A proposta de orçamento da nova PAC está a ser contestada pelas principais associações do setor. CAP, AJAP e Confagri estão alinhadas nas críticas ao que chamam a ‘nacionalização’ da Política Agrícola Comum.
A Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) manifesta a sua total discordância com a proposta apresentada pela Comissão Europeia para a Política Agrícola Comum (PAC) para o período de 2028-2034, “que prevê um corte direto de 22% relativamente ao anterior quadro financeiro, agravado pela ausência de atualização face à inflação, o que eleva o corte efetivo para cerca de 35% a preços correntes”, revela a associação em comunicado.
Também a AJAP Associação dos Jovens Agricultores de Portugal já veio condenar esta proposta, que prevê a integração da PAC num Orçamento Único (onde se incluem também os fundos regionais e de coesão): “O Plano de longo prazo do orçamento comunitário global, apresentado (…) é, para a AJAP, uma machadada no investimento na agricultura europeia, com consequências perigosas para a agricultura portuguesa. A proposta, que transfere para os Estados-membros (Governos nacionais) a responsabilidade da gestão dos fundos da PAC, põe em causa o apoio direto aos agricultores”.
Por seu lado, a CONFAGRI considera que “Ursula von der Leyen ao apresentar, formalmente, ‘Um Orçamento da UE dinâmico para as prioridades do futuro’ – o maior de sempre – que, incompreensivelmente, contempla um corte nominal de cerca de 22,5 % para a Política Agrícola Comum, assume claramente que não considera a agricultura uma prioridade estratégica para a Europa”, frisa esta confederação.
 
A nacionalização é igual a desigualdade
A CAP reitera que já transmitiu ao Comissário da Agricultura, Christophe Hansen, a sua firme oposição a esta proposta, considerando-a uma provocação aos Agricultores portugueses e europeus e um ataque frontal à soberania alimentar da Europa. E justifica: “A proposta de nacionalização da PAC, ao transferir responsabilidades e recursos para os Estados-Membros, só irá acentuar as desigualdades entre países mais ricos e mais pobres, agravando as disparidades na competitividade agrícola e colocando em risco o futuro do mundo rural” e informa que irá lançar, em conjunto com a organização de cúpula dos agricultores europeus, a Copa-Cogeca, uma campanha junto do Parlamento Europeu para que esta proposta seja rejeitada: “os agricultores portugueses e europeus vão lutar com todas as armas democráticas ao seu dispor para que seja reposta a justiça e apresentada uma nova proposta, com um orçamento robusto e que mantenha os princípios fundadores da PAC – uma política de sucesso, pilar do projeto europeu e essencial para a autonomia estratégica da União Europeia.
 
A proposta de nacionalização da PAC, ao transferir responsabilidades e recursos para os Estados-Membros, só irá acentuar as desigualdades entre países mais ricos e mais pobres
Fundo único no centro da discórdia
Para a AJAP, as contas são simples: “nesta reformulação, e de um orçamento global de dois biliões de euros, 302 mil milhões estão destinados à agricultura, dois mil milhões às pescas e 131 mil milhões de euros para a área da defesa e espaço. Esta nova reformulação do orçamento comunitário contempla a redução de sete para quatro rubricas e de 52 programas para 16. Basta comparar os últimos orçamentos da PAC (2020, 482,5 mil milhões; 2027, 395 mil milhões) e percebe-se o desinvestimento desta nova proposta, que não privilegia a Agricultura (um corte de 20%, abaixo do valor atual do Quadro Financeiro Plurianual), colocando em causa a vitalidade e desenvolvimento do setor, com particular ênfase na revitalização dos territórios rurais e graves consequências no rejuvenescimento do setor”, explica a associação representante dos jovens agricultores.
A AJAP frisa ainda que a proposta é um “duro golpe na natureza da PAC”, uma vez que desde 2000, a Política Agrícola Comum tem funcionado com um sistema de dois pilares, separando os Pagamentos Diretos (o I Pilar) dos projetos de Desenvolvimento Rural (II Pilar), sendo estes últimos financiados por programas plurianuais com cofinanciamento: “a nova proposta orçamental da UE elimina o II Pilar, deixando à mercê dos Estados-membros as ações de desenvolvimento rural, como o apoio aos pequenos agricultores ou as medidas agroambientais. Isto é um duro golpe nos objetivos de sustentabilidade e investimento que estão na base da PAC. Simplificar não é desinvestir, e esta proposta coloca em causa todo um esforço de décadas na agricultura europeia e também portuguesa. Será também o princípio do fim do desenvolvimento rural, comprometendo todos os esforços das últimas décadas e agravando ainda mais o abandono do setor e a desertificação dos territórios rurais em toda a Europa”.
Isto é um duro golpe nos objetivos de sustentabilidade e investimento que estão na base da PAC. Simplificar não é desinvestir, e esta proposta coloca em causa todo um esforço de décadas na agricultura europeia e também portuguesa
Fundo único é perverso
Do lado da Confagri, a proposta representa o início “de um processo de desmantelamento da mais antiga e verdadeira Política Comum Europeia: a Agrícola. Esta decisão pode causar perversidade na utilização dos fundos e irá originar assimetrias na aplicação da PAC entre cada Estado-Membro, colocando os mais débeis financeiramente numa posição de grande fragilidade”, explica a Confederação das Cooperativas Agrícolas.
E vai mais longe, dizendo que ao introduzir o conceito de um “Fundo Único”, a Comissão Europeia afirma-se como “Comissão Liquidatária do Desenvolvimento Rural, o que terá um impacto dramático em milhares de cooperativas, organizações de produção e agricultores portugueses e europeus”.
a Comissão Europeia afirma-se como “Comissão Liquidatária do Desenvolvimento Rural, o que terá um impacto dramático
Para Nuno Serra, Secretário-Geral da Confagri, “A atual proposta de Ursula von der Leyen representa um total desrespeito pelos agricultores, por aquilo que é a essência da PAC e por uma Europa mais unida em torno do objetivo comum de garantir segurança alimentar aos seus concidadãos. Acima de tudo, demonstra um desinteresse completo sobre o futuro do desenvolvimento rural e da agricultura, desprezando a necessária competitividade que o setor agroalimentar europeu tem de ter perante os outros blocos económicos.”.
O artigo foi publicado originalmente em Vida Rural.