Dezanove anos depois de ter sido avançada a necessidade de uma legislação do solo, que protegesse este recurso no território da União Europeia (UE), foi aprovada a Diretiva da Monitorização do Solo. O objetivo é colocar a UE num caminho que lhe permita ter os seus solos saudáveis até 2050. As medidas concretas incluem a monitorização harmonizada do solo com base em sistemas nacionais, a avaliação e apoio à saúde e resiliência dos solos e a gestão de locais contaminados.
Estima-se que entre 60% e 70% dos solos na UE não estejam nas melhores condições, afetados por processos de erosão, poluição, compactação e redução de matéria-orgânica. Inverter estas tendências requer, entre outras medidas, um sistema uniformizado que permita monitorizar o solo e a sua saúde.
Este é um dos principais passos estabelecidos pela Diretiva da Monitorização do Solo, aprovada pelo Parlamento Europeu em outubro de 2025. A publicação da nova lei no Jornal Oficial da União Europeia antecipa a sua entrada em vigor. A transposição para as legislações nacionais e adoção das novas disposições legais decorrerá num prazo de três anos.
Com estes procedimentos ficará concluída a primeira legislação dedicada ao solo, após um processo legislativo iniciado em 2023, mas cujas primeiras abordagens remontam a 2006. Nesse ano foi proposta a Estratégia Temática para a Proteção do Solo, que não conseguiu reunir consensos e acabou por ser abandonada em 2014. Em 2021, a Comissão adotou a Estratégia do Solo para 2030 e anunciou a intenção de lançar uma proposta legislativa. Em 2023 foi traçada a primeira versão desta proposta, aceite pelo Conselho Europeu em setembro de 2025 e depois pelo Parlamento Europeu.
Embora as medidas de intervenção para melhorar a saúde e resiliência dos solos europeus continuem a não ser obrigatórias sob esta que será a primeira lei do solo na UE, destacam-se no texto adotado as quatro vertentes seguintes: Monitorização do solo; Avaliação da saúde do solo; Apoio à saúde e resiliência do solo; Identificação e gestão de solos contaminados.
– Monitorização do solo passa a ser obrigatória
Cada Estado-Membro vai implementar um sistema de monitorização do solo, com base em metodologias de análise e amostragem comuns e recorrendo a uma lista de descritores e critérios de saúde do solo – físicos, químicos e biológicos – transversais a todos os países.
A monitorização irá recair sobre vários parâmetros relevantes para determinar a saúde do solo, incluindo o teor de carbono orgânico, o equilíbrio em nutrientes, a contaminação, a erosão, a biodiversidade, a compactação e a salinização.
Os Estados-Membros irão monitorizar estes aspetos de forma sistemática e comunicar os resultados segundo metodologias europeias padronizadas, para assegurar que os dados serão comparáveis e coerentes entre países.
Contudo, haverá um centro de coordenação europeu – o Observatório Europeu do Solo (EUSO), que receberá e divulgará os dados recolhidos pelas redes nacionais, facilitando a respetiva análise científica e a formulação de políticas. Por sua vez, o programa de amostragem de solos da UE – LUCAS Soils – será alargado e aperfeiçoado para que se possa constituir como uma base científica capaz de apoiar os Estados-Membros na implementação das suas redes uniformizadas de monitorização – amostragem, análises no terreno, monitorização digital, entre outras.
Além destas estruturas e ferramentas transversais, cada país poderá aproveitar organismos ou campanhas de monitorização já existentes, baseando a monitorização em postos de amostragem locais. Para a monitorização do descritor de biodiversidade do solo e dos contaminantes do solo, os Estados-Membros poderão limitar o número de pontos selecionados.
– Avaliação não vinculativa da saúde do solo
Com ambição de ter solos saudáveis em toda a União Europeia até 2050, o texto aprovado estabelece metas de sustentabilidade que devem orientar os Países-Membros nas suas avaliações locais, assim como valores de referência operacionais que devem funcionar como sinais de alerta, indicando a necessidade de intervenção e apoio por parte do Estado.
Estas metas não são, no entanto, vinculativas. Isto significa que os Estados-Membros não estão obrigados a cumpri-las e que todos estes parâmetros serão definidos por cada um.
Neste sentido, as metas e valores de referência operacionais funcionam apenas como uma orientação para que os Estados-Membros implementem uma avaliação adaptada à realidade dos solos e das ocupações do solo nos respetivos territórios, assim como às suas condições específicas em termos agrícolas, climáticos e ambientais.
– Apoio à saúde e à resiliência do solo
A diretiva reconhece que os agricultores e silvicultores são os principais guardiões do solo, mas não coloca diretamente sobre eles o ónus da sua monitorização, proteção ou restauro.
Como sublinha o comunicado do Parlamento Europeu, a legislação salvaguarda a atividade de proprietários e gestores agrícolas e silvícolas: não é sobre eles que recaem diretamente as obrigações legais. Serão os governos dos Países-Membros que terão de promover medidas facilitadoras da melhoria da saúde e resiliência dos solos. Aconselhamento técnico independente, ações de formação, capacitação, investigação, inovação e campanhas de sensibilização estão entre as possíveis medidas.
Ainda assim, o envolvimento dos agricultores e silvicultores, por terem contacto privilegiado com o solo, está implícito em algumas destas medidas e o comunicado refere que os Estados-Membros devem avaliar regularmente os custos em que podem incorrer estes profissionais. A ideia subjacente é que os Estados possam ajustar programas de apoio, compensação ou incentivo relacionados com o tempo e investimento que pressupõe este envolvimento.
– Identificação e Gestão de solos contaminados
A Diretiva introduz pela primeira vez a obrigatoriedade de os Estados-Membros listarem e gerirem os seus solos contaminados. De acordo com o texto aprovado, terão dez anos após a entrada em vigor desta nova lei da monitorização do solo para:
Elaborar e publicar uma lista de locais onde os solos possam estar potencialmente contaminados e constituir risco para a saúde humana e para o ambiente;
Avaliar e intervir nos casos em que existam riscos inaceitáveis para a saúde e o ambiente.
Em paralelo, estabelece-se a elaboração de uma lista indicativa de substâncias emergentes, num prazo de até 18 meses após a entrada em vigor da lei e com atualização periódica.
Entre as substâncias em causa estão os pesticidas e os seus metabolitos (substâncias libertadas dos pesticidas e que se alteram em contacto com o ambiente, o solo e as espécies) com potencial de efeitos adversos e prolongados sobre os solos e a biodiversidade, assim como os PFAS, um grupo de substâncias (per e polifluoroalquiladas), conhecidas como “químicos eternos” devido à sua persistência e dificuldade de degradação, que são amplamente usados em produtos industriais e domésticos, acumulando-se no solo e nos organismos vivos, com efeitos nefastos.
O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.













































