“A abordagem defensiva e combativa do Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, aos incêndios florestais e ações de desflorestação no país, juntamente com o agravamento dos dados de agências governamentais” aumentaram “a oposição ao acordo de livre comércio UE-Mercosul na Europa, reforçando nossa visão de que a Comissão Europeia vai paralisar o acordo até o momento oportuno”, diz um relatório da consultora.
O acordo de livre comércio entre a UE e o Mercado Comum do Sul (Mercosul), integrado pelo Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, foi fechado em 28 de junho, após 20 anos de negociações.
O pacto abrange um universo de 740 milhões de consumidores, que representam um quarto da riqueza mundial, no entanto, para entrar em vigor necessita ser aprovado por todos os países membros da UE e também do Mercosul.
Para a Eurasia, a aprovação por membros do bloco europeu, que já enfrenta dificuldades, dependerá de melhorias significativas no desempenho ambiental do Brasil, sem as quais o apoio político dentro da UE será difícil de se consolidar.
“Portanto, o acordo comercial que está sendo negociado desde 1999 tem maior probabilidade de ser finalizado apenas no final de 2021 ou, mais provavelmente, em 2022”, estima a consultora.
Os analistas lembraram que, em 22 de setembro, Jair Bolsonaro abriu a 75.ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas e assumiu um tom previsivelmente defensivo em relação ao histórico ambiental do seu Governo.
As políticas ambientais brasileiras enfrentaram críticas internacionais, especialmente de países da UE que dizem estar preocupados com os grandes incêndios florestais registados nos últimos meses no bioma Pantanal e com o contínuo desflorestamento da floresta amazónica.
Num esforço para apaziguar os críticos, Bolsonaro mencionou explicitamente o compromisso do seu Governo com os acordos firmados pela UE com o Mercosul e o acordo da EFTA [sigla em inglês da Associação Europeia de Comércio Livre] com o mesmo bloco sul-americano, e suas respetivas cláusulas sobre proteção ambiental.
O chefe de Estado também chamou a atenção para os esforços do seu Governo contra a desflorestação ilegal, liderado pelo seu vice-presidente.
“Mas o problema reside no facto de que a retórica de Bolsonaro se baseia muito mais em rejeitar a gravidade do problema, em vez de assegurar à comunidade internacional que esforços estão sendo feitos”, frisou a consultora.
Os analistas lembraram que Bolsonaro acusou europeus de fazerem uma campanha de desinformação contra a política ambiental do Brasil no seu discurso da ONU e disse que grupos indígenas são responsáveis por muitos dos incêndios nas florestas, acusações que não tem como comprovar e que foram negadas por ambientalistas e cientistas.
Declarações semelhantes desqualificando críticas internacionais são proferidas por muitos dos principais assessores do Presidente. Reduzir o ritmo do desmatamento não é fácil em nenhuma circunstância, dadas as restrições fiscais, temperaturas mais altas e o papel do crime organizado e governos locais corruptos.
“Alguns esforços estão sendo feitos, mas é improvável que eles freiem o ritmo da desflorestação em breve e, sem nenhuma mudança na retórica no horizonte, a pressão internacional sobre o Brasil tende a crescer”, avaliou a análise da Eurasia.
A consultora lembrou que advogados da UE e do Mercosul trabalham para finalizar o texto, com funcionários da UE sugerindo que o cronograma é fluido e, em certa medida, também politicamente dirigido.
“De acordo com autoridades europeias, a Comissão e a maioria dos grupos industriais ainda estão pressionando pelo pacto. Mas uma agenda ocupada da UE na esteira do novo coronavírus e crises do Mediterrâneo Oriental e da Bielorrússia, junto com a deterioração das condições no Brasil em torno da desflorestação e dos incêndios florestais empurraram o acordo do Mercosul para segundo plano”, concluiu a consultora.