No passado dia 29 de outubro, a Sociedade Filarmónica de Chãs, em Leiria, transformou-se no epicentro do debate nacional sobre o futuro da carne portuguesa. Sob o lema “Carne: Ética e Preconceito”, o Seminário Anual da APIC reuniu líderes do setor, académicos e investigadores, decisores políticos e produtores numa tarde intensa de reflexão, ciência e transparência.
Um almoço que fala por si:
Tudo começou com o porco no espeto oferecido pelo associado Carreirinho dos Leitões, uma prova viva de que os bons valores da indústria e o prazer gastronómico andam de mãos dadas. À mesa, já se sentia o tema do dia, a produção responsável não é objetivo, é uma realidade
Presidente da APIC, Dr. Carlos Ruivo
Num tom de honra e humildade, o Dr. Carlos Ruivo destacou os desafios do setor, apelou à colaboração institucional e agradeceu o apoio de associados, colaboradores e parceiros, sublinhando a importância do encontro para desconstruir preconceitos e promover uma produção de carne com qualidade e sustentabilidade em Portugal.
O presidente da APIC também dirigiu um profundo agradecimento a João Moura, elogiando a visão e apoio do governante como “pilar essencial” para o desenvolvimento do setor das carnes, destacando assim a relação próxima e construtiva mantida com a Secretaria de Estado da Agricultura, que tem permitido um “diálogo aberto” entre as partes.
A APIC agradeceu ainda aos patrocinadores, com especial destaque para a empresa associada Carreirinho dos Leitões, que apoiou o evento oferecendo o almoço, o coffee-break e o espaço.
Vice-Presidente da CCDR Centro, Dr. Vasco Estrela
Apresentou uma análise crítica à narrativa global que associa a atividade de criação animal a elevadas emissões de gases com efeito de estufa. Segundo o orador, entre 24 % e 38 % da pegada de carbono da produção alimentar mundial provém da síntese e aplicação de fertilizantes artificiais, cuja produção depende maioritariamente de carvão e gás natural. Neste contexto, a escolha alimentar individual tem impacto marginal nas emissões totais, e uma transição generalizada para dietas vegetarianas poderia aumentar a dependência de combustíveis fósseis caso se restringisse o uso de estrumes e chorumes como fertilizantes orgânicos.
Secretário de Estado da Agricultura, Eng. João Moura
O Secretário de Estado da Agricultura delineou uma visão ambiciosa para o setor das carnes, posicionando Portugal como concorrente de peso no panorama europeu e mundial. «Nós queremos estar a rivalizar com os nossos concorrentes europeus e mundiais», declarou, com foco nos segmentos de aves, suínos e lacticínios: «No setor das aves, dos suínos, dos lacticínios queremos estar, efetivamente, com os maiores e melhores do mundo.»
O governante destacou indicadores encorajadores: «São sinais muito positivos daquilo que o nosso setor está a atravessar, com perspetivas de grande crescimento.» A produção extensiva surge como alavanca estratégica de valorização territorial, com «um espaço de crescimento gigante». Nesse sentido, alertou para o abandono de vastas áreas com elevado potencial produtivo: «Parte do nosso território nacional, que tem excelentes condições de produção, está abandonada. Temos de tentar incentivar, não só através dos jovens agricultores, mas principalmente no apoio ao extensivo.»
A aposta passa por apoios direcionados: «Temos apoios diversificados principalmente para as nossas raças autóctones», reforçando a sustentabilidade e a revitalização rural. O discurso projeta um setor dinâmico, assente em inovação, incentivos e preservação do património nacional.
MAPA: Movimento Ambiente e Produção Alimentar, Graça Mariano
A Dra. Graça Mariano, também porta-voz do MAPA – Movimento Ambiente e Produção Alimentar, trouxe a mensagem central:
“A carne não é inimiga do planeta. Bem gerida, é aliada na regeneração de solos, captura de carbono e equilíbrio ecológico.”
“World Without Cows”: O Documentário que Ninguém Esquece
Às 14h30, Josep Roquet (Alltech Iberia) apresentou o provocador “World Without Cows”.
Foi um exercício de imaginação racional. Sem vacas perdemos o leite, a carne e o ciclo vital da agricultura. Os solos empobrecem e a Biodiversidade colapsa. Os ruminantes bem geridos são parte da solução climática, não do problema.
Mesa Redonda: Ciência, Saúde e Agronomia no Mesmo Prato
Moderada pelo jornalista do Jornal Público Edgardo Pacheco, a mesa reuniu quatro gigantes de conhecimento alimentar:
- Prof. Albano Beja Pereira, FCUP | Ética animal e sustentabilidade genética
- Prof.ª Conceição Calhau, Medical School | Nutrição, saúde humana e equilíbrio alimentar
- Josep Roquet, Altech Iberia | Inovação técnica na produção animal
- Prof. Manuel Cancela Abreu, Universidade de Évora | Agronomia e futuro da criação animal
1. O Valor Nutritivo Insubstituível da Carne
Há 2,5 milhões de anos, a inclusão da carne na dieta ancestral impulsionou o salto cerebral do género Homo, distinguindo-nos de primatas vegetarianos. Apesar de representar apenas 2 % do peso corporal, o cérebro consome cerca de 20 % da energia total em repouso. Esta exigência energética só foi satisfeita graças aos nutrientes densos e biodisponíveis da carne.
Proteínas de elevada qualidade, ricas em aminoácidos essenciais, fornecem os blocos de construção para neurotransmissores e sinapses. Ainda mais cruciais são os micronutrientes abundantes em tecidos animais: a vitamina B12, ausente em plantas; o ferro heme, absorvido com maior eficiência em comparação com o ferro de origem vegetal; o zinco, vital para a divisão celular neural; entre outros.
