“Em 1996, o meu pai recebia o leite a 33 cêntimos. Eu, 25 anos depois, recebo a 31!”, atira, desanimado, Miguel Silva. É ele quem toca, hoje, a exploração. Estudou, investiu, modernizou-se. Agora, não ganha para as despesas. Esta sexta-feira de manhã, juntou-se ao protesto simbólico da Aprolep – Associação dos Produtores de Leite de Portugal, nos Aliados. Em 2020, 200 explorações fecharam as portas.
O “grito de alerta” chegou com 200 pares de botas, colocados simbolicamente em frente à Câmara do Porto. A “morte lenta” do setor preocupa. Querem “um preço justo” à produção e, acima de tudo, “respeito e empenho” do Governo no apoio a um “setor essencial”, que dá de comer ao país.
“Abdicamos dos apoios pelo pagamento de um preço justo à produção”, sublinha a vice-presidente da Aprolep, Marisa Costa, farta de ver os agricultores, tantas vezes, rotulados como o “subsídio-dependentes”. Tem 33 anos e também ela gere a exploração, que passou de pais para filhos.
No último ano, viu desistirem 200 colegas. Neste momento, em Portugal, restam quatro mil produtores de leite, menos de metade estão no continente.
Estão “cansados, revoltados e muito preocupados com o futuro”. Em dezembro, o preço médio ao produtor foi de 30,4 cêntimos por quilo (de leite) – um dos mais baixos da Europa. Não há perspetivas de subir. O preço das rações aumenta e, neste momento, garante Miguel Silva, “muitos já não pagam os custos”.
“As rações subiram cinco cêntimos por quilo. Quando gastamos, 20 toneladas por mês é muito dinheiro”, frisa.
Queda de 80% nas ajudas
As últimas notícias deixaram ainda mais em alerta o setor: por causa das imposições europeias, as simulações da evolução das ajudas do governo para os próximos anos, feitas pelos especialistas, apontam para “uma enorme redução”. “Quedas que, até 2027, atingirão os 80%”, explica Carlos Neves, o secretário-geral da Aprolep, temendo que, se nada for feito, a “morte lenta” da produção leiteira “se repita este ano” e se “intensifique” nos seguintes.
O Governo prevê compensar essa redução com um “ajuste dos pagamentos ligados e a introdução de “eco-regimes””, mas as próprias simulações do Ministério da Agricultura denunciam, ainda assim, “perdas brutais”.
“O que vemos é desrespeito e falta de empenho do Ministério em defender o setor que, durante a pandemia, nunca deixou falta comida na mesa dos portugueses”, frisa Marisa Costa.
Hoje, ficou o “grito de alerta” ao Governo e a todos os partidos: urge, dizem, rever o modelo dos apoios, promover o diálogo entre a indústria e a distribuição – eventualmente, admite Marisa Costa, estabelecendo um valor mínimo a pagar à produção – e pôr o preço do leite “em níveis sustentáveis”.
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