Uma nova adega de DOC Douro
Esta vindima assinalou um momento marcante e crucial no compromisso da nossa família com a produção de vinho sustentável e com a nossa ambição nos vinhos DOC Douro. Após seis anos de planeamento meticuloso e de construção, abrimos a nossa nova adega de impacto reduzido, a Adega do Ataíde, localizada na nossa propriedade no vale da Vilariça — Quinta do Ataíde. Investimento ligeiramente acima dos 12€ milhões, trata-se de um dos projetos mais ambiciosos da nossa família e reflete a confiança que temos no futuro dos DOC Douro de qualidade. É a nova casa dos vinhos tintos da Quinta do Ataíde, da Quinta do Vesúvio e dos Altano Tinto Reserva e tinto e rosé biológicos.
Inspirada pelo nosso compromisso de longo prazo com a sustentabilidade e a inovação, a adega foi concebida por uma equipa interna de arquitetos, engenheiros e enólogos para produzir vinhos da mais alta qualidade e para ser altamente eficiente no uso de energia e de água. A cobertura é rodeada de painéis fotovoltaicos que produzem eletricidade suficiente para que a adega seja energeticamente autossuficiente, enquanto uma estação própria de tratamento de águas permite-nos usar águas pluviais e águas residuais tratadas. A candidatura para o processo de certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design) foi aceite e poderá fazer desta adega a primeira em Portugal com certificação LEED e a primeira no mundo a alcançar o muito completo patamar LEED v4, que aborda eficiência energética, gestão de recursos hídricos, escolha de localização, seleção de materiais, iluminação natural e redução de desperdícios.
Aproveitando a orografia do terreno, trata-se de uma adega gravítica que permite a transferência de massas frescas pelo edifício, sem recurso a bombas mecânicas e tubos de massas. As cubas de fermentação estão equipadas com air-mixing, processo que injeta ar dentro da cuba de forma ascendente, proporcionando uma remontagem natural que poupa energia e favorece a qualidade do vinho. É verdadeiramente uma adega de sonho para qualquer enólogo e concede-nos grande alcance na produção de vinhos do Douro de grande qualidade.
2023 foi a nossa vindima de estreia nesta adega e estou impressionado não só com a facilidade com que a nossa equipa de enologia se adaptou aos novos processos e equipamentos, mas também com a qualidade dos vinhos produzidos. Os primeiros dez dias foram dedicados a ensaiar processos, a testar equipamentos e a afinar procedimentos. Embora tivéssemos sentido algumas dificuldades iniciais, estas foram rapidamente ultrapassadas pela equipa, que naturalmente encontrou um bom ritmo de trabalho ao longo da vindima. Esta nova adega não só confirmou tudo o que esperávamos dela, como ultrapassou todas as nossas expectativas e sentimo-nos muito motivados pelas oportunidades que nos proporciona olhando para o futuro.
Iniciámos, praticamente a partir do nada, o nosso projeto DOC Douro em 1999 e, ao longo das duas últimas décadas, desenvolvemos uma alargada gama de vinhos da região, comercializando perto de 270,000 caixas em 2022. Contudo, o Douro enfrenta um grande desafio com um sistema de regulamentação ultrapassado que permite a livre transação no mercado aberto para as uvas destinadas aos vinhos DOC Douro, frequentemente abaixo do preço de custo e com excesso de oferta. Em contrapartida, a produção de vinho do Porto é altamente regulada através do sistema do benefício. Este quadro está a impactar a sustentabilidade socioecónomica da região e o futuro dos vinhos do Douro nos mercados internacionais. Acreditamos que é com projetos inovadores como a nova Adega do Ataíde — e do impacto positivo que representa para a produção dos nossos vinhos de alta qualidade —, que poderemos projetar a realidade da nossa região, valorizar os seus vinhos e fazer crescer a categoria dos DOC Douro. Contudo, sem um novo quadro regulatório que abranja o vinho do Porto e o vinho DOC Douro, o desequilíbrio persistirá.
Vindima no Douro: expectativas elevadas
Após uma sucessão de vindimas desafiantes no Douro, com ondas de calor prolongadas, secas e baixas produções, na véspera da vindima de 2023 estávamos bem posicionados para termos um dos melhores anos dos últimos tempos.
