No seu congresso de outubro de 2025, a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) divulgou novas informações resultantes da atualização da sua Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas e do estudo sobre os polinizadores selvagens na Europa. Reforçar a proteção de habitats e espécies é essencial para inverter os declínios registados e, neste sentido, foi também aprovado o primeiro quadro orientador para a aplicação de métodos de biologia sintética em conservação.
A Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas ampliou-se, em 2025, com as avaliações e reavaliações de mais de sete mil espécies que contribuem agora para um total superior a 172,6 mil espécies listadas, das quais mais de 48,6 mil estão ameaçadas de extinção – classificadas como “Vulneráveis”, “Em Perigo” ou “Criticamente em Perigo”.
Esta reavaliação recaiu sobre vários grupos de espécies, dos fungos às pequenas plantas e árvores, passando pelos invertebrados, peixes, mamíferos, répteis, anfíbios e aves. Entre outros dados, divulgados no âmbito do Congresso Mundial de Conservação da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN – ou IUCN, em inglês), realizado em outubro de 2025, a organização alerta para os declínios observados em muitas populações e em importantes áreas naturais, apelando a governos e decisores a terem a determinação necessária para financiar e agir:
Declínio das populações de aves. 61% das mais de 11 mil espécies de aves avaliadas apresentam populações decrescentes, uma percentagem que aumentou face aos 44% estimados na anterior avaliação, em 2016. A expansão das áreas agrícolas para zonas onde antes existiam florestas, a intensificação do cultivo e o corte desregrado de árvores para obtenção de madeira estão entre as principais causas identificadas, embora o declínio seja também atribuído à caça e captura, às espécies invasoras e às pressões das alterações climáticas.
Redução dos polinizadores selvagens na Europa. Pelo menos 172 espécies de abelhas selvagens estão em risco de extinção na Europa, um aumento muito expressivo face às 77 que tinham sido assim consideradas em 2014. Outros grupos de polinizadores seguem a mesma tendência, que é associada a três ameaças principais: agricultura intensiva, poluição e aumento das temperaturas.
Estes e outros exemplos incluídos na atualização da Lista Vermelha das Espécies Ameaçadas ilustram a dimensão dos desafios. Para procurar novas respostas, foi desenhada a primeira política sobre “Biologia Sintética e Conservação”, determinando um conjunto de princípios e recomendações que irão abrir as portas a ações inéditas e complementares para conservar a natureza, enfrentar ameaças e salvar espécies que enfrentam a extinção.
Ferramentas da bioengenharia e biotecnologia – edição, reprogramação e criação de materiais genéticos, por exemplo – são, assim, futuras vias a equacionar para objetivos de conservação, como o restauro da diversidade genética perdida, o aumento da resistência a uma praga ou a uma pressão climática, ou a erradicação de uma espécie invasora.
Restauro é “antídoto comprovado” para travar declínio das aves
1256 das mais de 11 mil espécies de aves avaliadas na Lista Vermelha da UICN (11,5%) estão agora globalmente ameaçadas, refere a UICN, e mais ainda têm populações com sinais de declínio.
“O facto de três em cada cinco espécies de aves do mundo apresentarem populações em declínio ilustra a dimensão da crise da biodiversidade e a urgência de os governos cumprirem as ações a que se comprometeram em múltiplas convenções e acordos”, alertou Ian Burfield, Coordenador Científico da BirdLife International – organização que liderou a nova avaliação da avifauna – e Coordenador da Autoridade da Lista Vermelha das Aves.
A maioria das novas avaliações revelam um aumento do risco de ameaça para as aves e confirmam também a já anunciada extinção do maçarico-de-bico-fino (Numenius tenuirostris), uma ave migratória que nidificava na Sibéria Ocidental e vinha passar o inverno à região mediterrânica. Foi vista pela última vez em Marrocos, nos anos 90 do século XX.
No entanto, há também casos de recuperação, a comprovar que o restauro da natureza é um “antídoto comprovado” contra a perda de habitat, nomeadamente para a perda de áreas florestais, que é a principal causa do declínio das aves. O exemplo vem da remota Ilha Rodrigues, no Pacífico – pensa-se ter sido encontrada, pela primeira vez, pelo navegador português Diogo Rodrigues, em 1528 – e está relacionado com duas espécies endémicas (só ali existentes) que estiveram à beira da extinção:
No final da década de 60 do século XX, havia apenas cinco ou seis casais de tecelões-de-Rodrigues (Foudia flavicans) e oito ou nove de felosas-de-Rodrigues (Crocephalus rodericanus) nesta ilha. Hoje, contam-se cerca de 20 mil e 25 mil indivíduos de cada espécie, respetivamente, e ambas foram agora classificadas como “Pouco Preocupantes”.
A redução destas populações (e a extinção das outras 10 espécies de aves endémicas) na Ilha de Rodrigues foi causada pela desflorestação de terras para instalação de campos agrícolas, pelo pastoreio e pela introdução de predadores exóticos. Já a recuperação reflete os esforços de restauro, liderados por uma organização local que tem vindo a recuperar e expandir as florestas nativas de Rodrigues.
