A vinha e a adega da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) são salas de aula para os alunos que ao mesmo tempo que cortam uvas aprendem sobre castas e clones e diferentes processos de vinificação.
A UTAD, em Vila Real, foi pioneira em 1989 na criação da licenciatura em Enologia e, como as aulas arrancam em setembro, os novos estudantes participam logo numa vindima controlada.
“É uma vinha antiga, um campo de seleção de clones plantado em 1996 e é uma combinação de 41 clones”, começou por explicar Cristina Carlos, do departamento de Agronomia, numa das aulas práticas que foi acompanhada pela agência Lusa.
Neste campo clonal da casta touriga nacional, ao mesmo tempo que cortaram as uvas os alunos tiveram que contar o número de cachos de cada clone (videira), pesar as uvas, tirar o grau de álcool e registar toda a informação para, depois, colocar o fruto numa caixa que levaram para a adega.
A vinha com seis hectares e adega estão localizadas na Quinta Nossa Senhora de Lurdes, junto ao campus, na cidade de Vila Real, mas a UTAD possui ainda uma outra vinha com três hectares em Carlão (Alijó).
“A ideia é olharem para os dados e perceberem que há diversidade entre clones”, acrescentou Cristina Carlos.
Munidos de tesouras, baldes e balanças, os alunos meteram mãos ao trabalho.
“Eu ainda não tenho muita experiência de vindima, comparado com algum pessoal aqui que tem quintas maiores, com mais produções. Tenho uma quinta pequenina no Douro, por isso sabia que estas aulas práticas iam ser muito importantes para termos mais noção da realidade da viticultura”, afirmou David Monteiro, 18 anos e natural de Vila Nova de Gaia.
A David calhou o corte e a contagem dos cachos por videira. Nas vindimas familiares em que participou “era só cortar a eito”. “Aqui tem-se outra atenção e outro cuidado”, referiu.
Luís Canas, 28 anos, de Celorico de Basto, está a tirar um segundo curso em Enologia, depois de se licenciar em Engenharia Agronómica.
“Também já trabalhei no setor da viticultura e senti necessidade de complementar a minha formação com esta parte mais de adega”, referiu, destacando a importância das aulas práticas para os colegas que estão a ter o primeiro impacto com a vida no campo e com a videira.
Luís Canas referiu que cortar uvas é “o mais pequeno dos trabalhos” que os alunos vão ter.
Questionada sobre se a vinha da UTAD é uma sala de aula, Ana Oliveira, professora de Viticultura há 38 anos, respondeu que sim.
“Sempre que possível as aulas são de campo e acompanham todas as práticas culturais inerentes à manutenção de uma vinha”, afirmou, realçando a diversidade que existe naquela vinha em castas, formas de condução da videira, em porta-enxertos ou clones.
“Cada clone, neste caso, da touriga nacional, tem um comportamento. Há clones mais produtivos, há clones menos produtivos e outro que dão maior grau álcool, outros que têm mais acidez ou que são mais sensíveis ao desavinho, a doenças”, referiu.
Os dados registados pelos alunos vão permitir, depois, fazer cálculos, análises e o histórico de cada planta.
Ana Oliveira contou ainda que a touriga nacional é uma casta com grande potencial em termos qualitativos, mas que teve problemas de produtividade que acabaram por ser ultrapassados devido à seleção clonal.
“O objetivo é dar aos alunos conceitos práticos de gestão da vinha, do dia-a-dia da vinha, acompanhar as tarefas que estão a ser desenvolvidas no âmbito do património vitícola da UTAD”, disse ainda Cristina Carlos.
Na adega os alunos foram recebidos pelo enólogo e professor Tiago Alves de Sousa.
Ali depositaram as uvas na mesa de escolha, onde retiraram as folhas. Depois o desengaçador fez a separação dos bagos da uva dos caules e ramificações e, segundo Tiago Alves de Sousa, nesta altura a decisão se as uvas vão para o lagar mecanizado, para uma determinada cuba de fermentação ou para outra com diferentes características, “vai ter um impacto muito significativo na qualidade final”.
“Por isso, nós, como enólogos temos que efetivamente conhecer bem estas ferramentas para sabermos onde é que elas devem ser utilizadas no sentido de termos a melhor qualidade possível”, disse aos alunos.
A adega da academia transmontana dispõe, entre outros, de um lagar com pisa mecânica, cubas de fermentação em inox de diferentes formas (desde a tradicional a formatos originais como diamante, ovoide ou esfera), cubas de armazenamento e barricas de envelhecimento.
Também neste caso a sala de aula é levada para dentro da adega. Do currículo da licenciatura fazem parte as atividades na adega – desde a vinificação às práticas laboratoriais.
O vinho feito a cada ano é engarrafado com um rótulo com a assinatura de todos os alunos que colaboraram. Este ano entraram no curso de Enologia 35 alunos.