Os fogos, as autárquicas e o Orçamento do Estado atrasaram os trabalhos de reprogramação do Portugal 2020. Ainda não foram feitas reuniões formais com os gestores dos vários programas operacionais, nem entregue qualquer proposta a Bruxelas. Ainda assim, o diagnóstico das necessidades já está feito há algum tempo, mas agora é necessário tomar decisões e, se os ministros não se entenderem entre si, a decisão final será de António Costa.
“Já temos estabilizado o que faz falta e o dinheiro disponível. Mas ainda estamos na discussão política. Se os ministros não chegarem acordo terá de ser o chefe a decidir”, disse ao ECO fonte governamental. “E há muitas coisas a decidir, porque o dinheiro não chega para todos”, acrescenta a mesma fonte.
O exercício de reprogramação dos quadros comunitários de apoio é normal a meio do período e o Portugal 2020 não é exceção. Há áreas onde a situação já começa a ser crítica pela ausência de verbas, como as empresas e a formação. O Sistema de Incentivos que apoia o investimento às empresas, de acordo com os dados a 31 de outubro, já só tem 234 milhões de euros disponíveis até 2020, uma vez que já tem comprometido 94% da dotação atribuída inicialmente. Já os apoios aos cursos profissionais também estão em risco porque a 30 de setembro de 2016 já tinha sido atingida a meta definida para 2018.
Para o Executivo “está fora de questão não abrir mais concursos para as empresas“, porque não há dotação. Depois do esforço em dinamizar o investimento através dos fundos, o Governo foi sucessivamente aumentando as metas de pagamentos às empresas: começaram por ser cem milhões nos primeiros cem dias de Governo para chegar aos 1.250 milhões de euros no final de 2017 –, a expectativa é a de que “o investimento produtivo continue a ser a grande alavanca do crescimento económico”, acrescenta a mesma fonte. Recorde-se que o Orçamento do Estado para 2018 tem previsto um aumento de mais de mil milhões de euros no investimento no próximo ano. A elevada procura por parte das empresas levou mesmo o Executivo a “rever alguns dos exercícios de reprogramação” que estavam a ser desenvolvidos, avançou ao ECO, fonte conhecedora do processo.
“Estamos a procurar soluções no sentido de manter o nível de investimento dos últimos anos”, precisou ao ECO a mesma fonte. “Temos soluções pensadas para isso, compatibilizadas com os recursos globalmente disponíveis que vão obrigar a algumas alterações que estão em estudo”. Há decisões de “natureza técnica” para reduzir o gap entre as necessidades e os recursos disponíveis, mas mesmo apelando “à criatividade”, não é possível anular totalmente o diferencial apenas com ajustes técnicos.
É possível também encontrar “instrumentos que alavanquem mais recursos, fazer ajustes nas taxas de financiamento, sem pôr em causa a realização das ações ou baixar a contrapartida nacional dos fundos, até porque existe um compromisso de reduzir a despesa pública primária. Mas, no fim do dia, terá de haver uma decisão política.
Esta solução terá naturalmente em conta aquelas que são as prioridades já definidas pelo Executivo: competitividade, inovação e qualificação, ou seja, as áreas candidatas a um reforço. Mas também as regras comunitárias que não permitem uma alocação totalmente livre de verbas entre programas e até entre objetivos temáticos. No pouco que tem sido possível apurar sobre os eventuais perdedores surgem os instrumentos financeiros, nomeadamente a Instituição Financeira de Desenvolvimento, mas também os programas que apresentam as taxas de execução mais baixas.
Mas há ressalvas. Por exemplo, o domínio da Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos surge em quarto lugar em termos de taxa de aprovações, logo seguido da Inclusão Social e Emprego. Contudo, há uma fatia significativa no POSEUR na qual não é possível mexer, tendo em conta os compromissos assumidos junto da Comissão Europeia aquando da negociação do Acordo de Parceria, em termos de combate às alterações climáticas. Ainda assim há uma parte, ao nível da eficiência energética, que vai ser realocada para financiar a expansão do metro de Lisboa e do Porto, tal como o ECO avançou.
As autoridades nacionais estão a trabalhar para que a reprogramação não implique alterações muito significativas do ponto de vista operacional, sabe o ECO, para que exercício não represente um risco para a execução do Portugal 2020. Recorde-se que os requisitos para que Portugal não perca fundos perante a aplicação da regra da guilhotina ainda não estarão cumpridos e o quadro comunitário, a 30 de setembro, tinha uma taxa de execução de 17%, com 4,4 mil milhões de euros certificados e pagos pela Comissão Europeia.
Os trabalhos de reprogramação foram atrasados sobretudo pelos incêndios florestais do verão, já que ocuparam as equipas do ministério do Planeamento e Infraestruturas, que tem a tutela da maior parte dos fundos comunitários, mas também pelas eleições autárquicas e pelos trabalhos de elaboração do Orçamento de Estado. O ministro do Planeamento, Pedro Marques, a 6 de novembro, na audição conjunta da Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa e da Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas, a propósito do Orçamento do Estado para 2018, disse aos deputados que a proposta de reprogramação ainda não estava concluída nem tinha sido entregue qualquer proposta a Bruxelas.
“Não concluímos uma proposta de reprogramação e é falso que esteja já em discussão com Bruxelas uma reprogramação”, disse Pedro Marques. Em resposta ao deputado Costa e Silva disse: “Satisfará toda sua curiosidade quando houver uma proposta de reprogramação. Até lá as raposas não falam e a reprogramação também não existe. É apenas uma efabulação”, garantiu.