Com quase dois séculos de história, a José Maria da Fonseca tem vindo a reforçar o seu compromisso com a sustentabilidade ao longo dos anos, sendo atualmente reconhecida como uma das adegas mais sustentáveis da Europa. Desde 2022, mantém a exigente certificação FAIR’N GREEN, que avalia práticas ambientais, sociais e económicas em toda a cadeia de valor.
A aposta em soluções inovadoras, formação e responsabilidade ambiental tem contribuído para um modelo de produção vitivinícola cada vez mais consciente e resiliente. Esta transição, embora desafiante, tem-se revelado um trunfo estratégico, com impacto positivo nos mercados internacionais.
A Vida Rural conversou com António Maria Soares Franco, Co-CEO da José Maria da Fonseca, que nos falou do processo de transformação do negócio rumo à sustentabilidade, os próximos passos para alcançarem a neutralidade carbónica e a visão da empresa para o futuro do setor vinícola.
– Que mudanças estruturais e operacionais foram implementadas para conquistarem, e manterem desde 2022, a certificação FAIR’N GREEN?
Desde o início do nosso compromisso com a certificação FAIR’N GREEN, foi necessário repensar e reforçar práticas em toda a cadeia de valor – da vinha à distribuição. Introduzimos sistemas de monitorização ambiental mais rigorosos, aumentámos a formação interna em práticas sustentáveis e adotámos critérios de avaliação contínua que garantem o cumprimento dos pilares da certificação: proteção ambiental, responsabilidade social e viabilidade económica.
– De que forma as práticas sustentáveis integram o dia a dia da vossa produção, desde a vinha até ao consumidor final?
Na vinha, priorizamos práticas como o uso racional da água, a manutenção da biodiversidade e a redução do uso de produtos fitossanitários. Na adega, investimos em eficiência energética, gestão responsável de resíduos e na utilização de energias renováveis. Também damos preferência a materiais recicláveis e com uma lógica de economia circular, de forma a diminuir o impacto ambiental. O compromisso estende-se até ao consumidor com uma comunicação clara sobre os valores que nos guiam e as práticas que sustentáveis que implementamos.
– Quais os maiores desafios que enfrentaram na transição para práticas vitivinícolas sustentáveis, e como foram superados?
O maior desafio foi, sem dúvida, alinhar a mudança cultural interna com as exigências do referencial FAIR’N GREEN. Foi necessário envolver todos os colaboradores, fornecedores e parceiros de negócio. Investimos em formação contínua e criámos mecanismos internos de avaliação e melhoria. A transição implicou também investimentos consideráveis em tecnologia e inovação, mas o retorno tem sido inequívoco.
– O selo de “adega mais sustentável da Europa” tem influenciado a vossa reputação e vendas em mercados internacionais?
Sim, tem tido um impacto muito positivo. Os mercados internacionais, sobretudo os do Norte da Europa e da América do Norte, valorizam cada vez mais práticas sustentáveis e com responsabilidade social. O reconhecimento como “adega mais sustentável da Europa” reforça a nossa credibilidade e diferenciação nesses mercados, contribuindo para o crescimento das exportações e para a consolidação da nossa imagem como produtores de vinhos de excelência e com consciência ambiental.
– Como foi o processo de adaptação do Periquita Reserva 2022 aos critérios do selo FAIR’N GREEN?
A adaptação decorreu de forma natural, uma vez que a José Maria da Fonseca já tem uma base sólida de práticas sustentáveis implementadas. Ainda assim, foram feitas algumas melhorias de forma a cumprir, de forma plena, os critérios estabelecidos no referencial FAIR’N GREEN. O Periquita Reserva 2022 é um exemplo de como é possível manter a identidade e qualidade de um vinho emblemático, enquanto se respeitam exigentes critérios ambientais e sociais.
– Quais os próximos passos no que toca a sustentabilidade?
Estamos a preparar o lançamento de um programa interno de neutralidade carbónica até 2030, com metas anuais definidas. Vamos também expandir o uso de energias renováveis nas nossas instalações e continuar a trabalhar com fornecedores que partilhem os nossos valores. A nível de produto, temos em desenvolvimento novas gamas de vinhos com embalagens inovadoras e de baixo impacto ambiental.
– Consideram que o consumidor europeu está, de facto, mais sensível à origem sustentável dos vinhos que consome? Como é que isso se reflete nas escolhas de compra?
Claramente. Hoje, muitos consumidores procuram mais do que qualidade no vinho – procuram confiança na origem e nos métodos de produção. Isso reflete-se no crescimento da procura por vinhos com certificações na área da sustentabilidade, e também na valorização de marcas com um compromisso genuíno com estas práticas. O consumidor europeu está mais informado e exige maior transparência.
– Qual acreditam ser o papel do enoturismo no desenvolvimento sustentável das regiões vitivinícolas portuguesas?
O enoturismo tem um papel central na medida em que promove experiências autênticas e educativas, valorizando as regiões nas quais estão inseridos e criando emprego local. Permite ainda reforçar o elo entre produção e consumidor, sensibilizando para práticas agrícolas sustentáveis e tradições culturais. Em regiões vitivinícolas como a nossa, o enoturismo é uma alavanca para um desenvolvimento económico e social equilibrado.
– O que representa, para uma empresa com 190 anos de história, ser pioneira em sustentabilidade no setor vitivinícola em Portugal?
É um orgulho e uma responsabilidade. A José Maria da Fonseca sempre procurou estar na vanguarda, sem nunca esquecer as suas raízes. Ser pioneira em sustentabilidade é dar continuidade a essa visão – inovar com propósito, liderar com o exemplo e garantir que as futuras gerações possam herdar um setor vitivinícola resiliente, competitivo e ambientalmente responsável.
– De um modo geral, como descrevem o estado atual do setor vinícola em Portugal?
O setor está num momento de grande dinamismo e afirmação internacional. Portugal tem vindo a conquistar reconhecimento pela qualidade e autenticidade dos seus vinhos. No entanto, enfrenta também desafios como a adaptação às alterações climáticas, a pressão sobre os recursos naturais e a necessidade de atrair novos consumidores. A sustentabilidade, a digitalização e a valorização da identidade regional serão, sem dúvida, eixos estratégicos para o futuro do setor.
O artigo foi publicado originalmente em Vida Rural.