Rui Gonçalves, que conheço e com quem discuto estas matérias aqui e ali, quando o encontro na rua, escreveu um artigo que o Público publicou ontem, com o título deste post.
É um bom artigo, que defende que as políticas florestais falham em grande parte por assentarem em mitos, e a mim interessa-me, para este post, as seis medidas básicas que Rui Gonçalves acha que deveriam estar num pacto de regime para o sector.
Concluir o cadastro e mantê-lo atualizado;
Desbloquear as heranças jacentes e indivisas;
Facilitar o emparcelamento e a gestão conjunta;
Consolidar os perímetros urbanos para evitar que as casas entrem pela floresta e vice-versa;
Expandir a utilização de fogo controlado e subsidiar outras ações de gestão de combustíveis;
Criar um quadro qualificado e profissionalizado de bombeiros florestais (não confundir com as corporações de bombeiros voluntários, peça essencial do sistema de proteção civil).
Todas as propostas são facilmente aceitáveis por mim (tenho dúvidas sobre a utilidade de tratar neste âmbito a questão dos perímetros urbanos), o que nos distingue, no entanto, é uma questão de prioridades e urgências.
Concluir o cadastro parece-me bem, é útil sob muitos pontos de vista, mas o efeito disso na gestão do fogo (ou da gestão florestal) é marginal, pelo menos no curto e médio prazo, como demonstra o facto de não haver diferenças entre a gestão florestal das zonas com e sem cadastro.
Desbloquear heranças é útil, mas também aqui não se resolve problema nenhum de fundo visto que a questão, antes de ser de acesso à terra, é de rentabilidade, portanto desbloquear as heranças é apenas transferir o bloqueio para outro ponto qualquer do processo, como demonstram as sucessivas tentativas dos vários governos com empresas públicas como a Lazer e Floresta e a Florestgal (de que Rui Gonçalves foi presidente até escrever um artigo lúcido sobre os fogos da Serra da Estrela).
Nada contra facilitar o emparcelamento e a gestão conjunta, matéria em que as celuloses têm demonstrado que a questão, antes de mais nada, é de rentabilidade, sendo por isso que as celuloses têm tido muito mais sucesso que o Estado na obtenção de resultados por esta via.
Sobram as duas propostas em que tenho insistido, embora numa delas prefira uma formulação diferente (não se trata de expandir o uso de fogo controlado e subsidiar ações de gestão, trata-se de pagar a gestão de combustíveis de maneira a que os gestores optem por expandir o fogo controlado e as ações de gestão, é a diferença entre uma formulação mais estatista e centralizada e uma formulação mais liberal).
O caminho faz-se caminhando e espero para ver o que pretende fazer o governo com o famoso plano criado em três meses para o sector.
Não tenho dúvidas que lá estarão as primeiras medidas de que fala Rui Gonçalves, como estão sempre em todo o lado (embora com os resultados práticos conhecidos), mas o que verdadeiramente será a pedra de toque é saber como vai ser tratada a questão do aumento da gestão que, aparentemente, todos estamos de acordo que será preciso promover.
Depois, por volta de 2030, voltaremos às discussões sobre o assunto, nunca volta à estava zero, claro, mas duvido que grande parte dos mitos à volta da atividade florestal em Portugal não continue a produzir políticas ineficientes e inúteis, infelizmente.
Estou como Rui Gonçalves: comecemos por estas seis medidas, e deixemos o resto.
O artigo foi publicado originalmente em Corta-fitas.