“Temos de recordar que o Reino Unido, como a maioria das outras economias desenvolvidas, não produz a maior parte dos alimentos que consome. O Reino Unido importa 50% dos seus alimentos. Se houver uma interrupção, não dentro do próprio Reino Unido, mas dentro das cadeias de abastecimento internacionais, vai haver escassez”, avisou hoje Elizabeth Braw, investigadora do Instituto Real de Serviços Unidos (RUSI).
O Governo tem apelado nos últimos dias aos britânicos para que “sejam responsáveis” na compra de alimentos nos supermercados, procurando mitigar o pânico no consumo que resultou em prateleiras vazias e filas à porta das lojas.
O setor de distribuição reagiu, limitando o número de unidades que cada cliente pode comprar de certos bens essenciais, como massas, arroz ou papel higiénico, e procurou tranquilizar a população, garantindo que existem reservas suficientes nos armazéns.
Em três semanas, segundo o Consórcio de Retalho Britânico, as vendas renderam mil milhões de libras (1,1 mil milhões de euros), tendo o ministro para o Ambiente, Agricultura e Alimentação, George Eustice, adiantado que algumas fábricas de comida aumentaram a produção em 50%
Porém, numa teleconferência organizada hoje pelo RUSI, Braw, especialista em estratégias como governos, empresas e sociedade civil poderem trabalhar juntos para fortalecer a defesa dos países contra ameaças, recordou que este não é um problema que o governo britânico possa resolver porque as cadeias de abastecimento são operações comerciais internacionais que podem ser perturbadas pela crise.
O resultado pode ser a imposição de um racionamento alimentar, recordando uma conversa que teve há uns anos com um deputado escandinavo sobre um cenário de crise e escassez global.
“Talvez tenhamos que verificar qual é o número de calorias que um adulto ou um adulto criança pode esperar comer. E talvez deva haver restrições às compras de alimentos nesse sentido, em vez de ser apenas dois pacotes de massa”, sugeriu.
Também Jack Watling, especialista em conflitos terrestres, alertou para o risco agitação civil e motins mesmo antes de se chegar a uma situação de escassez de alimentos se a população tiver essa perceção.
“Uma das coisas críticas em termos de prevenção de pequenas alterações na gestão da cadeia de abastecimento, se, por alguns dias pode parecer que não há comida, é ter uma mensagem realmente clara, como explicar que nos próximos dias vai acontecer isto por certos motivos”, sugeriu.
Se as autoridades não conseguirem explicar estes problemas, acrescentou, “é aí que a agitação civil pode rapidamente ficar fora de controlo”.
O setor retalhista é uma das exceções feitas pelo governo para continuar a trabalhar durante um período de confinamento obrigatório, em que os britânicos devem apenas sair de casa para comprar bens essenciais, como comida e medicamentos, fazer exercício, ou ajudar pessoas vulneráveis.
Funcionários dos supermercados foram considerados trabalhadores essenciais, tal como médicos, enfermeiros e polícias, podendo os filhos continuar a ir às escolas públicas, encerradas para a maioria dos alunos, e os limites aos horários dos motoristas de entregas foram levantados.
As leis da concorrência foram também aliviadas temporariamente no Reino Unido para permitir que os supermercados colaborem operacionalmente para “alimentar o país”, podendo partilhar informações sobre os níveis de reservas, colaborar para manter loja abertas e partilhar veículos para o transporte e distribuição e até em termos de trabalhadores.
O balanço de terça-feira feito pelo Ministério da Saúde britânico confirmou 422 óbitos entre 8.077 casos positivos de pessoas infetadas com a covid-19, identificadas após testes a 90.436 pessoas no Reino Unido.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 400.000 pessoas em todo o mundo, das quais morreram cerca de 18.000.
Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.
O continente europeu é aquele onde está a surgir atualmente o maior número de casos, e a Itália é o país do mundo com mais vítimas mortais, com 6.820 mortos em 69.176 casos.
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