É preciso preparar o futuro na agricultura para se enfrentar as alterações climáticas, defende Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da Confederação dos Agricultores e Portugal (CAP).
Convidado do programa As Três da Manhã, Oliveira e Sousa admite que “há culturas que possivelmente vão deixar de poder ser feitas, e eventualmente até novas culturas que possam vir a ser feitas”.
“É necessário ir prevendo estas consequências com instrumentos financeiros, com instrumentos de ajuda aos agricultores, fazendo um esquema sobre como avançar quando existem carências mais graves. Precisamos de ir preparando o futuro para estas novas situações” de seca, afirma.
“E também é preciso estudar, ou seja, a academia também tem de se debruçar sobre quais são as culturas do futuro, como é que nos adaptamos à transferência para essas culturas”, destaca.
Há um ano, a CAP reivindicou um plano nacional de emergência para seca. O Governo avançou com um Plano Nacional de Regadios, que a Confederação de Agricultores considera insuficiente.
“Não é só dizer que vamos fazer mais barragens e o problema está resolvido. Não está. Tudo isto vai levar algum tempo e é preciso ter um plano – é desse plano que achamos que estamos carentes”, resume Eduardo Oliveira de Sousa.
Adriano Bordalo e Sá, hidrobiólogo e investigador do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, também é da opinião de que “a reinvenção é, obviamente, necessária”.
O especialista critica também a política europeia para a agricultura (PAC), que condicionaram e prejudicaram o setor em Portugal.
“As nossas polícias agrícolas, muitas delas resultantes da Política Agrícola Comum, conduziram a basearmos parte da nossa atividade no regadio, mesmo em zonas onde à partida, e tradicionalmente, o que se fazia era o sequeiro. Criaram-se grandes expectativas nos agricultores agora de repente acordamos para esta situação, cada vez mais frequente, que aquelas fontes de água que eram utilizadas para esses regadios secaram ou estão em níveis muito baixos”, afirma à Renascença.
Culturas ameaçadas
O tempo seco e quente que se tem feito sentir está a ameaçar as culturas de inverno e de primavera/verão. O alerta é feito pelo presidente da Confederação dos Agricultores e Portugal. As reservas de água estão em baixa um pouco por todo o país.
“Todo o país está a atravessar uma fase de carência de reserva de água, até já no próprio solo – porque não é apenas a quantidade de água que temos reservada nas barragens, é também a quantidade de água que devia estar acumulada no território e que não está porque não choveu. E por isso mesmo os rios correm menos, não há água no solo, a temperatura está elevada, há pouca humidade durante o dia e há muito menos água nas barragens”, explica.
“Estão em risco, quer as culturas chamadas ‘de inverno’, porque não choveu água suficiente e não há reserva de água no solo para elas completarem o ciclo, e estão em risco as culturas chamadas ‘de primavera’ ou ‘primavera/verão’ porque pode não haver água suficiente para regar essas culturas”, adianta.
Bordalo e Sá é perentório: “recuperação em si, este ano não vai ser possível”. A não ser que, em abril e maio, chova 40% mais do que choveu até agora. De outro modo será impossível repor os níveis das albufeiras, sobretudo nas zonas mais afetadas pela seca, afirma.
O pasto para os animais é outra preocupação. Se continuar sem chover vai secar mais depressa e acabar mais cedo.
E a fatura da água poderá vir a tornar-se mais pesada. “Depende da política das entidades distribuidoras”, diz o hidrobiólogo.
“Para já, a prática dos últimos anos é a redução dos lucros das empresas [que têm de gastar mais dinheiro para procurar novas origens e não prejudicar a qualidade da água das torneiras], mas a legislação europeia é muito clara no que diz respeito a esse assunto: a água não pode ser vendida a um preço inferior ao que custa”, exceto nas situações de famílias menos favorecidas.
De acordo com as previsões do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), o tempo deverá manter-se sem chuva pelo menos até ao fim do mês. E para abril não se prevê muita precipitação.