Confrontado pela Renascença, MAI diz que vai abrir um novo concurso que já não vai excluir seropositivos nem grávidas. Mas há discriminações que se mantêm.
O ministro da Administração Interna vai abrir um novo concurso para guardas florestais do qual já não estarão excluídos os seropositivos nem as mulheres grávidas, anunciou à Renascença o gabinete de Eduardo Cabrita. Contudo, e de acordo com o especialista em Direito do Trabalho, Luís Gonçalves da Silva, “o concurso continua a violar a Constituição e várias convenções internacionais de que Portugal é subscritor”.
O concurso para guardas florestais da GNR, publicado em Diário da República a 26 de Fevereiro, rejeita a candidatura de pessoas que tenham hepatite, cancro ou tumores benignos, psoríase e rinite alérgica, entre outras questões. Vai inclusivamente ao caricato de excluir carecas, gagos e desdentados, condições que, garante Gonçalves da Silva à Renascença,” violam a dignidade da pessoa humana”.
“Se não fosse grave seria um momento de humor — e de humor negro”, diz o professor de Direito do Trabalho. “Além de ser manifestamente inconstitucional, é demonstrativo de um Estado arrogante que não respeita outros poderes, como o do Tribunal da Justiça da União Europeia, ou as recomendações do Provedor de Justiça.”
Houve recomendações mas “na prática nada mudou”
Pedro Matos Águas, do Centro Antidiscriminação VIH e Sida, lembra que” este concurso e outros que têm sido feitos, nomeadamente para inspetores da PJ, partem de uma tabela de inaptidões das Forças Armadas de 1999 que nunca sofreu qualquer alteração, apesar das evoluções que entretanto teve a medicina e a sociedade”.
À Renascença, Matos Águas lembra que ”esta é uma luta antiga” da sua associação e que, “embora o Ministério da Administração Interna tenha aparentemente acatado a recomendação feita pela Provedoria de Justiça em 2012, na prática nada mudou”.
A Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública contesta os termos em que foi feito o concurso para os 200 novos guardas florestais e admite mesmo vir a impugná-lo judicialmente, se tal vier a ser solicitado por algum dos seus associados.
Para Orlando Gonçalves, “os guardas florestais já são discriminados porque não recebem qualquer tipo de subsídio de função”, sendo agora “também objeto de discriminação os candidatos a guardas florestais”.
Joana Rabaça Gíria, presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), admite que “uma mulher grávida possa ter algumas limitações nas provas físicas, mas nunca lhes pode ser colocada uma barreira no acesso ao emprego”. A exclusão de mulheres grávidas no concurso de acesso à carreira de guarda florestal, considera a especialista, “é uma discriminação direta em função do sexo”.
Até agora, confirma Joana Rabaça Gíria, a CITE não recebeu nenhuma queixa sobre este caso, daí não ter atuado sobre o caso, considerando que se trata de “um caso isolado, embora não possa garantir que seja único”. Ainda assim, sublinha que é “grave”, porque “o Estado devia dar o exemplo”.
São declarações ao programa de informação da Renascença “Em Nome da Lei”, que este sábado debate as condições físicas e psíquicas que podem ser impostas a quem se candidata a um posto de trabalho, e que pode ser ouvido na íntegra aqui.
Em foco, um concurso para guardas florestais que afasta carecas, pessoas com rinite alérgica e psoríase, entre muitas outras doenças. O ministro da Administração Interna já admitiu à Renascença que vai reabrir o concurso e averiguar junto da Procuradoria-Geral da República a legalidade da lista de inaptidões.