Três agência das Nações Unidas (ONU) alertaram hoje no Conselho de Segurança para os “níveis catastróficos” de insegurança alimentar e “elevado risco de fome” que o povo de Gaza enfrenta e que “aumenta de dia para dia”.
A reunião de hoje do Conselho de Segurança foi convocada pela Guiana e pela Suíça, com o apoio da Argélia e da Eslovénia, e contou com ‘briefings’ da Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), do Programa Alimentar Mundial (PAM) e do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), que descreveram o grave cenário que se vive no enclave, induzido pelo conflito.
“Gaza está a assistir ao pior nível de desnutrição infantil em todo o mundo”, afirmou o diretor executivo adjunto do PAM, Carl Skau, sublinhando que uma em cada seis crianças com menos de dois anos está gravemente desnutrida no enclave.
Skau indicou que o colapso da ordem civil, impulsionado pelo desespero da população, está a impedir a distribuição segura da ajuda humanitária, uma vez que comboios do PAM destinados ao norte de Gaza foram saqueados por pessoas famintas.
“O PAM está a explorar urgentemente todas as opções viáveis de entrega para permitir a retoma das operações no norte de Gaza o mais rapidamente possível. Este é um imperativo humanitário. O pessoal dos nossos comboios testemunhou condições catastróficas no norte: alimentos e água potável são escassos, a subnutrição está a aumentar e as doenças são abundantes”, referiu, perante o corpo diplomático.
Se nada mudar, assegurou Skau, “a fome será iminente no norte de Gaza”.
O representante do PAM frisou que travar a fome generalizada requer muito mais do que apenas fornecimento de alimentos: os serviços básicos devem ser restabelecidos, incluindo serviços de saúde, redes elétricas e condutas de água e saneamento.
Skau dirigiu-se então ao próprio Conselho de Segurança, apelando a este órgão da ONU para que faça cumprir uma resolução adotada em 2018, que reafirma a necessidade de quebrar o ciclo vicioso entre o conflito armado e a insegurança alimentar.
Também o diretor-geral adjunto da FAO, Maurizio Martina, apresentou dados sobre a fome no enclave, estimando que cerca de 378 mil pessoas estejam a vivenciar a fase mais grave de insegurança alimentar aguda, marcada pela fome, níveis críticos de desnutrição aguda e elevados níveis de mortalidade.
Focando-se no impacto dos ataques de Israel nos sistemas agroalimentares, Martina explicou que cerca de 46% de todas as terras agrícolas de Gaza foram avaliadas como danificadas, além dos elevados níveis de destruição em abrigos de animais, explorações de ovinos, explorações leiteiras, celeiros domésticos e explorações aviárias.
“No final de janeiro de 2024, presumiu-se que todos os frangos foram abatidos ou morreram devido à falta de água e forragem”, deu como exemplo o representante da FAO.
Já Ramesh Rajasingham, representante do OCHA, observou que pouco poderá ser feito para mudar esta trajetória enquanto as hostilidades continuarem, reiterando os apelos por um cessar-fogo.
Além de um cessar-fogo imediato, as três agências da ONU instaram à reabertura de passagens de fronteira, inclusive para o tráfego comercial, e apelaram a que os produtos essenciais possam circular dentro e fora de Gaza.
Durante vários meses, as agências da ONU emitiram alarmes sobre a insegurança alimentar e o risco de fome na Faixa de Gaza no meio da guerra em curso entre Israel e o Hamas.
Em dezembro de 2023, a Classificação Integrada da Fase de Segurança Alimentar (IPC) — uma escala utilizada pelas agências de ajuda humanitária para medir os níveis de fome — publicou um relatório estimando que, entre 24 de novembro e 07 de dezembro do ano passado, mais de 90% da população de Gaza, ou cerca de 2,08 milhões de pessoas, registavam “altos níveis de insegurança alimentar aguda”.
Previu também que toda a população – de 2,2 milhões de pessoas – enfrentaria tais níveis de insegurança alimentar aguda até fevereiro deste ano devido ao conflito armado.
Esta é a percentagem mais elevada de pessoas que enfrentam níveis elevados de insegurança alimentar aguda alguma vez classificada no mundo, de acordo com o documento.