Estima-se que seis mil trabalhadores agrícolas vivam em casas sem condições em Odemira – quase metade do número total de imigrantes no concelho. Os problemas de habitabilidade refletem a exploração a que muitos são sujeitos. A PJ está a investigar várias queixas de tráfico de pessoas e, até, de escravatura. A VISÃO encontrou-se com um ex-angariador de trabalhadores que revela como eles são “enganados” e “roubados”
“Também fui uma vítima. Depois, entrei no negócio, mas não quero voltar a essa vida. Os trabalhadores eram enganados e roubados… E não pode valer tudo só por dinheiro. Eu acredito na Humanidade.” A confissão de Vijay Kandel, 31 anos, surge, inesperadamente, durante uma conversa que acontece num velho banco de madeira do Largo Gomes Freire, também conhecido como “quintalão”, o local mais central de São Teotónio. Esta é uma das duas freguesias do concelho de Odemira enclausurada por uma cerca sanitária desde a passada sexta-feira, 30, devido ao elevado número de contágios de Covid-19 registados na região. A outra é Longueira/Almograve, a pouco mais de 20 quilómetros de distância.
Vijay Kandel chegou a Portugal, vindo do Nepal, há meia dúzia de anos. Começou por arranjar emprego em explorações agrícolas através de empresas prestadoras de serviços, que servem de intermediárias entre as quintas e a mão de obra, mas quando conseguiu libertar-se desse sistema, resolveu tornar-se ele mesmo angariador de trabalhadores. “As empresas pagavam-me para eu arranjar empregados e, depois, eu é que lhes pagava a eles. Os trabalhadores acabavam por trabalhar mais para mim do que para as quintas”, explica, antes de acrescentar: “As explorações agrícolas não querem que eles sejam seus funcionários porque, assim, teriam de lhes fazer contratos e de lhes dar direitos.”