A Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra (CIM/RC) lidera um projeto que reúne 12 entidades públicas e privadas, hoje apresentado na Figueira da Foz, para transformar em fertilizantes os jacintos-de-água, cuja proliferação afeta a bacia do Mondego.
O projeto denominado “Biocomp 3.0” tem no Instituto Politécnico de Bragança (IPB) um dos parceiros principais na área do conhecimento científico e passa pela compostagem da matéria orgânica retirada dos cursos de água adjacentes ao canal principal do rio Mondego – vários dos quais, como o chamado ‘leito abandonado’ em Montemor-o-Velho ou o rio Foja, na Figueira da Foz, estão cobertos em parte da sua extensão com aquela espécie invasora – e sua posterior transformação em fertilizantes, num processo de agricultura circular.
Na sessão de apresentação do projeto, Manuel Ângelo Rodrigues, representante do IPB, explicou que o projeto partiu da questão de saber o que fazer com os jacintos-de-água, por si definidos como “uma biomassa muito rica em nutrientes”, notando que o “essencial” do “Biocomp 3.0” decorre na fase posterior à sua retirada dos cursos de água.
Por outro lado, argumentou Manuel Ângelo Rodrigues, o projeto foi desenvolvido devido à “falta de soluções para a biomassa resultante das intervenções de controle” que há anos decorrem na bacia do Mondego (nos municípios de Coimbra, Cantanhede, Montemor-o-Velho, Soure, Mira e Figueira da Foz), dado que, até aqui, as plantas retiradas da água teriam de ser canalizadas para aterro.
O processo de compostagem decorrerá em Mira, “numa das maiores empresas de compostagem em Portugal”, sendo, depois, avaliado o valor agrícola dos compostos produzidos “para os colocar no mercado de fertilizantes”, adiantou.
O projeto iniciou-se em abril e decorrerá até setembro de 2025, tendo um custo de cerca de 883 mil euros, financiado com verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Para além deste projeto, foi ainda assinado um protocolo entre o Fundo Ambiental, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e a CIM Região de Coimbra, no valor de 435 mil euros, a aplicar até 2026, em iniciativas para evitar a proliferação da espécie invasora.
A esse propósito, Helena Teodósio, vice-presidente da CIM/RC e presidente do município de Cantanhede, definiu o protocolo plurianual como uma “significativa etapa”, por permitir “manter uma equipa nas linhas de água, com maquinaria pesada” (onde se inclui uma ceifeira anfíbia), e também a utilização de barreiras flutuantes, em trabalhos de contenção e remoção dos jacintos-de-água, cujo novo plano de ação previsto no protocolo, adiantou, começa em janeiro de 2024.
Desde 2019, os investimentos realizados no combate aos jacintos-de-água no Baixo Mondego e municípios adjacentes totalizam 880 mil euros, a esmagadora maioria (750 mil euros) financiados pelo Fundo Ambiental.
Presente na sessão, o secretário de Estado da Conservação da Natureza e Florestas, João Paulo Catarino, lembrou que Portugal possui regiões biogeográficas de climas mais quentes e mais frios, “o que tem vantagens e desvantagens”.
“Permite a produção de abacates no Algarve, mas também a castanha ou a cereja no interior, que precisa de ciclos de frio”, explanou.
Esta dispersão biogeográfica, assinalou João Paulo Catarino, tem, nas desvantagens, a proliferação de espécies invasoras exóticas, como o jacinto-de-água, cuja proliferação no território nacional, “tem de ser atacada de início”, disse.
“E, por isso, é mesmo importante investirmos fortemente no controle dessas exóticas invasoras”, argumentou.
Sobre os projetos apresentados, enfatizou que a intervenção “precisa de continuidade”.
“Porque não havendo [continuidade] podemos perder todo o trabalho que estávamos a fazer, porque a natureza recupera muito rapidamente. Nas invasoras lenhosas [como as acácias] já não falamos em eliminar, falamos em controlar, é sinal de que já perdemos essa batalha”, admitiu o governante.
Na abertura da sessão, o presidente do município da Figueira da Foz, Pedro Santana Lopes, justificou a presença “principalmente para ouvir” aquilo que será “diferente no tratamento e erradicação desta praga”, destacando a “excelência do trabalho” desenvolvido pelo Politécnico de Bragança.
No final, em declarações à agência Lusa, Pedro Santana Lopes, disse acreditar que, apesar do projeto “Biocomp 3.0” reunir 12 entidades, será possível chegar a ‘bom porto’: “Estar cá o Instituto Politécnico de Bragança, para mim, é um motivo adicional de crença, tenho ótima impressão desse instituto. Agora, é de facto muita entidade, é muita entidade e muita cerimónia para um assunto, que, de facto, já devia estar com trabalho aturado em cima há muito tempo”, observou o autarca.
Sobre a eventualidade dos jacintos de água que se encontram confinados juntos às comportas que separam o rio Foja e o leito abandonado do Mondego do canal principal do rio virem afetar a Figueira da Foz – o que sucedeu por diversas vezes em anos anteriores, com acumulação na marina da cidade, porto de pesca e nas praias atlânticas – Santana Lopes vincou que não lhe foi feita “nenhuma promessa” de que essa situação não se irá repetir.
A agência Lusa questionou, por escrito, a Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra sobre o que está previsto para os próximos meses, concretamente se as comportas do Foja serão abertas e as plantas levadas pelo rio Mondego até ao mar ou se serão retiradas antes do local onde se encontram.
Na resposta, a CIM/RC explicou que a estratégia de gestão da espécie invasora “em articulação com a academia” visa o controlo dos jacintos-de-água “de montante para jusante” (no caso do Mondego, sensivelmente de leste para oeste), sendo que as ações em curso decorrem “a montante” da estação de bombagem do rio Foja, e “que os jacintos existentes junto à estação serão retirados à medida que os trabalhos vão decorrendo”.
Na mesma resposta, a comunidade intermunicipal – que disse não dispor de dados sobre o volume de jacintos de água retirados nos últimos anos – indicou que, em situação de aumento dos caudais, “é alocada maquinaria pesada junto à estação de bombagem, para evitar a entrada dos jacintos no leito central do rio Mondego e, deste modo, evitar a sua chegada à Figueira da Foz”, sendo ainda alocados recursos humanos com essa finalidade.