A destruição ou a fragmentação do habitat natural, a poluição e as alterações climáticas são dos impactos mais referidos pelos cientistas como responsáveis pelo estado das espécies selvagens em Portugal Continental. As conlusões constam no Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental, um projeto que conta com a participação da Universidade de Évora (UÉ).
Durante os trabalhos de campo, verificou-se numa primeira análise que os mamíferos continuam a enfrentar grandes desafios para sobreviver. O coelho-bravo, do qual dependem muitos predadores ameaçados como o lince-ibérico ou a águia-imperial-ibérica, sofreu um declínio acentuado nos últimos anos. O arminho ainda não foi visto e a marta, o toirão e o gato-bravo apenas foram detetados em alguns locais.
Muitas das espécies-alvo de morcegos encontram-se classificadas com Informação Insuficiente (DD). As espécies mais raras registadas estão diretamente relacionadas com a sua ocorrência esparsa no território nacional, dificultando a obtenção de registos (via captura ou deteção acústica), como por exemplo o morcego-arborícola-grande (Nyctalus noctula), ou espécies que foram descritas para o nosso território muito recentemente (em 2020), como o morcego-de-bigodes de Alcathoe (Myotis alcathoe) e o morcego-de-franja-criptico (Myotis crypticus).
Uma boa novidade foi a descoberta da reprodução do morcego-hortelão-claro (Eptesicus isabellinus) no Baixo Alentejo por uma equipa de técnicos do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). É a maior colónia conhecida desta espécie no sul do país. Foram também registadas espécies classificadas com estatuto de ameaça no Livro Vermelho em 2005 como, por exemplo, a toupeira-deágua (Galemys pyrenaicus) e o rato de Cabrera (Microtus cabrerae).
Entre outros dados relatados por investigadores de diversas Universidades parceiras, no que respeita aos pequenos mamíferos, “apesar da sua diversidade e importância ecológica, existe ainda um desconhecimento considerável sobre a situação de muitas espécies de pequenos mamíferos em Portugal”, considera Ricardo Pita, investigador no Instituto Mediterrâneo para Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento, da Universidade de Évora. A situação, “em muitos casos, impossibilita a avaliação do risco de extinção ou do estado de conservação.
Isso mostra a importância de projetos como o da revisão do Livro Vermelho para tentar colmatar estas lacunas, assim como a necessidade de mais estudos que permitam avaliar alterações na distribuição e tendências populacionais de pequenos mamíferos”, refere. Sobre as principais medidas para proteger estas espécies destaca “a manutenção de um mosaico de habitats diversificado, de regimes de pastoreio extensivo e a promoção da conectividade entre microhabitats. Paralelamente, também será necessário o desenvolvimento de estudos de longo termo que permitam a monitorização das populações e assim uma identificação mais informada sobre as respostas das espécies às alterações ambientais, locais e globais”.
Recorde-se que o projeto “Revisão do Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental e Contributo para a Avaliação do seu Estado de Conservação” foi lançado em 2019 e pretende saber quais as espécies mais ameaçadas e as mais estáveis ou a aumentar a sua população. O prazo para a conclusão dos trabalhos de campo termina em 2021. A área de intervenção do projeto abrange o território de Portugal Continental. Os trabalhos de campo incidem com maior atenção na Rede Nacional de Áreas Protegidas e às Zonas Especiais de Conservação da Rede Natura 2000. A avaliação global do estado de conservação das espécies abrangidas pela Diretiva Habitats constitui também um objetivo muito importante deste projeto e a sua análise
Pode acompanhar o projecto do Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental aqui.
O artigo foi publicado originalmente em Universidade de Évora.