Saliente-se que a perda e a degradação de habitats são apontadas como as principais causas do declínio das aves que, nesta revisão da Lista Vermelha, foi particularmente evidente em Madagáscar, na África Ocidental e na América Central, pela redução das florestas tropicais.
Mais concertação para proteger os polinizadores europeus
Na reavaliação do estatuto de conservação dos polinizadores selvagens na Europa, solicitada pela Comissão Europeia, quase 100 espécies de abelhas foram adicionadas às que já se encontravam classificadas como ameaçadas na Lista Vermelha da UICN. Estima-se, assim, que 10% das abelhas selvagens da Europa (pelo menos 172 das 1928 espécies avaliadas) estejam em risco de extinção — um aumento significativo face às 77 espécies ameaçadas em 2014.
Nessa altura, 57% das espécies tinham “dados insuficientes” para serem avaliadas, uma percentagem agora reduzida para 14%, o que faz da atual avaliação a mais abrangente já efetuada sobre o estado das abelhas selvagens europeias.
Entre as espécies europeias que integram agora a Lista Vermelha como ameaçadas contam-se 15 de abelhões, fundamentais na polinização de leguminosas (ervilhas, feijões, amendoins e trevos, entre outras) e 14 espécies de abelhas-de-celofane, que polinizam plantas da família das margaridas e árvores como os salgueiros (Salix spp.). A Simpanurgus phyllopodus, a única do seu género na Europa continental, foi classificada como Criticamente Ameaçada.
Também as borboletas europeias foram alvo de novas avaliações e concluiu-se que 65 das 442 espécies avaliadas (perto de 15%) se encontram em risco de extinção, quase o dobro das 37 que tinham este nível de risco em 2010.
Mais de 40% das borboletas europeias endémicas (que não existem em mais nenhum lugar do mundo) estão também ameaçadas ou próximas da ameaça. Várias delas sofrem dos efeitos combinados da perda de habitat e das alterações climáticas, como é o caso da “Criticamente Em Perigo” Pseudochazara williamsi, confinada a algumas serras do sudeste de Espanha.
Uma espécie, única da Ilha da Madeira, foi oficialmente declarada extinta: a borboleta-branca-da-Madeira (Pieris wollastoni). Esta borboleta já tinha sido descrita como extinta, em 2008, pela equipa de investigadores que desenvolveu a “Lista de fungos, flora e fauna terrestre dos arquipélagos da Madeira e Selvagens”, mas só agora este estatuto foi oficializado na Lista Vermelha. O reconhecimento implica tempo para que não reste dúvida razoável sobre a inexistência da espécie, principalmente porque, ao ser declarada extinta, a espécie deixa de beneficiar de medidas de conservação.
Borboleta-branca-da-Madeira foi formalmente declarada extinta.
A perda de habitat continua a ser a principal ameaça para este grupo de seres vivos, que veem reduzidas, fragmentadas ou degradadas as pradarias, florestas e campos de cultivo extensivos dos quais depende a sua sobrevivência. Ao mesmo tempo, habitats e espécies sofrem com os efeitos das alterações climáticas, dos fenómenos meteorológicos extremos, dos incêndios e da poluição, tanto luminosa, especialmente nociva para as traças e borboletas noturnas, como da poluição do solo e vegetação, principalmente associadas ao uso generalizado de pesticidas e herbicidas.
O estado de conservação das abelhas selvagens, borboletas e outros polinizadores europeus “é preocupante”, referiu Jessika Roswall, Comissária Europeia com o pelouro do Ambiente, que sublinha a necessidade de “ação urgente e coletiva para enfrentar esta ameaça”. A responsável lembrou que está em curso a criação de um sistema de monitorização de polinizadores, que uniformiza metodologias, tipologia de dados e procedimentos para todos os países da União Europeia – o EU PoMS – e que é preciso avançar na sua implementação.
Recorde-se que o “Novo Pacto para os Polinizadores”, revisto em 2025, prevê, entre outras medidas, a mitigação de impactes do uso de pesticidas sobre os polinizadores, a redução da poluição luminosa, o reforço da capacidade dos serviços de aconselhamento agrícola para a conservação e restauro dos polinizadores em zonas plantadas e o envolvimento público em projetos de monitorização e proteção.
A necessidade de atuar de forma concertada e eficaz é urgente, pois a estratégia e ações adotadas pela Comissão Europeia até 2020 mereceram “cartão vermelho” do Tribunal de Contas Europeu que, após uma auditoria, concluiu sobre a falta de resultados e identificou a falta de uma estratégia coerente de proteção dos polinizadores na União Europeia, recomendando, entre outras alterações, a integração de medidas destinadas a proteger os polinizadores selvagens nos instrumentos políticos relativos à biodiversidade e à agricultura e nos processos de avaliação relativos aos riscos dos pesticidas.
O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.












































