Faltam seis meses para a obrigatoriedade da recolha de biorresíduos, mas o país ainda tem um longo caminho a percorrer. Técnicos dizem que municípios não estão preparados, mas autarquias discordam. Para já, falta informação aos consumidores sobre o que terão de fazer e também não está claro quem vai pagar a fatura deste novo serviço.
A recolha seletiva de biorresíduos em Portugal Continental vai ser obrigatória a partir de 1 de janeiro de 2024, o que vai exigir uma nova operação por parte de 278 municípios e operadores e novos comportamentos do lado dos cidadãos.
A seis meses do prazo, muito está ainda por fazer. Salvo raras exceções, segundo os técnicos a maioria das autarquias não está num estado avançado de preparação e os cidadãos não estão informados sobre esta nova tarefa. A Associação Nacional de Municípios discorda, garantindo que tem sido feito um percurso “notável”.
Num país que falha sempre as métricas dos resíduos, e onde cada pessoa produz 1,4 kg de resíduos por dia e onde a maioria dos resíduos vai para aterro (56%), segundo o último Relatório do Estado do Ambiente, a nova lei dos resíduos biodegradáveis tem potencial para retirar ao país esta “má reputação”, na medida em que 37,4% de todos estes resíduos produzidos são biorresíduos.
E o que são biorresíduos? Estamos a falar de restos de legumes, fruta, carne, peixe, pão, cascas de ovos, entre outros, bem como de resíduos verdes resultantes de jardins ou espaços verdes. Tal representa “cerca de 200 kg por pessoa, por ano, o que no final de um ano dará algo próximo dos dois milhões de toneladas de biorresíduos”, sintetiza Sara Correia, técnica da Zero na área de resíduos.
O Plano Nacional de Gestão de Resíduos 2030 (PNGR) e o Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos 2030 (PERSU), aprovados em março, pretendem levar o país rumo a uma economia mais circular. E na área dos biorresíduos, Portugal deve estar preparado até ao final de 2023.
Estará? O país “neste momento não está preparado”. “O processo é complexo e está a ser preparado, mas a um ritmo inferior ao desejado, sobretudo por se tratar talvez do mais desafiante e exigente fluxo de resíduos”, refere Paulo Praça, presidente da Esgra – Associação para a Gestão de Resíduos.
Segundo o responsável, a operacionalização da recolha seletiva de biorresíduos em tempo útil dependerá da concretização de ações como a conclusão de obras de remodelação, readaptação ou construção de unidades de valorização orgânica dos sistemas de gestão de resíduos urbanos. Dependerá também, diz, do fornecimento atempado de equipamentos, como chassis de viaturas, contentorização, sistemas elétricos de apoio e da contratação de pessoal, da disponibilidade financeira para fazer face ao aumento de custos previstos e da adesão da população.
Também Sara Correia considera que o país não está pronto para tamanha alteração. “Não se pode dizer que Portugal esteja preparado quando a seis meses da data limite [os municípios] ainda não definiram a estratégia de recolha ou estão ainda a dar os primeiros passos na implementação da mesma. Há uma despreocupação geral sobre este assunto.”
Há necessidade de acelerar a implementação da recolha seletiva de biorresíduos durante este ano.
Luísa Salgueiro
Presidente da ANMP
Visão diferente tem Luísa Salgueiro, presidente da Associação Nacional de Municípios (ANMP), que considera que Portugal “tem feito um percurso notável na valorização do resíduo como um recurso”. “Já existem vários sistemas e instalações a funcionar, mas há necessidade de acelerar a implementação da recolha seletiva de biorresíduos durante este ano”. E recorda que “com a publicação do PERSU 2030, os sistemas de gestão de resíduos e os municípios terão de apresentar até novembro os seus planos de ação e, em paralelo, dar cumprimento ao Regime Geral de Gestão de Resíduos. É que define que a partir de 1 de janeiro recolha seletiva de biorresíduos ou a sua separação e reciclagem na origem é obrigatória”.
Apesar de não indicar números, Luísa Salgueiro revela que “por todo o território existem bons exemplos da recolha de biorresíduos, seja porta a porta ou através de contentores”. “O importante será garantir que estes projetos ganhem dimensão e assegurem o correto desvio desta fração dos resíduos indiferenciados”, frisa.
Os bons exemplos
No início do ano, Cascais tornou-se no primeiro concelho a fazer a recolha de […]