No âmbito projeto PRR DEMO.net, iniciado em abril de 2023, está a decorrer um conjunto de visitas técnicas às Organizações de Produtores (OP) parceiras, com o objetivo de promover a troca de experiências entre pares. Neste artigo, é apresentado o Programa de Melhoramento Genético (PMG) da Cultura do Morangueiro, uma iniciativa da OP Frutas Classe, uma das OP parceiras deste projeto.
A Frutas Classe foi reconhecida como OP em 2008 na categoria de frutas, e a partir de 2013, passou a ser reconhecidas como OP de morango. Conta atualmente com 7 produtores e 70 ha de produção no Ribatejo e Oeste, estando a maior área de produção nas Caldas da Rainha, onde se situa a sua sede e o centro logístico.
Portugal tem tradição na cultura do morango, beneficiando de regiões com condições favoráveis para a sua produção durante quase todo o ano. No entanto, o consumo de morangos é muito superior à sua produção atual, com um grau de autoaprovisionamento de 65,6% e uma exportação de 13,3% (Fonte: GPP, 2024, disponível em https://www.gpp.pt/index.php/produtos/produtos), o que indica haver um potencial grande de crescimento da produção para o abastecimento do mercado interno e externo.
Em 2021, a Frutas Classe iniciou o PMG da cultura do morangueiro, denominado ResiliBerry, pioneiro em Portugal. Este programa tem como objetivo obter variedades de morango próprias, adaptadas aos sistemas de produção nacionais, resilientes aos desafios bióticos e abióticos, como pragas, doenças, e a condições climáticas em contexto de mudança.
A aposta no PMG, o primeiro Projeto de Investigação & Desenvolvimento experimental da OP, pretende responder a diversas necessidades identificadas:
- Resistência a pragas e doenças: permitindo a redução do uso de produtos fitofarmacêuticos e a obtenção de um produto final com resíduos abaixo dos limites legais atuais. Embora existam variedades no mercado com boas características, nas condições edafoclimáticas do Ribatejo-Oeste, estas continuam a apresentar sensibilidade a certas doenças, como o oídio. A seleção local é, portanto, fundamental. Também a avaliação da suscetibilidade a pragas emergentes, é um critério considerado na seleção de novas variedades, na medida em que é uma realidade que a cada ano leva a estragos avultados na produção.
- Adaptação às alterações climáticas: através da seleção de variedades com menor necessidade de água (por exemplo: variedades com sistemas fotossintéticos mais eficientes) e maior resistência a temperaturas elevadas.
- Diversificação da oferta de morangos: explorando variedades com características diferenciadas, como cor, sabor e textura, procurando atender a diferentes preferências de mercado e aumentando a valorização do produto no mercado.
- Redução de custos: uma vez que a obtenção de variedades próprias evitará o pagamento de royalties por parte dos produtores. Além disso, a utilização de variedades resistentes a pragas e doenças e com menores necessidades de água e fertilizantes contribuirá também para a redução dos custos de produção.
O PMG é uma aposta na competitividade, ao criar variedades de morango que oferecem maior produtividade, qualidade e diferenciação no mercado. Para isso, a Frutas Classe estabeleceu contactos com universidades e institutos de investigação, nomeadamente o Instituto Superior de Agronomia (ISA) e o InnovPlantProtect, no início da instalação dos laboratórios, que permitiram a instalação de laboratórios de biologia molecular e de multiplicação in vitro e o desenvolvimento de protocolos de melhoramento. Além disso, a organização mantém contatos com a Faculdade de Ciências de Universidade de Lisboa (FCT), o Instituto Politécnico de Leiria, o Instituto Politécnico de Santarém e a Universidade de Coimbra, para acolher alunos em estágios e doutoramentos.
O PMG está baseado no melhoramento genético tradicional através da hibridação controlada entre progenitores conhecidos. Este processo consiste na transferência de pólen entre plantas, resultando em novas plantas, que são avaliadas ao longo de vários ciclos, até se obterem variedades com as características desejadas, como produtividade, resistência a pragas e doenças e qualidade do fruto. Sendo este processo normalmente muito moroso, a Frutas Classe incorporou a biotecnologia, nomeadamente a engenharia genética, como a seleção assistida por marcadores moleculares, e prepara-se para integrar as Novas Técnicas Genómicas, como o CRISPR (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats), de modo a otimizar o programa de melhoramento. Com o objetivo de acelerar e direcionar os resultados, tem já em pleno funcionamento o laboratório de multiplicação de plantas in vitro, para obtenção de plantas-mãe das seleções avançadas, isentas de vírus, para seguirem para multiplicação em viveiro.
Os principais desafios enfrentados no melhoramento genético incluem a escassez de recursos humanos qualificados e a necessidade de infraestruturas adequadas, como estufas dedicadas e campos de seleção mais afastados das áreas de produção. Além disso, a previsão das necessidades futuras da cultura e a adaptação às condições climáticas, são questões que exigem constante antecipação e inovação.
Através do ResiliBerry, a Frutas Classe espera não só produzir variedades de morango exclusivas, mas também contribuir para o crescimento sustentável dos seus produtores. As novas variedades deverão permitir uma produção mais eficiente, utilizando menos recursos e garantindo uma competitividade acrescida tanto no mercado interno como no mercado de exportação. Para viabilizar este projeto, a organização tem contado com incentivos governamentais como o Programa Operacional e o SIFIDE, que permitem financiar as diversas fases de investigação e desenvolvimento experimental.
Nos próximos anos, a Frutas Classe espera conseguir registar a primeira variedade de morango portuguesa, e tem como objetivo que, a longo prazo, todos os seus produtores utilizem exclusivamente as suas variedades. A organização vê no sucesso do ResiliBerry um potencial para expandir o conhecimento adquirido para o melhoramento de outras culturas de interesse em Portugal, fomentando assim a inovação e a competitividade agrícola no país.
Fonte: DEMO.net