A região que apostou todas as fichas no turismo vira-se agora também para o enoturismo e tenta combater a ideia de que produz poucos e, sobretudo, maus vinhos. Nada como ir ao terreno (com)provar.
Hoje em dia, como país cosmopolita que somos, habituados (e até algo cansados) a tantos prémios e distinções, já não é propriamente notícia que um estrangeiro famoso se perca de amores por Portugal. Há 30 ou 40 anos, sim. Não só era notícia, como um acontecimento, um orgulho que alguém com dinheiro e influência para forjar o seu pedaço de paraíso em qualquer parte do mundo optasse por fazê-lo num país tão pequeno e periférico.
Cliff Richard, Sir Cliff Richard, cantor britânico, ex-líder dos The Shadows e autor de um sem-número de hits, entre eles We Don’t Talk Anymore ou Lucky Lips, foi uma das primeiras estrelas planetárias a manifestar o seu fascínio por Portugal. Pelo Algarve. Começou por comprar casa, para desfrutar do sol e da praia, mais tarde (em 2002) cedeu à tentação de adquirir uma quinta — a Quinta do Miradouro, localizada na Guia, concelho de Albufeira. A ele juntaram-se dois sócios, também estrangeiros, e criaram a Adega do Cantor, com a nobre mas difícil missão de “dar um novo impulso aos vinhos algarvios”, conta Rúben Pinto, enólogo da casa. “Daí a razão de o primeiro vinho, e que, ainda hoje, é a nossa gama de entrada, se chamar Vida Nova.”
As intenções eram boas, mas, primeiro era preciso lutar contra velhos hábitos e alguns dogmas. No mercado inglês, o estatuto e o título de Sir abria várias portas e atraía muitos visitantes. Cliff Richard “chegou, inclusive, a dar alguns concertos na quinta e enchia sempre, com pessoas vindas de vários pontos do mundo, era impressionante”, confessa Rúben. Já no mercado nacional, que gosta de histórias mas nem sempre vai em cantigas, a aventura foi olhada com alguma desconfiança. Como se fosse um devaneio, uma excentricidade. O começo de uma anedota. Um cantor inglês foi fazer vinhos para o Algarve… e a plateia soltava, de imediato, uma gargalhada.
O Algarve é uma das regiões do país com uma história mais antiga em termos de produção de vinhos — foi por aqui que terá sido introduzido o vinho no território português, trazido do Oriente por viajantes fenícios. A verdade é que, até há bem pouco tempo, estava incrustada a ideia de que esta não era uma zona de produção. Que os vinhos não só não eram bons, como eram péssimos.
“Tinha a ver com as cooperativas”, contextualiza Rúben. “Durante muitos anos produziram-se milhões de litros, mas não havia um controlo de qualidade e acabaram por perder notoriedade.” A aposta desenfreada no turismo e a pressão imobiliária fizeram o resto, levando os habitantes a abandonar a vinha e a vender os terrenos.
Muitos algarvios não só se desligaram dos seus vinhos, como se tornaram nos maiores críticos, também eles presos à memória dos vinhos dos pais e dos avós, que deixavam a uva demasiado tempo ao sol, sugando-lhe todas as suas qualidades. Quando, nos seus hotéis, bares ou restaurantes, alguém tinha a ousadia de pedir uma garrafa da terra, eram os primeiros a torcer o nariz e apontar para outra região ou mesmo uma bebida branca.
“Tem sido um trabalho árduo mudar esta mentalidade, mas está a acontecer”, garante Rúben. O segredo passa por bater-lhes à porta e abrir as suas quintas. “Havia uma grande distância entre os produtores e […]
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