Uma investigadora defendeu hoje apoios para a agricultura e o pastoreio tradicionais no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), para “pagar o serviço de proteção dos ecossistemas e da biodiversidade” que tornam “o território mais resiliente perante aos incêndios”.
“Os apoios a este tipo de agricultura precisam de existir. No fundo, estão a pagar serviços do ecossistema, serviços ambientais que esta agricultura proporciona ao criar uma paisagem mais resiliente aos fogos, e que, muitas vezes, é pouco ou é insuficientemente apoiada para manter pessoas mais jovens nas comunidades a desenvolver esta agricultura”, explicou à Lusa Joana Nogueira, da Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Viana do Castelo (IPVC).
Foi também pela presença humana e pela “harmonia entre as comunidades locais e a natureza que o parque surgiu com um elevado valor natural”, destacou a professora, que tem estudado o papel das comunidades que vivem na Peneda-Gerês e o papel que desempenham na “preservação da integridade e diversidade dos ecossistemas”.
“Julgo que pode ser bastante intensificado o trabalho com as comunidades que lá estão, cuidando mais delas, da sua qualidade de vida e de instrumentos para tornar os agricultores e as comunidades nos principais guardiões desta natureza, que já são, mas muitas vezes não são vistos como tal, nem apoiados enquanto tal”, disse.
As atividades agrícolas e pastoris, “que sempre existiram no parque”, estão “em regressão” e, com isso, “as estruturas ecológicas do parque estão a alterar-se, através da expansão de matos mais altos, zonas mais fechadas em termos de vegetação e plantas exóticas invasoras, que são acentuadas de cada vez que há um fogo”, descreveu.
“As atividades agrícolas e de pastoreio tradicionais têm vindo a diminuir na Peneda-Gerês e isso ameaça a agrodiversidade e a biodiversidade silvestre, importantes para um território mais resistente aos incêndios”, destacou.
Já existem instrumentos de apoio, “mas ainda são insuficientes, ou não são totalmente adaptados às realidades, no sentido de permitirem aos agricultores terem continuidade nas suas explorações e jovens quem lhes sucedam à medida que vão envelhecendo”.
Assim, a renovação geracional “não está garantida”, tal como “não está garantido, muitas vezes, o trabalho de colaboração” com os agentes locais, observou.
“Claro que a agricultura tradicional não pensava em produzir serviços de ecossistemas. Mas agora deve pensar e tem que ser capacitada para isso. Devemos pensar de que modo é que devemos fazer a agricultura e o pastoreio para garantir mais a resiliência aos incêndios, mais biodiversidade silvestre, mais proteção da água”, defendeu.
Esse trabalho “tem de continuar a ser feito e intensificado, face ao que tem acontecido”, afirmou, referindo-se ao incêndio que começou a 26 de julho no PNPG, em Ponte da Barca, distrito de Viana do Castelo, que foi dado como dominado no domingo e que hoje, pelas 08:30, em resolução mobilizava ainda 370 homens e 127 viaturas.
A diminuição das atividades tradicionais “acontece há décadas, mas tem-se acentuado, com a Política Agrícola Comum e com políticas de conservação da natureza que não têm encontrado forma de apoiar estas atividades” pelo papel que cumprem a proteger os ecossistemas.
Joana Nogueira explicou que, para além da “mortalidade direta causada pelo fogo” na fauna e flora do parque, também a biodiversidade silvestre fica em causa.
“O ‘habitat’ que existia antes do fogo, em termos de vegetação, fica ameaçado, pela expansão de invasoras exóticas, que são muito mais hábeis em instalar-se após um incêndio e vão conquistar espaço, retirando a flora e a vegetação nativa”, especificou.
Alertou que “estas perturbações sucessivas podem, no fundo, reduzir muito substancialmente a flora autóctone, que já é escassa”.
O PNPG abrange os distritos de Braga (concelho de Terras de Bouro), Viana do Castelo (concelho de Melgaço, Arcos de Valdevez e Ponte da Barca) e Vila Real (concelho de Montalegre), numa área total de cerca de 70.290 hectares.