O Algarve vive a pior seca deste século, num ano de grande assimetria nos recursos hídricos no território nacional. Agência Portuguesa do Ambiente traça linhas fortes da resposta estrutural à seca.
Actualmente temos 26% do território de Portugal continental em seca extrema ou severa – é muito diferente do que se passava no mesmo período há um ano, quando 97% do território estava nessa situação, sublinha José Pimenta Machado, vice-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). “Mas a má notícia é que o alívio é no Norte e no Centro. No Sul, em particular no Algarve, mas também na bacia do Mira e do Sado, continuamos a estar muito preocupados”, salientou. A situação é especialmente complicada com as águas subterrâneas.
No Algarve, a seca agravou-se em relação ao ano passado. Se a capacidade total das seis albufeiras que abastecem a região é de 446 hectómetros cúbicos (hm3) de água, neste momento têm armazenados apenas 153 hm3. “Em relação a esta altura no ano passado, temos menos 25 hm3 no conjunto das albufeiras” do Algarve, contabilizou Pimenta Machado, numa conversa com o Azul, em que apresentou a avaliação feita pela APA da situação da seca em Portugal e algumas acções planeadas para a combater.
O que se passa com as águas armazenadas à superfície tem um reflexo nas águas subterrâneas. Há 93 massas de água subterrâneas identificadas no território português e, dessas, 17 estavam em situação crítica em Junho, avançou Ana Rita Lopes, coordenadora do sector das águas subterrâneas na APA. “São praticamente todas localizadas no Algarve”, sublinha.
Se no Norte e no Centro as fortes chuvas de Novembro a Janeiro permitiram recarregar as reservas, tal como nas albufeiras à superfície, a sul do Tejo, e em especial no Algarve, o retrato que se desenha é outro. “No Algarve, a situação este ano está até ligeiramente pior do que em 2004/2005, que é a seca de referência – a pior deste século”, adianta Pimenta Machado.
Ana Rita Lopes mostra uma imagem com dois mapas de Portugal, que revela claramente a situação das águas subterrâneas em Junho de 2022 e Junho de 2023. No ano passado, grande parte do mapa estava pintada a vermelho. Este ano, a mancha vermelha concentra-se a sul do Tejo. Isto quer dizer que os níveis das águas subterrâneas estão abaixo do percentil 20, ou seja, que estamos a chegar às reservas das águas subterrâneas.
Isto acontece porque a precipitação em toda esta zona tem diminuído significativamente. “Mas as extracções continuam. Isto é um problema para as águas subterrâneas: a escassa precipitação por um lado, e continuar sempre a haver extracções”, sublinha Ana Rita Lopes.
Público e privado
No Algarve, a agricultura consome 35 hectómetros cúbicos das águas superficiais e 99 hectómetros cúbicos das águas subterrâneas. Isto mostra a importância das águas subterrâneas, um “recurso invisível”. Mas monitorizar e fiscalizar o seu uso não é fácil. “O desafio das águas subterrâneas é que estão no domínio privado”, diz Ana Rita Lopes. Isso torna difícil a sua gestão.
“Por exemplo, nas zonas vulneráveis à poluição por nitratos de origem agrícola, principalmente na margem esquerda do Tejo, temos tido situações em que os proprietários inviabilizam irmos lá recolher água para controlarmos a qualidade”, exemplifica a responsável da APA.
“É-se proprietário de um terreno até ao centro da Terra. Tudo o que estiver por baixo está ligado à propriedade”, diz Pimenta Machado, em termos simples. Porém, para explorar as águas subterrâneas é preciso pedir uma autorização – mas isso é diferente de pedir uma licença. “Se estivesse no domínio publico, a licença poderia ter condicionantes e ser provisória. Uma autorização é ad aeternum”, explica.
Por outro lado, a maior parte das 200 mil utilizações de água subterrânea autorizadas em Portugal são privadas. “A taxa de recursos hídricos que pagam é muito, muito, muito baixa. Se fosse públic,a era mais alta”, frisa o responsável da APA.
“Acho […]