“No momento em que o vi, já sabia o que era, porque tem uns ‘primos’ do outro lado do Atlântico. Pensava que estava a sonhar, mas era real!” É assim que Ana Sofia Reboleira, investigadora do Centro de Ecologia Evolução e Alterações Ambientais (CE3C) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, recorda o momento da descoberta do pseudo-escorpião gigante do Algarve (“Titanobochica magna”), uma das mais de 70 novas espécies que descobriu e catalogou. Apaixonada pela espeleologia desde a infância e pela biologia desde a adolescência, especializou-se no estudo da fauna cavernícola, área em que as novas descobertas estão asseguradas à partida. “No mundo subterrâneo, não está tudo por fazer, mas está quase tudo por estudar”, diz.
A catalogação científica das espécies teve início no final do século XVIII, quando o botânico Lineu criou o sistema de classificação (com género e espécie) e catalogou cerca de oito mil exemplares. De então para cá, foram descritas perto de dois milhões dos oito a dez milhões de espécies. Uma lista que está longe de ser consensual e à qual todos os anos se acrescentam perto de 20 mil novos nomes, com a microflora, os insetos e as espécies do mar profundo a ganharem protagonismo.
“Na última década, descobrimos muitas espécies e muitas mais estão por descobrir – algumas até estão aqui, na faculdade, à espera do seu tempo para serem descritas. E a descrição de cada nova espécie vai aportar conhecimento de biodiversidade”, salienta Ana Sofia Reboleira.
Um passado com pouca tradição neste tipo de estudos e a inacessibilidade de muitos “habitats” explicam o pouco que se conhece sobre os seres que habitam as cavernas. Sabe-se que, na maioria, estas comunidades dependem de fontes de alimento externas e que se infiltram até ao subsolo através do movimento da água ou por via aérea. “Tudo o que fazemos à superfície terá impacto em profundidade. Se espalharmos pesticidas e inseticidas num campo agrícola, a chuva pode levar à sua infiltração e acumulação no solo, o que pressupõe um risco para a saúde e um risco ainda maior para o ecossistema… Se não houver linces em Portugal, podemos ir buscá-los a Espanha. Se dizimarmos uma população destas, não podemos ir procurar exemplares a um aquífero em França, não são a mesma espécie”, explica a investigadora.