Não é um estudo, é a avaliação (levada a cabo por um grupo de investigadores da Universidade de Washington) de vários estudos anteriores sobre o glifosato, substância química presente na maior parte dos herbicidas vendidos no mundo. E as conclusões, publicadas na revista Mutation Research – e divulgadas pela CNN –, revelam que a utilização de herbicidas com glifosato aumenta em 41% o risco de cancro, nomeadamente do linfoma não-Hodgki.
“Todas as meta-análises realizadas até hoje, incluindo esta, relatam, consistentemente, o mesmo: a exposição a herbicidas à base de glifosato está associada a um aumento do risco”, refere Rachel Shaffer, co-autora do estudo, à CNN.
Entretanto, a Bayer – que em 2018 adquiriu a Monsanto, produtora do herbicida (com glifosato) mais vendido no mundo: o Roundup – reagiu em comunicado ao estudo, acusando os autores de “manipular a estatística”, tendo, portanto, a conclusão “graves falhas metodológicas”. Por fim, o grupo alemão de farmácias e agroquímicos garante que o estudo “não fornece evidências cientificamente válidas que contrariem as conclusões que demonstram que os herbicidas à base de glifosato não são cancerígenos”.
A verdade é que as propriedades carcinogénicas (ou não) do glifosato têm resultado em amplos debates científicos.
Em 2015, por exemplo, a Agência Internacional para a Investigação do Cancro, da Organização Mundial de Saúde, classificou o glifosato como “provavelmente cancerígeno para humanos”. Por sua vez, em 2017, os especialistas da Agência Europeia dos Produtos Químicos consideraram (igual consideração teria a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar) que o glifosato não é cancerígeno, o que levaria a Comissão Europeia a aprovar a renovação por cinco anos do uso do glifosato, com uma maioria qualificada de 18 Estados-membros a favor e a abstenção de Portugal.
Nos EUA, a Agência de Proteção Ambiental norte-americana garantiria, igualmente em 2017, que o glifosato “não é suscetível de ser cancerígeno para os seres humanos”. Contudo, naquele país, são hoje milhares os casos de pessoas que, expostas ao herbicida Roundup, e tendo desenvolvido linfoma não-Hodgkin, processaram a Monsanto, tendo mesmo, em 2018, o gigante agroquímico norte-americano sido condenado em tribunal a pagar 290 milhões de dólares ao jardineiro Dewayne Johnson, de 46 anos, por não o ter informado sobre a perigosidade do herbicida. Os jurados do tribunal de São Francisco determinaram que a Monsanto agiu “com maldade” e que o Roundup contribuiu “consideravelmente” para a doença de Johnson.
Esta segunda-feira, a plataforma “Transgénicos Fora” apelou ao Governo para que proíba a venda de herbicidas à base de glifosato, que apoie os agricultores e que se torne obrigatória uma análise à agua para consumo.
O apelo da “Transgénicos Fora” surge na sequência dos resultados de um estudo lançado em 2018 para testar a presença de glifosato em voluntários portugueses. As análises demonstraram uma exposição recorrente ao herbicida e apontam para uma contaminação generalizada por glifosato em Portugal.
“Defendemos que se proteja a saúde sem pôr em causa a agricultura, mas que se tomem medidas de bom senso para proteger os cidadãos. Verificámos que a contaminação com o herbicida glifosato é uma realidade. A contaminação está constantemente a acontecer. As pessoas estão cronicamente expostas a um herbicida que, agora sabemos, causa cancro”, afirmou à Renascença Margarida Silva, daquela plataforma.