartidário mas algo conservador acerca da posição e do poder que o Estado deve ter no País. Quero com isto dizer que penso que as nossas entidades públicas têm não só o dever de assegurar as reformas dos nossos idosos, a manutenção da rede de estradas, o acesso à educação e saúde para todos, entre outros, mas também de planear e definir estratégias, rumos e objectivos para os diversos sectores de actividade e regiões do território.
Assim, sempre que pressinto que o caminho não está totalmente definido fico preocupado e “inquieto”.
O tema e a ideia principais deste artigo surgiram-me após uma das respostas lançadas para mitigar os efeitos da seca 2017 – a abertura no dia 31 de Julho da “Operação 3.2.2 – Pequenos Investimentos na Exploração Agrícola” para as regiões e sector mais afectados. Após leitura atenta, esta resposta surpreendeu-me por dois motivos:
Em primeiro lugar porque se trata de um recuo, apesar de pontual e restrito, na interpretação da operação 3.2.2. No início deste ano, esta medida sofreu alterações tornando-se apenas acessível para empresas agrícolas de muito reduzida dimensão – facto que muito condiciona e atrasa o desenvolvimento e investimento das que ficaram de fora. Empresas excluídas, desde que se enquadrem no sector e região mais afectados, voltam agora a poder candidatar-se a esta operação.
Em segundo lugar porque, ao serem apenas elegíveis investimentos realizados, no mínimo, a partir de 1 de Agosto, não se mitiga o efeito da seca 2017 que há muito mais tempo é sentido – quem teve que reagir e investir, caso tenha tido possibilidade, já o tinha feito. Para além disso, o apoio apenas chegaria durante o ano de 2018.
Assim, a abertura desta operação, nestes moldes, não contribui para mitigar os efeitos da seca de 2017, apenas constata que o Alentejo é uma região particularmente susceptível a este fenómeno extremo. Como tal, há sim que tomar medidas preventivas que, ao contrário deste caso e ano, não venham tarde. Na minha opinião, todo e qualquer investimento na região do Alentejo que contribua para prevenir e reduzir os prejuízos de uma eventual seca têm de estar no topo das prioridades de apoio – nenhum investimento em mirtilos ou na reconversão de um pivot para uma cultura permanente regada deve ficar à frente em termos de hierarquização de apoios da construção de uma charca ou da conversão de uma exploração de sequeiro em regadio.
A propósito de apoios a projectos de investimento surpreendeu-me também o maior apoio dado ao olival em detrimento do amendoal superintensivos no anúncio da “Operação 3.2.1 – Investimento na Exploração Agrícola” que terminou a 16 de Junho. Com efeito, os valores forfait de investimento previam apoios a densidades até 1800 árvores/ha no caso do olival e apenas até 417 árvores/ha para o amendoal. Por conversas mantidas, sei que houve casos em que este facto foi relevante nas opções tomadas.
No futuro a postura de privilegiar o olival manter-se-á? O sinal foi dado e a bem da coerência da estratégia espero que sim.
Os cereais de outono-inverno atravessam desde há vários anos uma grande crise em Portugal. A diminuição brutal das áreas semeadas é disso prova incontestável. No quadro comunitário em vigor esta cultura é provavelmente a que menos apoio/ha merece. Um hectare de trigo, quer seja regado ou de sequeiro, tem o mesmo nível de apoio que um prado anual natural. Não concordo nem discordo; encaro apenas como uma opção clara. O sinal foi dado e os agricultores já reagiram – campos em que habitualmente via trigo, triticale ou aveia são agora pastagens permanentes ou estão ocasionalmente ocupados com abóbora ou outra hortícola.
Contudo, em 2017, o tema central escolhido para a Feira Nacional da Agricultura de Santarém foi os “Cereais de Portugal”. Fiquei surpreendido pela opção e pelo recuo na desvalorização do sector.
Estamos próximos de um novo quadro comunitário. Devemo-nos preparar para um maior apoio ao sector dos cereais como os acontecimentos de 2017 sugerem ou as opções de 2015 prevalecerão? “Inquieta-me” não saber responder.
Apesar dos exemplos desenvolvidos, tenho a plena noção que a estratégia e decisões a tomar nem sempre são fáceis, directas e, muito menos, claras.
Apelo portanto à coragem das nossas instituições, públicas e privadas, para que definam estratégias e indiquem, com clareza, qual o rumo pretendido para a agricultura portuguesa e para onde devem remar os agricultores portugueses.
Caminhos titubeantes e indefinidos, sinais contraditórios, avanços e recuos de políticas e tentativas de apoiar tudo e todos acabarão sempre por resultar em prejuízos globais, em especial, para Portugal e para a sua Agricultura.
Oportunidade não aproveitada é oportunidade que não volta.
Mãos à obra!
Afonso Bulhão Martins
Jovem Agricultor Português