Durante os últimos anos as variações sofridas ao nível da climatologia começam cada vez mais a confirmar as preocupações identificadas no passado quanto à necessidade do Regadio.
Face às previsões e tendências de períodos estivais longos e períodos de precipitação curtos, mas de grande intensidade, torna-se imperativo pensar estruturalmente e não só minimizar as dificuldades emergentes. A retenção com regadios coletivos das águas provenientes das precipitações permitiria não só armazenar a mesma para períodos necessários à sua utilização como também o armazenamento através da infiltração, fazendo com que houvesse a reposição da perda de água nos aquíferos subterrâneos e permitindo também reduzir o escorrimento superficial, responsável pela erosão laminar nos solos, tema também bastante relevante.
A implementação do Regadio em Óbidos, bem como as condições edáfo-climáticas presentes, possibilita a diversificação de culturas, bem como, a possibilidade de criar condições para melhorar a qualidade das mesmas. É nesta ótica que considero limitante o desinvestimento especialmente na cultura da vinha. Esta poderá ser nos próximos anos a que mais margem apresenta de crescimento, face cada vez mais à dificuldade de arranjar mão de obra para trabalhos agrícolas, sendo que a cultura da vinha está bastante mecanizada.
Perante as condições atuais e face aos últimos acontecimentos nesta cultura, apraz-me desenvolver um pouco mais este tema.
Reestruturação e reconversão da vinha portuguesa em perigo?
O Programa VITIS tem como objetivos reestruturar e reconverter as parcelas de vinha, tendo em vista a produção de uvas para vinho que satisfaçam as condições de produção de vinho com denominação de origem e vinho com indicação geográfica.
Com uma elevada taxa de adesão e uma execução a rondar os 98%, aquele programa de apoio é claramente um sucesso, e traduz o empenho dos agricultores na melhoria da qualidade do vinho português.
As expectativas criadas com o programa de apoio levaram o sector viveirista vitícola nacional a estruturar-se de modo a possibilitar a plantação de cerca de 5 000 ha/ano (20 milhões de plantas). Para atingir este patamar foi necessário criar infraestruturas próprias, preparar terrenos e plantar novos campos de pés-mãe. Ora, se tivermos presente as mais de 3 centenas de castas aptas à produção de vinho em Portugal, das quais, cerca de 250 são autóctones, foi necessário um esforço adicional na reabilitação de muitas dessas castas, de modo a possibilitar a sua comercialização legal.
Recentemente, o vinho português voltou a melhorar a sua performance nos mercados (as exportações portuguesas de vinho cresceram 5,8% em volume e 8,6% em valor entre janeiro e setembro de 2017 para 214 milhões de litros e para um valor de 537 milhões de euros), o que mais uma vez demonstra o sucesso do trabalho realizado, visto que em 10 anos Portugal perdeu 47 mil hectares de vinha e a produtividade da vinha portuguesa continua a ser uma das mais baixas.
Quando o sector esperava o retorno dos investimentos realizados, o valor para as candidaturas para o VITIS 2018/19 é consideravelmente inferior à das últimas campanhas (Figura 1), cerca de 25 milhões de euros, apoiando cerca de 2 100 ha, enquanto que, para 2019/20 ainda não está prevista qualquer dotação, na realidade mostrava-se uma clara necessidade de fazer mais e melhor.
A manter-se esta previsão, todo o sector viveirista entrará em recessão e serão postos em causa centenas de postos de trabalho. O esforço de renovar e conservar o material genético terá sido em vão, apesar do esgotamento das verbas afetas ao programa VITIS a dinâmica conseguida pelo mesmo, comprovada pelos resultados apresentados demonstra um claro desinvestimento na procura de verbas que permitiriam continuar o bom trabalho realizado até então. O que se traduzirá num médio-longo prazo numa perda de competitividade, qualidade e possibilidade de criação de riqueza, emprego e consequentemente coesão social.
Filipe Daniel
Engenheiro Agrónomo e produtor