A ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável, em conjunto com 155 organizações ambientais europeias, apela à Comissão Europeia e aos Estados-Membros (UE) para que seja decretada de imediato uma moratória à construção e aprovação de novas unidades de incineração de resíduos.
Atualmente, a UE enfrenta uma sobrecapacidade de incineração estimada em 60 milhões de toneladas,1 o que compromete o cumprimento das metas de prevenção, reutilização e reciclagem de resíduos – pilares fundamentais da hierarquia de gestão de resíduos e da economia circular.
Incineração: uma falsa solução com elevado custo climático e ambiental
A incineração é frequentemente apresentada como uma solução de valorização energética. No entanto, estudos recentes2 confirmam que a sua intensidade carbónica é superior à de muitas fontes convencionais de energia – mesmo quando as unidades operam dentro dos limites legais de emissão -, devido ao elevado teor fóssil dos resíduos queimados, sobretudo plásticos. Esta realidade coloca a incineração em contradição direta com os compromissos do Pacto Ecológico Europeu e com o objetivo de neutralidade carbónica até 2050.
A construção de novas unidades resultaria em infraestruturas poluentes que perdurariam por décadas, dificultando a transição energética e climática.
Impactos na saúde e no ambiente
Apesar dos avanços nos sistemas de controlo, a incineração continua a gerar emissões poluentes graves, incluindo dioxinas, metais pesados e substâncias perfluoroalquiladas (PFAS). Estes contaminantes persistem no solo, na alimentação e até no corpo humano, estando associados a cancro, perturbações do desenvolvimento e disfunções imunológicas.3
Para além disso, a incineração não elimina a necessidade de aterros: cerca de 16 milhões de toneladas de resíduos resultantes do processo, muitos de caráter perigoso, são anualmente depositados em aterro.4
O caso Português
Em Portugal a discussão sobre a construção de mais capacidade de incineração está a decorrer e os dados são claros. Portugal Continental tem atualmente capacidade instalada de incineração para cerca de 20% dos seus resíduos. Se os investimentos previstos forem concretizados, iremos estar perante uma situação em que a incineração irá impedir o cumprimento das metas de reciclagem, isto porque, em 2035, Portugal deverá reciclar 65% dos seus resíduos urbanos. Se a este valor adicionarmos os 20% de incineração (já existentes), os 10% permitidos em aterro e os 4% em Combustível Derivado de Resíduos (CDR), resta apenas 1% dos resíduos. Dado que as previsões são de aumento de capacidade de incineração para 33%, 41% ou 44% (dependendo dos investimentos que se concretizarem), é fácil ver que a incineração de resíduos é incompatível com a promoção da economia circular em Portugal.
Esta situação é ainda mais preocupante quando olhamos para a circularidade da economia portuguesa, que em 2023 estava em 2,8%, sendo que a meta global (para a qual os resíduos urbanos deverão contribuir) é de 22,4% em 2030 (objetivo da UE).5
O caminho certo: economia circular
Uma moratória sobre novas incineradoras é não só uma medida urgente de proteção climática e da saúde pública, como também um passo fundamental para orientar o investimento para infraestruturas e medidas que promovam a economia circular – tais como sistemas de reutilização integrais, sistemas eficientes de pré-tratamento do indiferenciado (TMB) e triagem da fração reciclável, recolha de alta eficiência dos biorresíduos alimentares combinada com a compostagem descentralizada. Estas alternativas oferecem benefícios económicos, ambientais e sociais muito superiores, fortalecendo a resiliência da Europa face à crise climática.
A ZERO e as organizações subscritoras apelam a:
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Moratória imediata para a construção de novas instalações de incineração;
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Estratégias nacionais e da UE para reduzir progressivamente a capacidade de incineração existente; assim como:
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Investir em soluções de economia circular, ambientalmente responsáveis e alinhadas com o Clean Industrial Deal.
Fonte: ZERO