Comissão Europeia avança este ano com uma iniciativa para promover o sector das algas. A aposta na agricultura marinha promete trazer sabores novos, e mais sustentáveis, da água salgada para o nosso prato.
Há cerca de 1200 milhões de anos surgiam os primeiros parentes unicelulares das algas. Estas formas de vida ancestrais ficariam talvez com uma pontinha de inveja – se fossem dotadas de emoções, claro – da popularidade que as “primas” actuais gozam. Hoje as algas são vistas como um recurso com “enorme potencial” – as palavras são da Comissão Europeia, que vai avançar com uma “estratégia para as algas” – e, por isso, há todo um esforço financeiro e legislativo para apoiar o cultivo destes organismos. A aposta na agricultura marinha promete trazer sabores novos, e mais sustentáveis, da água salgada para o nosso prato.
“Não imaginava que as algas viriam a ter a explosão de interesse que têm hoje. Costumo dizer que se a empresa ALGAplus tivesse surgido agora, teríamos tido um percurso muito mais facilitado do que tivemos em 2012. Éramos vistos como completamente loucos, foi-nos dito muitas vezes pelos nossos parceiros científicos que estávamos [insanos] porque isto de cultivar algas só mesmo na Ásia. E só passaram dez anos e já estamos a ver um panorama completamente diferente em Portugal”, afirma ao PÚBLICO a bióloga marinha Helena Abreu, co-fundadora e directora geral da ALGAplus, uma empresa em Ílhavo que produz e vende macroalgas.
Helena Abreu faz parte do grupo de agricultores marinhos que a União Europeia quer ver crescer e singrar. A directora-geral da ALGAplus vê-se a si própria mais como uma aquacultora de algas, mas há vozes no sector que preferem evitar o termo aquacultura, que evoca muitas vezes conotações negativas associadas ao uso excessivo de antibióticos, por exemplo. E daí a expressão agricultura do mar.
“A bem dizer, fazemos aqui mais agricultura costeira do que do mar”, brinca Helena Abreu, uma vez que a empresa reaproveitou as antigas marinhas de Aveiro para o cultivo de algas. “São zonas de água salgada de boa qualidade que estavam, na sua maioria, completamente ao abandono. Estamos a trabalhar na recuperação deste património costeiro”, explica a responsável. Portugal actualmente não possui cultivo comercial em mar aberto, uma actividade que exigiria criar andaimes ou outras estruturas robustas para resistir ao hidrodinamismo.
A agricultura marinha é um dos temas abordados nos eventos paralelos da Conferência dos Oceanos, que decorre de 27 de Junho a 1 de Julho em Lisboa. A sessão informativa online “Algas: soluções alimentares aquáticas para as pessoas, o clima e os oceanos” está agendada para o dia 28, das 8h às 9h30, sendo organizada conjuntamente pelas organizações WorldFish, Universidade Agrícola Sylhet, no Bangladesh, WWF International e Safe Seaweed Coalition.
Esta última entidade, que agrega os diversos actores interessados numa indústria das algas segura e sustentável, também vai organizar uma reunião anual em Lisboa no próximo dia 29 de Junho, à margem do grande evento das Nações Unidas. O objectivo do encontro é discutir as questões que preocupam e motivam o sector não só nesta fase de crescimento, mas também no contexto da urgência climática. A segurança alimentar e as condições dos trabalhadores na indústria também são dois tópicos que, segundo Helena Abreu, deverão estar em discussão.
Algas são as novas proteínas?
Nas próximas três décadas, a população global pode chegar aproximar-se dos 10 mil milhões de habitantes. Será necessário encontrar soluções para alimentar todas estas pessoas de uma forma mais sustentável, ou seja, produzindo alimentos nutritivos que envolvam o mínimo de emissões possível. As algas surgem então como uma das alternativas aos produtos que têm uma enorme pegada ecológica, como é o caso da carne bovina.
“Vendemos para empresas que depois vão transformar estes ingredientes em molhos para massas, pão, refeições prontas. Vemos muito também a substituição da proteína animal ou simplesmente a sua utilização para acrescentar valor nutricional aos alimentos, já que as algas são muito ricas em minerais específicos (ferro, cálcio, magnésio, potássio e iodo), além das proteínas. As algas são cada vez mais vistas como um alimento não só sustentável, mas também saudável”, explica Helena Abreu.
Um quilo de bifes de vaca requer cerca de 15 mil litros de água para ser produzido. Isto sem falar nas emissões. Já as algas podem ter um efeito positivo: armazenam carbono, produzem oxigénio e consomem azoto. Se feita de forma eficiente e sustentável, acredita a Comissão Europeia, a agricultura do mar pode ser um instrumento para mitigar os efeitos do clima e oferecer saídas para […]