Nos últimos anos, a cultura do kiwi em Portugal tem vindo a ganhar destaque, sobretudo no Norte do país, onde o clima favorece o seu desenvolvimento.
A região do Minho, em particular, oferece temperaturas amenas e precipitação regular, fatores essenciais para uma boa produtividade. A perceção do kiwi como cultura lucrativa tem atraído cada vez mais agricultores. Contudo, importa questionar: estará Portugal preparado para competir com países como Itália, Grécia e Nova Zelândia, que lideram há décadas o mercado internacional? E mais: estará o setor nacional a crescer de forma sustentável?
O aumento do número de produtores revela um interesse crescente. Com a procura internacional em alta e Portugal a posicionar-se como fornecedor de qualidade, muitos veem no kiwi uma forma de diversificar a atividade agrícola e alcançar rendimentos atrativos. No entanto, o crescimento não está isento de riscos.
Grande parte da produção nacional é escoada para Espanha, beneficiando da proximidade geográfica e da elevada procura no país vizinho. Se, por um lado, esta relação facilita a logística e impulsiona as vendas, por outro, deixa os produtores nacionais excessivamente dependentes de um único mercado.
Para garantir crescimento sustentável, torna-se fundamental explorar novos destinos de exportação e consolidar a reputação do kiwi português, destacando a sua excelência, sabor e valor nutricional. Tal objetivo exige investimento contínuo em certificações de qualidade, estratégias eficazes e uma cadeia logística bem estruturada.
Apesar do otimismo, os desafios fitossanitários são inegáveis. A bactéria Pseudomonas syringae pv. actinidiae (Psa), responsável por danos graves noutros países, já foi detetada em Portugal. Esta ameaça realça a importância de uma monitorização rigorosa, onde a agricultura de precisão com novas aplicabilidades na deteção de doenças auxilia na implementação de medidas de controlo eficazes.
A questão central prende-se com a preparação do setor para enfrentar a Psa, orientações técnicas para prevenção e combate, muitos pequenos e médios produtores carecem dos recursos técnicos e financeiros para aplicar essas práticas com eficácia. Sem reforço da vigilância e do apoio técnico, Portugal poderá enfrentar um cenário semelhante ao de Itália, onde a bactéria dizimou vastas áreas de cultivo, causando prejuízos económicos consideráveis. O potencial do kiwi é inegável, mas a sua rentabilidade depende da capacidade de resposta a estas ameaças.
Outro fator preocupante são as alterações climáticas. Apesar das condições teoricamente ideais do Norte, fenómenos extremos, como geadas tardias, ondas de calor e secas prolongadas, tornaram-se mais frequentes, afetando negativamente a floração, a frutificação e a produtividade. As geadas representam um problema particular. Em algumas regiões, os produtores já instalaram sistemas de proteção, mas os custos são difíceis de suportar para explorações de menor dimensão. Por sua vez, a escassez de água em períodos de seca pode comprometer a viabilidade da cultura. Perante este cenário, é urgente apostar em estratégias de adaptação: otimizar sistemas de rega, introduzir variedades mais resistentes e melhorar práticas de produção. A falta de mão de obra especializada agrava ainda mais o panorama, dificultando tarefas exigentes como a poda, a condução e a colheita.
Além disso, a concorrência internacional é feroz, países como Itália, Grécia e Nova Zelândia lideram o mercado com elevados volumes de produção e preços muitas vezes difíceis de igualar. Neste contexto, a diferenciação pela qualidade, sabor e apresentação é a principal vantagem dos produtores portugueses.
Para enfrentar os desafios, a cooperação entre produtores é essencial. A partilha de conhecimentos sobre o controlo da Psa, métodos eficientes de rega, técnicas de agricultura de precisão e estratégias conjuntas pode tornar o setor mais resiliente e competitivo. O kiwi português tem potencial para afirmar como referência de qualidade. No entanto, esse caminho exige investimento em inovação, sustentabilidade e formação contínua. É fundamental evitar uma “bolha agrícola”, alimentada por entusiasmo inicial, mas sem bases sólidas.
A valorização do produto passa também pela criação de marcas regionais, certificações de origem e procura de nichos de mercado. Um produto diferenciado, com identidade própria e atributos reconhecidos, tende a conquistar novos consumidores. A consolidação do setor dependerá, sobretudo, de uma estratégia clara, que reduza a dependência de um único mercado, e garanta rentabilidade a longo prazo. Sem esta visão, qualquer alteração na procura de Espanha pode colocar em risco a estabilidade do setor.
O kiwi, sem dúvida, é uma cultura promissora em Portugal, mas enfrenta desafios inegáveis. A Psa, as alterações climáticas, a escassez de mão de obra e a concorrência externa exigem planeamento e cooperação entre todos os intervenientes. Se Portugal quiser afirmar-se como produtor de referência, é essencial reforçar a investigação, promover formações técnicas e fomentar um espírito de colaboração no setor. Só assim o kiwi português poderá conquistar o seu merecido lugar no panorama agrícola internacional.
O futuro da cultura do kiwi depende das decisões tomadas hoje. Apostar na qualidade, na prevenção de riscos e na resiliência é o caminho para garantir que esta cultura se transforme numa história de sucesso.
Bruno Carvalho e Fernando Portela
Doutorando em Engenharia de biossistemas e doutorando em Ciências Agronómicas e Florestais