Sugiro a leitura deste artigo de João Adrião, uma carta aberta a Montenegro sobre fogos.
Conheço João Adrião, concordamos em muita coisa na substância da gestão da paisagem, discordamos em muita coisa na forma, mas não tenho grandes dúvidas em subscrever esta carta aberta.
Uma das coisas que me fazem subscrever esta carta é que ela é dirigida a Montenegro, e não aos responsáveis directos pela tutela da gestão da paisagem, no que diz respeito à gestão do fogo.
Não sei as razões de João Adrião para essa opção, mas sei as minhas: não vejo nem no ministro da agricultura, nem na ministra do ambiente, qualquer sinal de pensamento estratégico sobre gestão do fogo, tal como já não se via no programa eleitoral em que assenta este governo (aliás a dupla tutela sobre o assunto e a reposição da AGIF na orgânica do governo são boas demonstrações disso mesmo).
Conheço o secretário de estado das florestas, não tenho dúvidas sobre as suas boas intenções, mas não me parece muito útil esperar que esteja aí o motor para uma gestão estratégica do problema do fogo.
Sobra o primeiro-ministro, mesmo que, infelizmente, não pareça ter qualquer sucesso esta tentativa de trazer o debate sobre a gestão do fogo para onde ele deve estar, na gestão de combustíveis com o que isso implica de remuneração da gestão da paisagem pelas pessoas comuns.
Montenegro tem problemas para resolver em 2024, procurando chegar em boa posição às próximas eleições, e os grandes problemas relacionados com os fogos só devem acontecer lá para 2030.
Sete anos passados sobre 2017 quer dizer que o risco está em forte crescimento desde o quinto ano, para estar próximo do máximo a partir dos doze anos, estamos, portanto, num nível de risco relevante mas não extremo.
Os incentivos que existem, na ausência de pensamento estratégico por parte de quem o deveria ter, é que Montenegro deixe correr o marfim, satisfaça bombeiros e autarcas tanto quando possível, refira que o que for acontecendo de aceitável é a demonstração de que a política do seu governo está a funcionar e vá falando de ignições e fiscalização da GNR em relação ao cumprimento de legislação absurda sobre o assunto.
Como ainda por cima, do lado da administração, a fonte mais consistente de pensamento sobre o assunto é a AGIF, cujo presidente tem uma forte conotação com o PS e o governo anterior, tudo se alinha para que continuemos, passo a passo, a caminhar para o desastre anunciado.
Que chegará um dia, não sabemos quando – as probabilidades andam ali por 2030, mais ano, menos ano, mas esse é o padrão geral, que pode ser subvertido por um ano meteorológico excepcional, dado que os combustíveis começam a estar em ponto de rebuçado -, mas chegará.
O artigo foi publicado originalmente em Corta-fitas.