Todos nos lembramos que quando no final da década de 1990 apareceram na Europa os primeiros alimentos geneticamente modificados (OGMs), designadamente soja OGM destinada à alimentação animal, os grupos da ecologia profunda logo os denominaram comida de “Frankenstein”. Estes poderosos lobbies não informaram os europeus que as culturas OGMs estavam aprovadas em inúmeros países, ocupando atualmente 202 milhões de hectares em 27 países, com os Estados Unidos na liderança com 75 milhões de hectares plantados (milho, soja, algodão, etc.) e, em 2015, a autoridade sanitária competente autorizou a venda de salmão geneticamente modificado para consumo humano no país (este salmão cresce duas vezes mais depressa que o salmão do Atlântico convencional, com menos 25% de ração); entretanto a autorização para consumo esteve suspensa até 2019 porque os senadores norte-americanos decidiram discutir a rotulagem.
E, na verdade, até ao presente, a Greenpeace e outras organizações não governamentais, conseguiram que na União Europeia (UE) a cultura de plantas OGMs esteja restrita à do milho transgénico, em Portugal e em Espanha e apenas destinado à alimentação animal; mas, como é resistente a algumas pragas, nomeadamente à broca, devido ao facto de proceder da bactéria natural Bacillus thuringiensis, inócua para o homem e para os animais, o referido milho OGM oferece a vantagem de dispensar a aplicação de inseticidas e, deste modo, não prejudica a biodiversidade.
Acresce que a descoberta da estrutura do ácido desoxirribonucleico – ADN, por Crick e Watson, em 1953 – viria também a proporcionar um avanço científico notável no campo da medicina.
Em 1982 a insulina recombinante tornou-se o primeiro medicamente a ser produzido por engenharia genética, o que trouxe enormes benefícios, nomeadamente para os diabetes mellitus tipo 1, cujo tratamento envolve a aplicação de insulina injetável (até então extraída do pâncreas dos porcos e das vacas, com todas as dificuldades inerentes a esta extração). Nalguns países, designadamente na Alemanha, a introdução deste novo medicamento criou contudo alguma controvérsia (tratava-se, afinal, do primeiro OGM).
Atualmente os medicamentos biotecnológicos já representam 10 a 15% do mercado farmacêutico, muitos dos quais são inovadores.
Falando ainda da moderna biotecnologia importa assinalar que, em 2012, duas cientistas notáveis, que viriam a ser laureadas com o Prémio Nobel da Química 2020, desenvolveram uma tecnologia de edição do genoma muito sofisticada, denominada “tesoura genética” CRISPR-Cas9, que permite alterar o ADN de plantas, animais e microrganismos com extrema precisão.
Estas Novas Técnicas Genómicas (NTG) podem: (i) modificar as plantas induzindo mutações mais precisas, o que se denomina mutagénese induzida; (ii) ou através da manipulação dos genes da própria planta ou de plantas que podem ocupar-se na natureza (cisgénese).
Importa sublinhar que na utilização das NTG não é introduzido material genético estranho e, além disso, as plantas melhoradas pelas NTG não são passíveis de serem detetadas por técnicas laboratoriais, relativamente às plantas obtidas por melhoramento convencional.
As NTG permitem, obviamente, proceder ao melhoramento de forma muito célere e precisa, o que assume grande relevância, tanto mais que a UE tem prevista, por um lado, a redução do uso de adubos inorgânicos e de pesticidas, e, por outro, a ocupação em modo de produção biológico de 25% dos solos agrícolas; ademais, diversos países terceiros cientificamente avançados e parceiros comerciais da UE, já estão a aplicar as NTG, em que a regulamentação das novas plantas, sem introdução de genes exógenos, é equivalente à adotada para as variedades melhoradas de forma convencional.
No Velho Mundo, onde há duas décadas foi publicada uma legislação muito restritiva para os OGMs, a mesma ainda não foi adaptada nem para os OGMs (cultivados em todo o Mundo) nem para as plantas melhoradas com recurso às NTG. Nos corredores de Bruxelas estão agora a dar-se os primeiros passos sobre a regulamentação a aplicar às plantas melhoradas com recurso às tecnologias de ponta.
Engenheiro Agrónomo, Ph. D.
Do Prado ao Prato na perspetiva de um fruticultor português – Manuel Chaveiro Soares