As investigadoras do InPP procuram identificar na planta do trigo alelos de resistência à ferrugem amarela. Na foto, Diana Acácio e Asmae Jlilat num campo de trigo em Sousel.
Qual é a missão do laboratório colaborativo InnovPlantProtect?
A principal missão do InnovPlantProtect (InPP) é desenvolver produtos bio inspirados, ou seja, novas tecnologias baseadas em microrganismos, extratos de plantas, organismos marinhos, entre outros, para controlar pragas e doenças emergentes em culturas mediterrânicas.
Que meios humanos e materiais tem o InPP para levar a cabo a sua missão?
Os nossos investigadores são altamente qualificados – 16 doutorados, 17 mestres e cinco licenciados – e agora têm ao dispor cinco novos laboratórios (nas áreas da bioquímica, biologia molecular, química orgânica e inorgânica e um laboratório digital), instalados na antiga Estação Nacional de Melhoramento de Plantas, atual INIAV, em Elvas. O nosso trabalho é financiado por verbas do Fundo Social Europeu, da Fundação para a Ciência e Tecnologia, pelos nossos associados e também por prestação de serviços que realizamos.
Que tipo de serviços presta o InPP e a quem?
A partir do conhecimento científico disponível criamos soluções sustentáveis para problemas fitossanitários que a produção nos apresenta. Por exemplo, a Fertiprado é um dos nossos fundadores e clientes e também temos um contrato de consultadoria com uma empresa produtora de morango.
O InPP selecionou quatro pragas e doenças – ferrugem amarela (no trigo), Xylella fastidiosa (na oliveira), estenfiliose (na pera Rocha) e piriculariose (no arroz) – como alvo de estudo. Que soluções pretendem encontrar para cada uma delas?
No caso da Xylella fastidiosa a nossa estratégia passa por identificar e utilizar microrganismos que habitam no interior das oliveiras e das amendoeiras, conferindo-lhes capacidade para controlar o crescimento daquela bactéria, impedindo que esta se multiplique nos vasos condutores das plantas. Para controlar a estenfiliose e a piriculariose, doenças que atuam à superfície das plantas, estamos a identificar e a desenvolver soluções a partir de agentes de controlo biológico provenientes de diferentes ecossistemas, podem ser microrganismos, extratos de plantas ou de organismos marinhos.
Duas associadas da ANIPLA – Bayer e Syngenta – são sócias fundadoras do InnovPlantProtect
No caso do trigo, a nossa ambição é identificar na própria planta alelos de resistência à ferrugem amarela, em concreto à raça mais agressiva que existe em Portugal, e através de técnicas de cisgénese ou de edição genética introduzi-los em novas variedades de trigo, tornando-as resistentes a esta doença. Para acelerar o desenvolvimento destas linhas de trabalho concorremos a diversas fontes de financiamento concorrenciais nacionais e europeias e, em particular, participamos em consórcios que se apresentaram ao concurso de ideias de projetos mobilizadores do Plano de Recuperação e Resiliência.
Essas técnicas de edição do genoma são os clássicos OGM?
Não. As técnicas de edição do genoma com as quais trabalhamos não implicam a introdução de qualquer sequência codificante estranha nas plantas, trata-se de manipular o genoma da própria espécie.
Também estão a trabalhar em modelos de risco e de previsão de disseminação de pragas e doenças. Em que culturas?
Estamos a desenvolver um sistema de monitorização precoce da morte súbita dos sobreiros e das azinheiras, em colaboração com investigadores espanhóis. O principal agente causal desta doença é a Phytophthora cinnamomi, um organismo do grupo dos oomicetos que se aloja nos vasos condutores das árvores e bloqueia o acesso da planta aos nutrientes e à água. Usamos diversas ‘camadas’ de informação sobre o estado vegetativo das árvores – imagens obtidas por drones, dados de observação visual e imagens de satélite – e sobre a doença, para criar um modelo robusto de previsão e análise do risco da incidência. Queremos perceber, por exemplo, se a doença está associada ao declive do terreno e ao tipo de solo.
A ambição do InPP é criar plantas resistentes a pragas e doenças. Em que espécies estão a trabalhar?
Nesta fase ainda não estamos a investir muito nessa área, em parte, porque a regulamentação europeia proíbe o uso das técnicas de edição do genoma. No entanto, estas técnicas podem ser aplicadas tanto em espécies de plantas herbáceas como lenhosas. Vejamos o exemplo da pera Rocha, que é afetada por três doenças-chave – a estenfiliose, o fogo bacteriano e a podridão radicular (Rosellinia necatrix) -, neste caso poderemos vir a identificar, na planta, os genes que facilitam o processo de desenvolvimento dos organismos patogénicos nas pereiras, mutar esses genes e com isso reduzir drasticamente a incidência das doenças.
Um estudo recente, pedido pela Comissão Europeia, avaliou o impacto das técnicas de edição do genoma na agricultura europeia. A que conclusões chegou este estudo?
O relatório divulgado parece sugerir que os impactos do uso da edição do genoma na agricultura europeia seriam positivos. Entretanto, a Comissão Europeia pediu pareceres sobre o estudo e ao que se sabe ainda não se pronunciou. Já o Reino Unido fez saber que vai alterar a legislação sobre uso de organismos geneticamente modificados, o que pode condicionar a decisão da UE, mas ainda é cedo para perceber como é que a UE se vai posicionar e gerir esta questão.
Quais são as vantagens das novas técnicas de edição do genoma face à engenharia genética convencional?
As novas técnicas de edição do genoma permitem introduzir as características desejadas nas plantas e nos animais de forma muito mais rápida (5 a 6 anos a menos), precisa e barata do que engenharia genética convencional. Caso a regulamentação europeia sobre OGM seja alterada, tornando-se menos exigente, instituições públicas, universidades e PMEs, terão oportunidade de entrar neste mercado. No InPP é essa a nossa expectativa. Em termos de prova de conceito já existem dados suficientes que provam que a edição do genoma permite obter plantas resistentes a fungos, insetos, bactérias, vírus e à salinidade e também podem ser utilizadas para melhorar as características organoléticas dos alimentos ou para reduzir níveis anti nutricionais.
Já existem no mercado alimentos obtidos com as novas técnicas de edição do genoma?
A edição do genoma, com base na técnica CRISPR-Cas9, é aplicada há cerca de cinco anos. O CRISPR-Cas9 veio revolucionar a edição genética, porque é uma ferramenta fácil e barata de produzir. Nos EUA, já permitiu criar cogumelos que não oxidam e na UE provou-se que é possível obter batatas resistentes à fitóftora (Phytophthora infestans) ou arroz resistente à piriculariose através da edição do genoma. Estes são apenas alguns dos exemplos do potencial da edição do genoma.
O artigo foi publicado originalmente em FitoSíntese.