Precisamos que a agricultura entre em força nos gabinetes municipais, ajudar a recuperar solos e terras de cultivo abandonados, aconselhamento técnico e formas de vender local e consumir local. E ao mesmo tempo, visão estratégica não esquecendo a sustentabilidade e a ação climática.
São os mosaicos de florestas, matos e agricultura, o pastoreio nos montes. E dinheiro para recuperar terreno bravio. Contudo, não temos, não existe uma lista, oficial e centralizada, que indique todos os municípios em Portugal que têm um vereador especificamente com o pelouro da Agricultura. Há, contudo, exemplos de autarquias que atribuem esta responsabilidade a um dos seus vereadores ou que têm um gabinete de apoio específico à agricultura. E que dela tiram proveito.
A minha atenção centra-se na quantificação dos efeitos de iniciativas municipais específicas na expansão do mercado, para além da mera identificação de exemplos. E à falta de dados, podemos olhar ao que já fizemos, de forma isolada e sem um argumentário métrico.
O Fundão possui um vereador com o pelouro de “Desenvolvimento Rural, Agricultura e Florestas”, vejam o caminho das cerejas. Moimenta da Beira: Tem uma vereadora com os pelouros de “Agricultura, Floresta e Recursos Cinegéticos”, vejam a maçã.
Cantanhede: Embora não seja um vereador exclusivo para a Agricultura, existe um vereador com o pelouro dos “Recursos Naturais, Desenvolvimento Agrícola e Florestal”. Vejam o carolino IGP. Sabrosa: Conta com um vereador que tem, entre outros, o pelouro de “Agricultura e Florestas”. Vejam a castanha. Até a Maia tem um pelouro para “Competitividade Económica e Agricultura”.
Outros municípios, como Vila Pouca de Aguiar, têm um “Gabinete de Apoio ao Agricultor”, indicando um foco municipal na área, mesmo que não haja um vereador exclusivo com esse pelouros. Municípios como Vila do Conde também possuem um “Conselho Municipal de Agricultura”.
Tudo isto na altura em que a Comissão Europeia está prestes a discutir o seu plano de gastos para os próximos sete anos, num contexto de tensões comerciais e pressões internas para cortes orçamentais. O orçamento atual da UE ascende a 1,2 biliões de euros, e várias partes interessadas, incluindo agricultores, estão a lutar para proteger os seus interesses. O novo plano orçamental deve enfrentar cortes significativos, especialmente nos orçamentos agrícola e regional, que representam dois terços do orçamento atual.
Dezanove países, incluindo França e Alemanha, rejeitam uma fusão total entre os fundos de coesão e a PAC (Política Agrícola Comum). Ainda assim, admitem um movimento nessa direção.
O vento sopra para esta junção, e vendo como a gestão europeia está a atuar em termos orçamentais, é tempo de discutir, de forma séria, o reforço das competências municipais em matéria agrícola. Basta colocar um agrónomo nos já existentes gabinetes florestais, pensar floresta e agricultura, como defesa contra incêndios, reforço da produção local e uma logística curta e sem embaraços ecológicos. E ajudar a comercializar, tirar partido de tantos mercados e tantas feiras semanais que bem podem fornecer a restauração e as lojas de retalho. O turismo não pode ser só passeios e as mais-valias enxutas sem injetar dinheiro na economia local que mantém as paisagens.
Claro, temos de saber comunicar estas estratégias, mas terão de ser planos a quatro anos, pelo menos, um mandato autárquico. Planos robustos. E se dúvidas houvesse sobre a vantagem do modelo, olhemos para exemplos em Portugal. Além do Vinho de Carcavelos Villa Oeiras, que reflete o pioneirismo e a modernidade da Câmara Municipal de Oeiras na recuperação deste património vitivinícola, existem outras iniciativas a nível municipal.
As autarquias em áreas rurais de baixa densidade em Portugal têm vindo a implementar políticas inovadoras para promover o desenvolvimento local e combater o despovoamento. Estas políticas visam a atração de pessoas e empresas, transformando o património, os bens e os recursos em património material e imaterial. A promoção da competitividade local exige capacidade de inovação, tanto de mercado como social, baseada na combinação de potencialidades endógenas e exógenas, exigindo uma visão estratégica de futuro e liderança institucional autárquica.
O sucesso destas políticas de desenvolvimento local está intrinsecamente ligado ao modelo de governança territorial adotado, onde as autarquias locais promovem o trabalho em rede e a inovação entre os diversos intervenientes. E coesão também se faz na floresta, lavoura e nos circuitos de distribuição.
Existem diversos exemplos de municípios que têm incentivado os mercados locais e a produção regional através de políticas municipais que servem para atrair pessoas e turistas, e também os emigrantes que se encontram no estrangeiro.
A diversificação da produção agrícola é vista como crucial para a competitividade e sustentabilidade local em áreas rurais. Sobretudo as que deixámos abandonar, quase 70% do território continental.
Temos informações disponíveis da agricultura, como índices de preços da produção agrícola, fornecidos pelo INE, mas não temos detalhe sobre o volume de vendas ou o número de transações especificamente em mercados locais, municipais ou feiras de produtores. Tomando Montalegre como exemplo, a feira do fumeiro injeta num único fim-de-semana mais de cinco milhões de euros na economia concelhia.
Apesar de um compromisso anterior de direcionar 30% do orçamento para objetivos climáticos, a crescente pressão política está a desviar a atenção das questões ambientais. A comissária do clima, Teresa Ribera, está a lutar para manter este objetivo em face das novas realidades. E são estas que nos fazem pensar e promover uma melhor gestão e afetação dos recursos.
Portugal defende que a PAC e os fundos de coesão são cruciais para o projeto europeu. Se os quisermos aproveitar, teremos de ter mais produção local, mais compras dos agentes económicos regionais e mais sensibilidade nacional, regional e local para a lavoura e a floresta.
Aliás, a introdução de agricultura em muitos campos produtivos, porém abandonados, só beneficia a coesão e as regiões.
Temos de saber ser disruptivos e colocar o que temos em funcionamento. Rentabilizar e tornar eficiente, como sucede em tantos países, a agricultura e colocá-la ao serviço da coesão.
Creio que desta forma, estaríamos a reduzir défice alimentar, a cuidar da terra que desprezamos e ganhar coesão que é o que nos falta.
Escritor e engenheiro do ambiente
O Futuro da Agricultura: Um Desafio Geracional e uma Oportunidade para Portugal