Tem uma profissão de sonho e sonha com outra que ainda não tem (e nem existe em Portugal). Pedro Silveira, beirão, serrano assumido, semeia futuro com as crianças das escolas do Fundão e o tempo livre é dedicado a uma das suas maiores paixões: o queijo
A sua missão é muito clara: transmitir conhecimento ancestral às crianças das escolas do concelho do Fundão – um território aninhado entre as duas serras mais imponentes da região: a Gardunha e a Estrela.
Para sermos mais específicos, Pedro Silveira foi encarregue pela autarquia para mostrar e explicar a todas as a crianças locais o que foram as profissões tradicionais da região, bem como a sua importância económica e social ao longos dos tempos.
“É apaixonante. O que é que posso dizer mais? Se eu não estivesse a fazer esta ponte entre os saberes do passado (ligados à produção da farinha para o pão, do linho para os tecidos, do leite para os queijos, etc) e aqueles que vão ser os adultos de amanhã, provavelmente perdia-se pelo caminho muita da nossa identidade histórica coletiva”, sublinha Pedro Silveira.
E é raro o dia, especialmente ao longo do período letivo, em que não faça de guia interprete para dezenas de crianças pelos campos e pelas aldeias que pontuam em vários locais daquele concelho serrano. Uma autêntica ‘sementeira’ de conhecimento, cultura e tradição.
Esta é, claramente, uma das suas paixões – sim porque o Pedro coloca um ênfase apaixonante e arrebatador em todas as palavras que vai buscar para falar daquilo que faz.
O que já não faz tão bem é esconder a sua outra paixão: o desejo de vir a ser o primeiro afinador de queijos em Portugal: “seria a concretização de um sonho, não o nego”.
Pedro Silveira trata por ‘tu’ quase todas as 210 ovelhas de raça Churra Mondegueira do rebanho do seu amigo pastor Daniel Anastácio, de 51 anos, ali mesmo à porta da aldeia onde reside e do onde é natural – Peraboa, na linha de fronteira entre os concelhos da Covilhã e do Fundão.
Marcámos encontro junto à igreja matriz, num domingo à tarde, debaixo de um sol abrasador, e daí seguimos de carro por estradas de terra batida até à quinta de Daniel Anastácio.
O pasto, apesar das regas diárias, começa já a deixar a cor de verde vivo – que o tingiu durante todo o inverno e primavera – para ir mudando para um amarelo meio esturricado. O calor é muito e, ainda assim, lá andam as ovelhas a pastar, em busca de trevo, azevem, festuca e serradela.
É da ingestão destas preciosas ervas que sai menos de um litro de leite por dia das tetas das churras mondegueiras. “É pouco, mas é um leite único e que dá origem ao famoso Queijo Serra da Estrela, entre outros. Só que para produzir um quilo de queijo são precisos cinco litros de leite crú [e este pormenor é muito importante, mas já lá vamos], explicam Daniel e Pedro.
O problema é que o mercado não paga o trabalho do pastor. Ou seja, por cada litro de leite entregue à transformação o pastor recebe apenas 95 cêntimos, sendo que o preço de um quilo de queijo junto do consumidor custa a partir de 12 euros.
“Para mim não há qualquer dúvida. O queijo devia ser mais caro para que o consumidor tenha a noção do custo de todo o ciclo de produção”, nota, indignado, Pedro Silveira.
Mas, na verdade, não fácil fazer com que o comum dos consumidores tenha a mínima noção do que está por detrás do ciclo de produção do queijo. Desde o tempo passado na pastagem, à ordenha, à preparação do leite com os coagulantes naturais (nomeadamente o cardo), à produção propriamente dita e depois a cura, que também é “uma ciência”, há […]