Quando há um ano, no início da presidência portuguesa da União Europeia, colocámos na Agenda o tema da tendência altista dos preços das matérias-primas e a generalidade dos produtos para a alimentação animal, com consequências muito negativas para a indústria e toda a Fileira Pecuária, não imaginávamos uma conjuntura de tamanha complexidade e preocupação, que se foi agravando ao longo do ano com a crise energética e a disrupção das cadeias de abastecimento, até se tornar asfixiante e insuportável.
Face aos sucessivos alertas de degradação da cadeia de valor, a Comissão Europeia prometia acompanhar e monitorizar a situação, tentando empurrar as soluções para os Estados-membros, à luz das medidas nacionais, o que origina situações de concorrência desleal, pela capacidade financeira dos diferentes países.
Para Bruxelas, a regulação deveria (deverá?) ser feita pelos mercados, como se as consequências socioeconómicas da pandemia, o funcionamento e relações na cadeia de abastecimento e distribuição, ou o impacto da retração das importações chinesas, fossem homogéneas em toda a Europa.
Neste quadro disruptivo, Portugal tem sido dos países mais afetados pela sua exposição e vulnerabilidade, porque mais dependente, quer ao nível das matérias-primas, custos de contexto e estrangulamentos estruturais, quer na valorização dos produtos de origem animal, que, não raras vezes, são usados como isco. Basta olhar para as sucessivas promoções sem paralelo nos outros produtos vendidos nas prateleiras dos supermercados.
Nos diferentes fóruns em que participámos, no âmbito da PAC, no Grupo de Acompanhamento da Cadeia de Abastecimento ou reuniões informais, fomos denunciando toda esta situação, conscientes de que sem quaisquer medidas de suporte, sem um sinal de apoio, o caminho para o abismo era (é) uma questão de tempo.
Aqui escrevemos e repetimos, se nada for feito e com urgência, vamos ter falências, e encerramento de unidades fabris, de rações, de produção de carnes e de explorações pecuárias de porcos e vacas leiteiras. Vamos ter maior dependência, abandono do interior e do mundo rural. Empobrecimento.
No setor do leite ainda se reuniu a PARCA, apareceram alguns apoios, insuficientes, a indústria aumentou os preços, fizeram-se estudos e diagnósticos, apontaram-se estratégias, mas na carne de suíno, apesar da crise profunda, a indiferença prosseguiu o seu caminho.
Nem mesmo de Bruxelas, pasme-se…a Comissão Europeia não foi capaz de reagir a sucessivas cartas subscritas por inúmeros países, a alertar para o colapso de um setor que não só é relevante no panorama agroalimentar europeu, como um dos grandes exportadores.
Neste processo, é justo referir, que Portugal tem-se posicionado do lado dos que defendem medidas urgentes que, infelizmente, nem sempre têm merecido o apoio de Estados-membros como a Espanha ou a Alemanha, referências neste mercado.
Num cenário em que os preços das principais matérias-primas ou os custos energéticos não parecem inverter a tendência altista, foram necessárias mais pressões, do Conselho e sobretudo do Parlamento Europeu, da Comissão AGRI, reafirmando-se que asmargensdelucrodossuinicultoresestãoemníveiscriticamentebaixosequeénecessárioapoioimediatoatravésdemedidasnacionaisdirecionadasparaosectorsuinícola,noâmbitodosprogramasdedesenvolvimentorural e dos auxíliosestatais.
Apela-se a um forte apoio ao sector através de atividades promocionais não discriminatórias, destinadas a abrir novos mercados e consolidar os existentes, bem como uma intervenção de mercado a nível da União Europeia.
Exige-se uma ação alargada da UE para ajudar os suinicultores em toda a Europa, mas a Comissão Europeia continua a recusar esses pedidos de apoio financeiro direto, afirmando que seria contraproducente. As medidas de desenvolvimento rurale de auxílios estatais parecem ser as mais adequadas.
Nesta perspetiva, os países poderão considerar algumas medidas a nível nacional permitidas ao abrigo da regulamentação da PAC e da Organização Comum de Mercado, afinando os seus planos estratégicos de implementação da futura PAC, afim de assegurar que existem medidas de gestão dos riscos.
Entretanto, a Comissão aprovou um regime de 88 milhões de € pelas autoridades polacas para apoiar os agricultores polacos afetados pelas medidas COVID-19, com subvenções diretas de 290.000 € no máximo por beneficiário, e a França anunciou o lançamento de um plano de emergência de resgate, oferecendo 270 milhões de € para apoiar os suinicultores.
Em Portugal, na sequência de reuniões com a Ministra da Agricultura e das preocupações manifestadas publicamente, o Secretário de Estado Rui Martinho comprometeu-se com a Fileira da carne de porco, avançando com medidas excecionais para fazer face à gravidade da situação atual, de verdadeira emergência nacional: linha de crédito de apoio à tesouraria, isenção da TSU, acesso à eletricidade verde, bem como a melhoria das relações de negociação com os operadores da grande distribuição, sensibilizando-os para a compra de carne de origem nacional e para o terminus ou redução das permanentes promoções que pressionam os preços no produtor português. Por outro lado, deverá ser criado um Grupo de Trabalho no quadro do GPP para o efeito, pelo que aqui relevamos a importância da PARCA no quadro do próximo Governo.
Outro compromisso foi o de apoiar incondicionalmente as ajudas à armazenagem privada que vão ser discutidas a nível europeu, no âmbito do Conselho Agrícola informal de 7 de fevereiro.
Apesar da presidência francesa, é muito provável que não seja tomada nenhuma medida de larga escala de ajuda aos suinicultores.
É óbvio que continuaremos a lutar para viabilizar a Fileira suinícola mas precisamos de todos, unidos, coesos e numa estratégia comum e coerente, na defesa da suinicultura nacional. Em Portugal e em Bruxelas, reforçando o papel da FILPORC.
Para já, os compromissos do Governo são encorajadores e permitem alguma esperança e confiança.
Certos de que não são uma promessa vã e de “fim de ciclo”, a grande mensagem para o próximo Governo é a de que o Setor da suinicultura se muito aplaudido, e bem, pela sua estratégia de exportação para a China, não pode agora ser descartado.
Muito menos descartável.
Jaime Piçarra
Secretário-Geral