Vários pequenos produtores dinamizadores da petição “Salvem os Viticultores do Douro” pediram hoje, numa audição na Assembleia da República, “dignidade” em face das incertezas económicas que atingem a região demarcada, indicando várias sugestões de medidas de apoio.
Numa audição a propósito da elaboração da petição pública, Joaquim Monteiro pediu “dignidade” no tratamento dos viticultores e de toda a região, pretendendo “continuar a viver no Douro mesmo que eles [grandes produtores] ganhem milhões”, solicitando apenas “o suficiente para viver” na sua terra.
Marinete Alves, viticultora e advogada, alertou que nos últimos anos se tem verificado “um desequilíbrio muito grande entre o preço da uva e o custo de produção da uva, o que provoca uma falta de segurança e uma instabilidade financeira muito grande nos viticultores”.
Outro ponto é “a falta de ausência de contratos de compra de uva”, que faz com que o Douro possa ser, na visão da produtora, “a única região, se calhar, do mundo e do país, que faz um negócio de venda de uvas, de compra e venda de uvas, sem qualquer preço, sem qualquer contrato em que a maior parte dos viticultores entregam as suas uvas sem preço” e “não sabem quando vão receber nem quanto vão receber”.
“Há uma diminuição dos rendimentos dos viticultores, temos uma margem de lucro muito reduzida, uma insegurança financeira, temos uma redução na nossa qualidade de vida, está a provocar uma desertificação rural, está a provocar um impacto muito negativo no ambiente, nas práticas agrícolas que se tornam insustentáveis, estamos a ter uma perda de património cultural, estão a desaparecer as nossas tradições e consequentemente isto terá um impacto também no turismo”, alertou.
Já Arlindo Castro sustentou que “a atividade principal económica do Douro é rentável (…), só que nem todos beneficiam dessa rentabilidade”.
Fazendo uma breve história dos últimos anos, desde o papel da Casa do Douro no escoamento de “todos os vinhos que o comércio não adquiria na região” à produção de aguardente, algo liberalizado em 1991, observou que “como a aguardente do Douro é sempre mais cara do que a aguardente produzida noutras regiões”, isso “fez com que a Casa do Douro ficasse economicamente impossibilitada em continuar a escoar os vinhos do Douro”.
“Reduziu o benefício, reduziu a receita do preço e cresceram os excedentes, como é evidente. A importação da aguardente permitiu o crescimento ilimitado da oferta de vinho do Porto, na medida em que uma parte vem de fora da região. Não estávamos limitados àquilo que a região produzia. Permitiu-se importar tudo quanto era necessário para produzir vinho do Porto”, uma estratégia que considera “completamente errada”.
Como soluções, Marinete Alves apontou “o estabelecimento de um preço mínimo para as uvas”, através da inclusão da uva no “observatório de preços agroalimentares da região”, garantindo assim “uma sustentabilidade económica da viticultura e consequentemente uma sustentabilidade também social e ambiental da própria região”.
Outra solução é tornar a aguardente “exclusiva da região do mercado de Douro”, vincando que, “ao Douro, o que interessa é vender o que produz” e não “o que os outros produzem”, disse Arlindo Castro.
Os peticionários consideram ainda que as medidas tomadas até agora, como reforço de fiscalização, são “insuficientes” e não podem ocorrer só na altura da vindima.
A petição “Salvem os viticultores do Douro” foi entregue na Assembleia da República, com 2.605 assinaturas, em outubro de 2024.
As preocupações que originaram a petição foram-se confirmando ao longo dos quase dois meses da vindima de 2024 que fica marcada por dificuldades de venda da produção, com produtores a deixar na vinha as uvas que não foram destinadas ao vinho do Porto, com os operadores a alegaram ‘stocks’ cheios para não comprarem ou comprarem menos uvas.
Já em abril mais de 150 viticultores do Douro receberam cartas a cancelar encomendas de uvas para este ano.