Inicialmente estas Notas da Semana deveriam ser dedicadas à proposta da Comissão Europeia sobre as Novas Técnicas Genómicas (NTG), conhecida oficialmente no dia 5 de julho e com a qual nos congratulamos, pese embora tenha de ser melhorada. Também a evolução da Guerra da Ucrânia seria assunto devido à difícil renegociação do Acordo dos Cereais do Mar Negro (a Rússia não está interessada), tal como a antecipação sobre a votação em Plenário do Parlamento Europeu, no próximo dia 12 (com discussão a 11), da Lei da Restauração da Natureza. Esta será uma votação bastante renhida e transformada num debate ideológico, mas que tenderá, em nossa opinião, a não ser aprovada, prevalecendo o bom-senso e a segurança alimentar, ao nível da disponibilidade de alimentos.
Apesar da sua relevância, são temas que podem esperar, face à premência de outras preocupações bem mais urgentes e que afetam no imediato a agricultura, pecuária e toda a indústria agroalimentar, como a situação do PEPAC e a questão da assistência técnica.
Falamos do ponto de situação das candidaturas ao Pedido Único (PU) e, igualmente preocupante para a IACA e para os nossos associados, da assistência técnica a alguns dos ecoregimes, desde logo o relativo à eficiência alimentar, que ajudámos a construir.
Pela situação a que chegámos, em que existem regimes ecológicos potencialmente relevantes (eficiência alimentar e bem-estar animal) que, à data de 2 de julho, não tinham simplesmente candidatos e a oito dias do fim do prazo para apresentação das candidaturas, com base nos dados do IFAP , temos 68% da área em falta, justifica-se um “toque a rebate”.
Por isso, saudamos a oportunidade do comunicado conjunto de todas as Confederações representativas, o que julgo ter acontecido pela primeira vez, e que pode ser uma demonstração de uma nova e saudável etapa no movimento associativo. Porque as políticas públicas não podem ser construídas sem ouvir os interessados, como tantas vezes aqui temos dito, sobretudo quando está em causa a segurança alimentar e o futuro do Mundo Rural.
Talvez, mais do que nunca, se justifique uma reunião da Comissão de Acompanhamento de carácter urgente para se perceber como estamos e o que podemos fazer para melhorar, no interesse de toda a cadeia agroalimentar e não apenas dos agricultores.
Aqui recordamos que, sendo absolutamente estratégico, o PEPAC respeita a todos, não é meramente agrário, mas agroalimentar.
Regressando aos ecoregimes, ou regimes ecológicos, que são uma parte importante nas ajudas aos produtores e fundamentais para atingirmos as metas definidas enquanto País, designadamente ao nível das emissões de GEE. Ao longo do processo de discussão da PAC, tendo presente o impacto da alimentação animal nos bovinos de carne e leite, a IACA trabalhou em conjunto com o GPP, mais tarde com o envolvimento do FeedInov CoLab, ou seja, com um conjunto de técnicos com provas dadas e reputados na bovinicultura, e, ainda, em conjunto com a DGAV, o INIAV e outras associações, na construção de um regime sobre a eficiência alimentar.
Desde 2021, fizemos inúmeras reuniões de trabalho, no sentido de se construir um modelo atrativo para os produtores – porque serão eles os grandes beneficiários – que elevou, igualmente, o patamar técnico das decisões, tomadas com base em evidências científicas. Na altura, chamámos a atenção para a necessidade de existir uma discriminação positiva para o apoio ou assistência técnica, com técnicos experientes e reconhecidos pela sua competência, porque muitos produtores não tinham qualquer apoio permanente, apoio esse que seria uma mais-valia para o acompanhamento e monitorização do regime. Ainda recentemente decorreram reuniões para afinação de alguns contributos e clarificações, pese embora estejamos perto do fim do período de candidaturas.
No entanto, quando os produtores iniciaram os processos do PU, deparámo-nos com a questão da elegibilidade da majoração das ajudas relativas à assistência técnica. Os técnicos das empresas nossas associadas, do setor da alimentação animal, que trabalham há anos com as explorações pecuárias, aconselham os produtores na gestão do maneio e alimentação, pasme-se, não eram elegíveis como técnicos elegíveis para efeitos de majoração, tendo de optar por técnicos ligados a associações de produtores ou cooperativas.
Nada temos contra estas organizações, como é óbvio. Pelo contrário, como se tem visto pelo historial da IACA e do setor ao longo de mais de 50 anos. Bem diferente é a nossa missão enquanto Associação, na defesa da livre concorrência, evitando quaisquer distorções e defendendo a liberdade de escolha, já que se trata de um regime demasiado específico.
Ao que apurámos junto de diferentes instituições, o exclusivo da assistência técnica por aquelas organizações foi uma clara opção política do Ministério da Agricultura e Alimentação e como tal, já enviámos uma exposição à Ministra Maria do Céu Antunes, manifestando todas estas preocupações e apelando à reversão desta orientação política, em nome da liberdade de escolha pelos agricultores, produtores de carne ou leite, em que o único critério deve ser a qualidade do apoio e não o “empurrar” da decisão apenas porque é a condição necessária para usufruir da majoração. E, já agora, os técnicos que tenham explorações, não podem ser eles responsáveis pela assistência técnica, desde que reconhecidos pela DGADR? Ou terão de recorrer igualmente a essas entidades?
O sistema não pode ser subvertido, nem é este o tipo de associativismo que importa promover, em nossa opinião. Esperemos igualmente que esta majoração do apoio técnico, pela discriminação negativa das empresas do Setor, não se traduza em benefícios comerciais e concorrências.
Talvez ingenuamente e na boa-fé, recusando formulações à medida, marcas, quaisquer ligações ou interesses comerciais, apenas pretendemos criar e lutar por um regime que ia introduzir melhorias na bovinicultura nacional, um upgrade, o mais inclusivo possível, que seria melhorado ano após ano, à luz da experiência anterior…nunca imaginámos este potencial de distorções e de concorrência desleal.
A Comissão Europeia elogiou Portugal – apenas a Bélgica (Flandres) tinha um ecoregime baseado na eficiência alimentar, muito ligado à alimentação animal – e em Bruxelas apresentámos aos colegas o projeto, cuja replicação tem sido encorajada para outras organizações e Estados-membros.
Daí também a mágoa e a procura de reverter o que consideramos profundamente injusto.
Numa altura em que sabemos que foram propostas medidas de flexibilização e adiamentos até setembro e em que as Confederações estão a propor algumas alterações, deixamos aqui o apelo de se considerar a assistência técnica, pelo menos num regime tão específico e exigente do ponto de vista técnico-científico como é o da eficiência alimentar nos bovinos, como uma decisão livre, consciente e informada do produtor de leite ou carne, à luz dos objetivos de melhoria da sua exploração e de forma a atingir os parâmetros definidos.
A assistência técnica não pode ser o elefante na sala!
Jaime Piçarra
As infraestruturas portuárias não podem ser forças de bloqueio – Jaime Piçarra