Dizia o meu pai que “nós não devemos dizer que somos sérios, os outros é que devem dizer isso de nós”. Há 90 anos, quando ele nasceu, quase toda a gente tinha uma vaca, umas ovelhas e umas cabras no quintal, um porco à porta da cozinha e algumas galinhas por todo o lado. Portanto toda a gente sabia como era criado o seu “alimento”. Há 30 anos, os nossos vizinhos ainda vinham com uma cântara buscar o leite durante a ordenha ou comprar uma dúzia de ovos e, portanto, viam como eram tratados os animais e não se deixariam impressionar por um vídeo ou documentário editado e manipulado.
Hoje somos menos de 5% a alimentar os outros 95% que estão longe, na cidade. Mesmo quando moram perto, vão ao supermercado comprar o leite que o agricultor vendeu à cooperativa, passou pela fábrica, pelo armazém e pelo supermercado, o frango que passou no matadouro ou a batata que passou na central hortícola antes de seguir o restante percurso.
Entretanto, há quem queira vender novos produtos para substituir a proteína animal que consumimos há muito tempo (através da caça e da pesca) e criámos, desde que domesticamos os animais, há 10.000 anos. E há também quem não queira comer carne, ovos ou leite e não queira que os outros comam. E lançam acusações sobre a forma como os animais são tratados. E os consumidores, agora distantes dos produtores, ficam com dúvidas e exigem respostas. Por causa disso, quem recolhe, transforma e comercializa o leite que produzimos avançou com um processo de certificação em bem-estar animal.
Quando me ligaram há meses para marcar a visita de controlo da certificação, acedi com um misto de satisfação e apreensão. Sempre fui positivo, mas cuidadoso, em relação a “exames”. Já vamos no segundo ano e no ano passado não houve problemas, portanto este ano também devia correr bem, pensei. Ainda assim, na véspera do exame “queimei pestanas” a rever o manual de auditorias que nos enviaram. Esta semana chegou o diploma.
O bem-estar animal é uma ciência. Há uma série de critérios científicos definidos e verificados por veterinários. Um desses critérios analisa a reação dos animais à aproximação de um humano. Quem faz a inspecção, neste caso, uma veterinária, aproxima-se sucessivamente das vacas e regista se elas fogem com medo ou se aproximam curiosas. Há sempre excepções de feitio, há sempre um animal mais assustado ou manso, mas se a maior parte se aproxima é sinal que costumam ser bem tratadas. Há imagens (e certificados) que valem mil palavras, por isso fico por aqui… Bom domingo!
#carlosnevesagricultor
O artigo foi publicado originalmente em Carlos Neves Agricultor.