Alguns viticultores do Douro apontam para quebras de produção que podem chegar aos 50% e enquanto uns se mostram expectantes com o apoio anunciado pelo Governo outros alegam que chega num ano de pouca uva para destilar.
Na Régua, Sabrosa, Armamar ou São João da Pesqueira, há produtores que falam em quebras na colheita superiores à estimativa oficial de 20% do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV). Em Alijó a redução poderá não ser tão significativa.
“Não há uvas”, afirmou à agência Lusa Teresa Barbosa, viticultora em Sabrosa, que considerou que a medida criada pelo Ministério da Agricultura “seria boa num ano de grande colheita” como 2024.
O Governo aprovou um plano para a Região Demarcada do Douro (RDD) que prevê um apoio de 50 cêntimos por quilo de uvas entregue para destilação, com uma dotação orçamental de 15 milhões de euros financiada pelo Orçamento do Estado.
A medida foi criada depois de duas vindimas em que viticultores se queixaram de não conseguir escoar a colheita e do preço baixo de venda.
O Ministério da Agricultura disse que a medida tem como prioridade os pequenos viticultores, assegurando-lhes um rendimento mínimo e que permitirá reduzir os excedentes de vinho.
Na região há quem tenha dúvidas quanto à forma como vai ser aplicado o apoio, enquanto outros lamentam a implementação num ano de pouca uva.
“A vindima está a decorrer e as pessoas precisavam de saber com que linhas é que se cosem. A medida era positiva porque, de alguma forma, estabelecia um preço mínimo para as uvas, abaixo do qual as casas não podiam comprar, mas a questão é o atraso na regulamentação”, afirmou Luís Correia, produtor no concelho de Alijó.
Os 50 cêntimos por quilo de uva correspondem a 375 euros por pipa.
“No ano passado cheguei a receber pagamento por uvas de cerca de 300 euros e houve muitos casos que receberam 200, outros 150 e outros ainda nem receberam nada”, afirmou o viticultor que considerou que logo aquando do anúncio na semana passada deveria ter sido publicada a regulamentação.
E, apontou, se “para queimar é 375 euros, para beber tem que ser um bocadinho mais”.
Com sete hectares prevê uma colheita idêntica à do ano passado de cerca de 50 a 60 pipas. A produção de uva é toda para venda.
Já Teresa Barbosa prevê uma “perda de produção de cerca de 50% a 60%”.
“Estamos a ter um ano muito mau e esta medida do Governo veio piorar mais ainda porque em anos de escassez de qualquer produto, aquele que tem é rei”, referiu
Na sua opinião, o apoio do Governo baliza o preço das uvas nos 375 euros por pipa e as grandes casas “ao verem este valor automaticamente consideram que isto é o patamar pelo qual podem comprar”.
As perspetivas de produção de Maria Bernardo também “são péssimas”.
“Eu claramente tenho menos 50% daquilo que tive no ano passado. Em 2024 tive um ano fantástico e não queriam uvas, eu fiquei com uvas na vinha”, referiu a produtora de Armamar, que assegurou que “as uvas que sobreviveram são boas” e explicou que está em modo de produção biológico e que isso também “cria mais desafios na produção”.
Na sua vinha ficaram cerca de 10 toneladas das 60 produzidas.
Paulo Guedes, da Régua, não ficou com uvas na vinha porque as colheu para fazer o próprio vinho, em vez de as vender.
Este ano prevê apenas 30 pipas, em comparação com as 85 do ano anterior e, por isso, considerou que o apoio do Governo “vem fora de tempo”.
Lembrou que, em abril, produtores receberam cartas dos operadores a informar que não iam querer as uvas e que, por isso, alguns não fizeram tratamentos suficientes para “pegar na planta”.
“Nem todas as adegas, nem todas as cooperativas e adegueiros vão aderir à medida do Governo”, disse o viticultor Tiago Fonseca, adiantando que neste momento ainda não sabe como vai ficar a sua situação porque o operador a quem vai vender as uvas não pretende “aderir à queima, como muitos” da zona de São João da Pesqueira.
Na sua opinião, “quem tem as uvas nas videiras têm duas opções: ou espera que apareça alguém que pegue nas uvas e as vá destilar para aguardente ou então deixa-as nas videiras porque há muitas adegas a pagar entre 100 a 170 euros por pipa”.
“E para um viticultor não dá porque tem que fazer contas ao seu trabalho, aos produtos que usou durante o ano, ao pessoal que as vai cortar e ao transporte para a adega”, advertiu.
Tiago Fonseca colheu 67 pipas em 2024 e estima que, este ano, não ultrapasse as 40 pipas.
Como causas para a perda de produção são apontados a fraca nascença, ataques de doenças como o míldio e oídio, o escaldão e o calor excessivo que se fez sentir neste verão.
Algumas zonas do Douro foram também atingidas por incêndios.
O Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) disse que está a ser feito o levantamento da área de vinha atingida.
Os custos e a falta de mão de obra são outras dificuldades destacadas nesta vindima, que fica ainda marcada por uma redução no benefício para as 75 mil pipas (550 litros cada), ou seja, uma quebra de 15 mil pipas na quantidade de mosto que cada produtor pode destinar à produção de vinho do Porto e que é uma importante fonte de receita.
Por exemplo, Teresa Barbosa passou de 80 pipas de benefício para as 65, o que significa uma “redução drástica” na faturação, já que cada pipa de benefício corresponde a uma média de mil euros.