O ciclo de crescimento foi, de um modo geral, bastante favorável com chuva abundante no inverno e no final da primavera a repor as reservas de água nos solos, após um dos anos de maior seca que foi 2022. Enquanto a maior parte da Europa sentiu ondas de colocar intensas no verão, Portugal foi em grande parte poupado. As temperaturas em julho, no país, estiveram perto do normal e no Douro até um pouco abaixo da média. Embora não tivesse chovido no Douro em julho e agosto, a conjugação de bons níveis de humidade nos solos e de temperaturas moderadas, susteve as vinhas e proporcionou excelentes condições para as maturações evoluírem de forma gradual, para preservar bons níveis de acidez e para favorecer bom desenvolvimento fenólico.
A nossa capacidade de maximizar o potencial de condições como estas e de vindimar as uvas no momento certo, está sempre condicionada por um plano de corte bem pensado, equipas de viticultura e enologia ágeis e condições climatéricas favoráveis. Embora tivéssemos tido alguma chuva na altura perfeita no início de setembro, que muito beneficiou a evolução da cor, dos taninos e dos aromas nos vinhos produzidos nas primeiras semanas do mês, o tempo virou-se contra nós nas fases finais da vindima.
No entanto, e felizmente, a maior parte da nossa Touriga Nacional e algumas das melhores parcelas de Touriga Franca tinham as maturações num estado avançado com boa evolução fenólica, e pudemos vindimar estas uvas antes dos episódios de chuva forte. Embora 2023 possa não ter sido o ano excecional que esperávamos, após provar os vinhos, estou muito satisfeito com a qualidade dos vinhos que produzimos, particularmente nas nossas quintas no Cima Corgo. Os melhores vinhos apresentam-se muito equilibrados com excelente cor e frescura.
Um arranque precoce e positivo
Iniciámos a nossa vindima no dia 21 de agosto com as uvas brancas Viosinho, oriundas de duas vinhas situadas em cotas acima dos 500 metros: a Quinta das Netas, no vale do Pinhão, e a vinha da Tapadinha no vale do Rio Torto. Com muito bons níveis de acidez e produções 10% acima do estimado,
foi um belo início de vindima. Na primeira semana vindimámos também alguma Tinta Roriz na Quinta do Ataíde para a produção do Altano Rosé.
A partir do dia 29 de agosto, começámos a vindimar algumas parcelas de Sousão, Tinta Amarela e vinhas velhas (mistura de castas) nas nossas propriedades do Douro Superior e também na Quinta do Bomfim (Dow’s) e na Quinta dos Malvedos e Quinta do Tua (ambas da Graham’s) — estas no Cima Corgo.
À medida que nos preparávamos para acelerar o ritmo da vindima dos tintos, fomos favorecidos com chuva certeira no dia 3 de setembro (12,4 mm na Quinta do Bomfim). Seguiu-se uma semana de tempo seco com sol que proporcionou condições perfeitas para vindimarmos as castas temporãs — Alicante Bouschet, Tinta Barroca, e alguma vinha velha. Estas deram boas fermentações com boa cor e Baumés a rondar os 13°.
Tivemos um segundo episódio de chuva no dia 9 de setembro, com 20,6 mm registados no Bomfim, repartidos por três dias. Assim, chegámos ao total de 33,6 mm durante os primeiros 11 dias do mês, o que corresponde a um mês completo de chuva no Bomfim (média de 30 anos). Assim, pausámos a vindima e fizemos o ponto da situação na vinha e do estado das maturações. Apesar dos episódios de chuva, curtos, mas generosos, tínhamos ainda boas condições para a evolução favorável das maturações.
O tempo seco e soalheiro regressou e começámos a vindimar a Touriga Nacional na maior parte das nossas propriedades sob condições ideias. Tínhamos lagares com Baumés entre 13° e 14°, com excelente cor e aromas fantásticos. Vindimámos as parcelas de Stone Terraces nos Malvedos (que deram um lagar impressionante) e algumas parcelas de Touriga Franca, mesmo a tempo de evitar mais um episódio de chuva abundante.
