Antes do post: sobre o acidente do elevador da Glória tenho ouvido insistentemente a afirmação de que a culpa não pode morrer solteira, sem que ninguém me responda a uma pergunta básica: qual culpa?
O título deste post reproduz o título do artigo que Ricardo Paes Mamede publica hoje no Público.
“A prevalência de um enorme número de propriedades de dimensão muito reduzida é, em si mesma, uma fonte de baixa rentabilidade da floresta. Boa parte das actividades associadas à produção florestal – construção de acessos, preparação do terreno, plantação, manutenção, gestão técnica e mobilização da maquinaria – envolvem custos fixos elevados. Isso significa que os custos médios por hectare são mais reduzidos em propriedades de maiores dimensões, aumentando a rentabilidade. Pelo contrário, prédios exíguos têm retorno proporcionalmente baixos”, diz Ricardo Paes Mamede.
O que diz tem lógica, portanto, a ser verdade, o que teríamos seriam propriedades pequenas abandonadas e sem gestão, e propriedades médias e grandes em plena produção.
Só que não é assim, não só a maior parte do Valor Acrescentado Bruto Florestal provém das regiões do minifúndio, como o que não faltam são propriedades com dimensões adequadas que estão abandonadas ou com gestão insuficiente (escusamos de ir buscar o direito sucessório português, em Lisboa ou Porto o direito sucessório é o mesmo a a generalidade dos terrenos não estão ao abandono).
O que explica então o desfasamento entre a teoria e a realidade, partindo do princípio de que a realidade raramente está errada?
Dois aspectos da economia da gestão florestal que Ricardo Paes Mamede não refere.
O primeiro, a produtividade da estação – os hectares não são todos iguais, uma coisa é produzir 4 metros cúbicos por hectare, outra coisa é produzir 16 metros cúbicos por hectare e, para a mesma espécie, variações destas existem facilmente – que, por sinal, é uma coisa que está relacionada com a estrutura da propriedade.
O segundo, os custos da operação, se gerir matos for uma operação cara que consome os lucros potenciais – sobretudo quando essa operação está relacionada com o aumento do risco de incêndio, isto é, poupanças na gestão, aumentam os riscos – os ganhos de escala a que se refere Ricardo Paes Mamede podem ser insuficientes para resolver o problema de uma operação ruinosa, logo, quanto maior é a área a gerir, maior é o prejuízo potencial.
Há muitas coisas do artigo de Ricardo Paes Mamede com que estou de acordo, nomeadamente a sua crítica à ideia de que resolvendo os problemas de propriedade, o assunto se resolve por si e a sua conclusão de que, nas actuais circunstâncias de mercado, a intervenção do Estado é imprescindível para gerir sensatamente o fogo.
Mas, infelizmente, a partir de um diagnóstico fundamentalmente errado, só por mero acaso se consegue chegar a soluções úteis e praticáveis sobre que intervenções deve o Estado fazer para ganharmos controlo sobre o fogo.
O artigo foi publicado originalmente em Corta-fitas.