Novo conjunto de diplomas que o Governo esteve a analisar e a aprovar em Conselho de Ministros não vai evitar novos incêndios, agrava o desordenamento e impõe restrições “ideológicas” à floresta, defende João Machado.
A Confederação dos Agricultores Portugueses (CAP) defendeu na manhã desta terça-feira que a reforma da floresta – um conjunto transversal de 12 diplomas que ainda terá, em algumas matérias, que passar na Assembleia da República – “não atinge o objectivo principal”, que deveria ser impedir novos incêndios, afirmou João Machado.
O presidente da CAP, que esta manhã deu uma conferência de imprensa na sede da confederação, em Lisboa, criticou especialmente as alterações propostas pelo executivo em dois diplomas, em que sublinhou os “objectivos políticos” do Governo de António Costa – reunido nesta terça-feira em Sintra para aprovar a Reforma da Floresta.
Para a CAP, o facto de as mudanças proposta pelo Governo darem “mais competências às autarquias” no ordenamento florestal, passando o parecer dos presidentes de câmaras municipais a ser “vinculativo”, é a demonstração que “o Governo e o Ministério da Agricultura”, perdem “todo o controlo nesta matéria”. “Perde-se a capacidade para coordenar uma política florestal” para todo o território nacional continental, defendeu o presidente da CAP.
“Estivemos a fazer um ordenamento que começou com 21 Programas Regionais de Ordenamento Florestal (PROF). Foi decidido que era demasiado disperso”, tendo-se concentrado em “sete regiões”, começou por explicar o seu ponto João Machado. “Ficámos surpreendidos quando o Governo decidiu verter 21 PROF em 278 PDM (de Plano Director Municipal).” “Como é que isso se plasma?”, questionou. E respondeu: “Não é possível ter 278 políticas florestais no território nacional em Portugal Continental” – “em vez de termos uma política florestal nacional”, o país “passa a ter 278 planos” locais para ordenar a floresta.
Questionado durante a conferência de imprensa sobre se “haveria interesses” subjacentes a esta alteração – que faz com que o parecer do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) deixe de ser vinculativo nesta matéria – o presidente da CAP afirmou: “Não sei se haverá interesses sem ser o político, em ano de autarquias”.
Limites ao eucalipto
Na conferência de imprensa da CAP sobre a reforma da floresta, os eucaliptos também marcaram presença. A confederação, parceira em sede de concertação social, criticou as mudanças propostas pelo Governo, qualificando-as como uma “fragilização que um conjunto de diplomas impõe na economia” da floresta. Sobre a proibição de aumento da mancha de eucaliptos em novas áreas, João Machado advogou que esta decisão é resultante de um “compromisso político que tem subjacente uma ideologia política e não uma realidade económica”.
Recordou que uma das maiores indústrias exportadoras portuguesas – a pasta e o papel – tem que recorrer ao exterior para abastecer-se de matéria-prima. Um terço da matéria-prima necessária à indústria papeleira nacional tem que ser importada, acrescentou. “Sobretudo da América Latina e de pior qualidade”.
As críticas foram sobretudo para o partido Os Verdes, com o qual o Partido Socialista assinou um acordo para a formação do executivo (a 10 de Novembro de 2015), em que se comprometia a revogar a liberalização de plantação de eucaliptos no país, permitida pelo executivo de Passos Coelho. Um “acordo político do Governo” de António Costa com “um pequeno partido político que não mostrou o que vale sozinho, porque vai sempre [a votos] em coligação”, afirmou João Machado aos jornalistas esta terça-feira.
O líder da Confederação dos Agricultores de Portugal disse que entre 1995 e 2005 a área de eucalipto em hectares cresceu 1% no país, 0,73% entre 2005 e 2010 e 0,44% desde 2013 – altura em que entrou em vigor a legislação que liberalizou a plantação de eucalipto. Ou seja, se “não cresceu tanto” a mancha deste tipo, “porque é que se limita” a plantação de eucaliptos, que é a que dá “maior rendimento aos agricultores”? Para João Machado, “há uma ideia pré-concebida, que é ideológica, e que se tornou política” na elaboração da reforma agora aprovada. E que “priva” mais terrenos hoje no abandono de se tornarem “florestais”.
Finalmente, e no rescaldo de 160 mil hectares ardidos em 2016, a direcção da CAP salientou a sua discordância quanto à reforma no que se refere ao Sistema de Defesa da Floresta contra Incêndios (SDFCI). Nomeadamente, a falta de divulgação da “avaliação externa do Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra os Incêndios (PNDFCI)”, que embora com dez anos de atraso, disse, foi feita. Mas não divulgada. Ou seja, a avaliação dos objectivos do PNDFCI não foi “tida em conta pelo Governo na ponderação das alterações” ao sistema de defesa contra incêndios “que promove”.