Estudos mostram que o consumo moderado (2–3 porções semanais) em crianças melhora o desempenho cognitivo; em idosos, reduz o risco de fraturas.
A chave não está em excluir, mas em combinar o consumo de várias espécies de animais. Uma alimentação saudável exige múltiplas fontes de proteína para garantir todos os nutrientes essenciais, devemos assim consumir carne de espécies variadas de forma equilibrada.
Sem carne, a suplementação torna-se obrigatória e nem sempre acessível, sustentável ou eficaz.
2. Sustentabilidade Ambiental: Regeneração do ecossistema
Com pastoreio regenerativo, 1 hectare de pastagem sequestra até 1,5 toneladas de CO₂ por ano. Um quilo de carne portuguesa, em sistemas bem geridos, torna-se neutro em carbono em sete anos.
Sistemas de pastoreio extensivo fixam três famílias por cada 100 hectares, combatendo a desertificação demográfica e fortalecendo a resiliência das comunidades face a secas e fogos.
Em vez de competir com a agricultura, a criação animal integra-se em sistemas agrossilvipastoris, como o montado alentejano ou os prados arborizados do norte. Nestes modelos, árvores, pastagens e animais formam um ecossistema circular regenerativo:
– Sequestro de carbono até 2,1 t CO₂/ha/ano;
– Redução da necessidade de fertilizantes sintéticos;
– Aumento da matéria orgânica do solo;
– Preservação de biodiversidade (aves, insetos polinizadores, micorrizas, etc.).
3. Património Cultural e Identidade Nacional
A carne não é apenas alimento, é património cultural. Pratos tradicionais representam cerca de 42 denominações de origem e indicações geográficas protegidas, ligadas a tradições centenárias. Eliminar a carne seria ignorar a essência da nossa cultura, além de comprometer milhares de empregos e sabotar a base alimentar da nossa sociedade.
A dieta mediterrânica, reconhecida pela UNESCO como Património Cultural Imaterial da Humanidade, tem no consumo moderado de carne um dos seus pilares identitários. O aproveitamento dos recursos alimentares animais é a principal fonte de rendimento e nutrição de inúmeras comunidades desfavorecidas ao redor do mundo, muitas vezes sendo a única forma de obter proteína em países em desenvolvimento.
Conclusão: Equilíbrio, sem extremos
carne não é o problema, é parte da solução. Nutricionalmente insubstituível para a nossa saúde, ambientalmente regenerativa quando bem gerida, culturalmente enraizada, e economicamente útil, merece lugar num debate informado, longe de dogmas ideológicos e visões enviezadas. O futuro sustentável passa por sistemas integrados, não por exclusões. Carne não representa apenas um alimento, carne é liberdade para sermos saudáveis, inteligentes e produtivos.
“Não é um evento. É um movimento.”
Secretário de Estado da Agricultura, Eng. João Moura
– “Nós queremos estar a rivalizar com os nossos concorrentes europeus e mundiais.”
– “No setor das aves, dos suínos, dos lacticínios queremos estar, efetivamente, com os maiores e melhores do mundo.”
– “São sinais muito positivos daquilo que o nosso setor está a atravessar, com perspectivas de grande crescimento.”
– “Na perspectiva de valorização do território, a nossa produção extensiva tem um espaço de crescimento gigante.”
– “Parte do nosso território nacional, que tem excelentes condições de produção, está abandonada. Temos de tentar incentivar, não só através dos jovens agricultores, mas principalmente no apoio ao extensivo.”
– “Temos apoios diversificados principalmente para as nossas raças autóctones.”
– “Vai ser brevemente aprovado o “Dia da raça autóctone”, dia 11 de novembro.”
– “Foi proposto à DGA a criação da “Marca Portugal de raças autóctones”.”
Agradecimento – Seminário Anual da APIC “Carne: Ética e Preconceito”
No passado dia 29 de outubro de 2025, a Associação Portuguesa dos Industriais de Carnes (APIC) realizou em Leiria o seu Seminário Anual, sob o tema “Carne: Ética e Preconceito”. Um encontro que se afirmou como um importante espaço de reflexão, diálogo e partilha de conhecimento sobre o papel da carne na sociedade atual — um tema tantas vezes debatido, mas nem sempre compreendido na sua complexidade.
O evento contou com a presença do Presidente da APIC, Dr. Carlos Ruivo, do Vice-Presidente da CCDR Centro, Eng.º Vasco Estrela, e do Secretário de Estado da Agricultura, Eng.º João Moura, que, nas suas intervenções, destacaram a importância de um setor que é essencial para a economia nacional, para a coesão territorial e para a segurança alimentar.
Os oradores convidados trouxeram perspetivas diversas, contribuindo para um debate construtivo sobre ética, sustentabilidade, inovação e perceções sociais em torno do consumo de carne. Foi um momento de valorização da ciência e da transparência, reforçando a necessidade de comunicar de forma equilibrada e informada sobre o papel da produção animal num sistema alimentar sustentável.
A APIC deixa ainda um reconhecimento especial à empresa associada Carreirinho dos Leitões, que tornou o evento possível, oferecendo o almoço, o coffee-break e o espaço que acolheu o seminário — um gesto de partilha e compromisso que reflete o espírito de cooperação do setor.
O sucesso deste encontro reforça a importância de continuar a promover o diálogo entre produtores, consumidores e decisores políticos, com base no conhecimento e no respeito mútuo.
Fonte: APIC











