Ponto de viragem
O terceiro episódio de chuva veio em meados de setembro (dias 15, 16 e 17) e os volumes de precipitação foram bem maiores do que o esperado. Num só dia, registámos no Bomfim 32 mm. Felizmente, tínhamos vindimado a nossa melhor Touriga Nacional antes desta chuva e o que faltava colher permanecia em boas condições, uma vez que as maturações já estavam bem avançadas. Embora os aguaceiros fossem abundantes, foram também relativamente breves o que atenuou o seu impacto.
Foi com alguma apreensão que iniciámos a vindima da Touriga Franca, casta tardia. Embora os Baumé estivessem, efetivamente, um pouco abaixo do ideal, as peliculas das Francas libertaram muita cor e bons aromas, confirmado a boa evolução fenólica ao longo do mês, apesar da chuva.
Avaliação
De um modo geral, tivemos uma vindima bastante boa e produzimos alguns vinhos muito bons até à terceira semana de setembro, em particular, na sub-região do Cima Corgo. Os vinhos são equilibrados, com bons níveis de acidez a realçar a frescura que ostentam. A Touriga Nacional teve um desempenho especialmente bom, com boas maturações e desenvolvimento fenólico próximo da perfeição.
Embora o terceiro período de chuva tivesse tido algum impacto no pleno potencial da Touriga Franca, a ausência de calor extremo (que tem sido habitual em anos recentes), aliada aos bons níveis de humidade no solo que se mantiveram em julho e agosto, permitiu que as maturações progredissem ao longo do verão (sendo frequente serem interrompidas em anos com calor extremo). Consequentemente, a maturação fenólica estava, maioritariamente, bastante avançada quando vindimámos esta casta.
A produção total nas nossas quintas no Douro foi 33% superior à de 2022. Contudo, quando comparado com os últimos dez anos, pode-se considerar 2023 como um ano de produção média. As produções por videira foram de 1,15 Kg (média de 10 anos: 1,06 Kg).
Alentejo – Quinta da Fonte Souto
A vindima na Quinta da Fonte Souto no Alto Alentejo, que começou com o Verdelho, teve início no dia 7 de agosto, sendo assim a vindima mais precoce na propriedade nos últimos 20 anos. Felizmente, este arranque precoce não se deveu a ondas de calor tais como as que foram sentidas em grande parte da Europa neste verão (o país foi em grande parte poupado a este calor extremo). Em contrapartida, tivemos um ciclo de crescimento precoce, trazido pelo inverno húmido e pela primavera muito soalheira, o que encorajou maturações graduais, homogéneas e equilibradas. As últimas uvas chegaram à adega no dia 13 de outubro, o que significou uma vindima com dois meses de duração — algo sem precedente.
As nossas equipas de viticultura e enologia planearam a vindima cuidadosamente, com recolha seletiva bardo a bardo — dentro de determinadas parcelas — de acordo com os níveis de maturação ideais. Tivemos o dobro da precipitação média do mês de setembro e tivemos a coragem de pausar a vindima em diversas ocasiões, de modo a permitir que as vinhas tirassem proveito da chuva e esperassem pelo regresso de tempo mais quente e seco. Foi uma aposta ganha e tivemos condições fantásticas para alcançar plenas maturações nas fases finais da vindima.
A vindima na Fonte Souto foi bem impressionante, com as uvas brancas, em particular, a mostrarem enorme promessa. As condições moderadas deste ano deram lugar a vinhos frescos, aromáticos, bem-estruturados e equilibrados.
Vinho Verde – Casa de Rodas
Tivemos uma vindima de estreia breve na nossa nova propriedade — Casa de Rodas — na sub-região de Monção-Melgaço da denominação Vinho Verde. Foi a nossa primeira vindima desde a sua aquisição em 2022, que se seguiu à criação da parceria com o lendário produtor de Vinho Verde, Anselmo Mendes, para a produção e distribuição de vinhos desta histórica propriedade.
A nossa equipa de viticultura trabalhou em articulação com Anselmo Mendes nas vésperas e durante a vindima. As uvas foram transportadas para a sua adega para produzir os nossos primeiros vinhos da propriedade. Foram produzidos alguns vinhos Alvarinho de boa qualidade e estamos desejosos de acompanhar a sua evolução ao longo dos próximos meses, antes de os lançarmos pela primeira vez.
Charles Symington, Principal Enólogo e Diretor de Produção
Fonte: Symington Family Estates